Há tempos, o chocolate saiu da lista dos vilões da alimentação e entrou para a dos ingredientes que fazem bem à saúde. Com propriedades antioxidantes amplamente estudadas, a versão amarga da iguaria, que contém mais de 70% de cacau, ajuda a proteger o coração e, por isso, foi reabilitada. Agora, um estudo brasileiro constatou o potencial dessa guloseima de beneficiar pacientes que já sofreram de síndrome coronariana aguda (SCA), um conjunto de doenças que incluem o infarto.
A pesquisa, publicada no Internacional Journal of Cardiovascular Sciences, jornal da Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de Janeiro (Socerj), foi conduzida no Instituto de Cardiologia de Santa Catarina com 11 pacientes de 60 anos em média. Todos sofriam de doença arterial coronariana, quando há um estreitamento das artérias que distribuem sangue rico em oxigênio para o coração. Eles haviam sido internados depois de infartarem ou apresentarem angina instável, condição que pode evoluir para a obstrução cardíaca.
Antes de iniciar o teste com o chocolate, os pesquisadores, liderados pelo cardiologista Daniel Medeiros Moreira, fizeram um exame que avaliou a dilatação de uma artéria. Esse procedimento é utilizado para verificar a saúde do endotélio, a membrana que recobre vasos sanguíneos e o coração. Depois, os pacientes foram divididos em dois grupos: um deles recebeu 100g de chocolate com 85% de cacau por dia; o outro ficou com a mesma quantidade de chocolate branco, que quase não contém cacau.
Passados sete dias, o exame foi repetido. Além disso, os pesquisadores avaliaram a frequência cardíaca, a pressão arterial, os níveis de proteína C-reativa ultrassensível – um indicativo de risco de doenças coronarianas – e a velocidade de hemossedimentação, que mede a inflamação das artérias e pode apontar insuficiência cardíaca. “A saúde vascular melhorou logo em seguida à ingestão do chocolate. O amargo promoveu uma vasodilatação muito maior que o branco”, conta Moreira.
O médico observa que o fato de o chocolate branco também ter melhorado – mesmo que discretamente – a dilatação arterial foi uma surpresa. Contudo, acredita que essa alteração ocorreu por acaso, algo que não é difícil de acontecer em estudos científicos. Para ele, a comparação do antes e do depois e o resultado dos demais testes feitos após o consumo do chocolate amargo evidenciaram o potencial da iguaria na melhora da função cardíaca de infartados.
“Existem vários estudos mostrando que algumas intervenções alimentares podem trazer benefício cardiovascular para pessoas saudáveis. Embora pequeno ainda, o estudo que fizemos foi realizado com pacientes que já tinham a doença”, lembra. De acordo com Moreira, alguns artigos prévios, inclusive, afirmavam que o chocolate não promoveria alterações nesse grupo, o que foi contestado pelos resultados do trabalho brasileiro. O cardiologista diz que a ideia é, futuramente, fazer outros experimentos que comparem os níveis de colesterol, pressão arterial e frequência cardíaca em pacientes que apresentem doenças cardiovasculares. Também está nos planos aumentar o número de participantes.
Bastam 30g
A especialista em nutrição funcional Fernanda Bassan, professora do curso de nutrição da Universidade Católica de Brasília, explica que os benefícios do chocolate estão associados aos flavonoides, em especial às catequinas e às poprocianidinas, substâncias naturais com propriedades antioxidantes. “Elas promovem a vasodilatação, reduzem o colesterol LDL, melhoram a glicemia, entre outros%u201D, enumera. Embora diversos vegetais tenham esses compostos, eles são muito maiores no cacau. %u201CUma quantidade bem pequena de chocolate que tenha mais de 70% de cacau, cerca de 30g, já tem esse potencial de proteger o coração”, diz. “Se for o cacau em pó, basta uma colher de sopa por dia”, ensina.