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Aposentados da Varig temem não receber indenizações em vida

Supremo manteve decisão que obriga a União a pagar indenização bilionária à companhia aérea por congelamento de tarifas; pagamento a aposentados e pensionistas depende de publicação e cálculos.

Wikipedia / Reprodução

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A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que manteve a obrigação da União em indenizar a Varig pelo congelamento de tarifas nos anos 80 trouxe, ao mesmo tempo, alívio e angústia para os aposentados da companhia aérea falida. Isso porque ainda não há nenhuma determinação sobre prazos, nem se o valor será suficiente para pagar todos os ex-funcionários, e muitos temem não receber o dinheiro em vida.

Recebendo suas aposentadorias por causa de uma medida cautelar há quase 3 anos, aposentados e pensionistas do Aerus, fundo de pensão da companhia, ainda esperam uma definição sobre sua situação. Eles aguardam os pagamentos atrasados desde 2006, quando a empresa parou de voar.

No dia 3 de agosto, o STF manteve a decisão de 2014 que obrigou a União a indenizar a Varig pelo congelamento de tarifas durante o Plano Cruzado, entre outubro de 1985 e janeiro de 1992. O dinheiro deve ser usado para o pagamento de dívidas trabalhistas individuais e, depois, com o fundo de previdência Aerus.

No entanto, para saber se o valor de indenização será suficiente para pagar os que contribuíram para o fundo e, mais ainda, quando isso irá acontecer, é preciso aguardar a publicação da decisão do STF e o cálculo da correção do valor devido.

Entre os que aguardam a decisão, a expectativa é de que isso não seja um processo rápido. Pelo menos é o que diz Celso Klafke, presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Aviação Civil.

“Na verdade, não teve uma grande novidade ali. Na prática, não mudou a posição do que estava acontecendo”, diz ele sobre a decisão do STF. “O próximo passo é a publicação. Esperamos que não demore muito, mas da última vez demorou 4 meses”, afirma ele sobre a decisão de 2014.

Klafke explica que, após a publicação, a ação volta para a instância de origem, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), para que se estipule o valor da indenização. A decisão mantida pelo STF dá direito à Varig de receber de R$ 2,3 bilhões (em valores de 2002). Agora, é preciso determinar a forma pela qual o valor será corrigido.

“Hoje, por exemplo, a Advocacia Geral da União (AGU) reconhece que a União deve um pouco mais que R$ 3 bilhões. Mas existem cálculos feitos pela própria Varig de que esse valor pode chegar a R$ 6 bilhões, dependendo do indexador”, diz Klafke – que é mecânico de manutenção, trabalhou na Varig de 1984 a 2006 e também contribuiu com o Aerus.

No entanto, ele comenta que existe ainda o receio de que a União queira abater dessa indenização parte dos impostos devidos pela Varig ao governo federal. Se isso acontecer, o valor que restaria aos que contribuíram para o Aerus pode ficar reduzido a praticamente nada.

Questionada pelo G1, a AGU respondeu apenas que “está avaliando os efeitos da decisão proferida pelo STF e se manifestará em momento oportuno a esse respeito”.

Expectativa dos aposentados

O aeroviário aposentado Ary Guidolin, que tem 71 anos e trabalhou por 20 na Varig, “não faz ideia” do valor a que tem direito pelos pagamentos atrasados do Aerus.

“A gente passou um tempo recebendo um valor muito pequeno, e isso gerou uma quantia a que a gente tem direito. Mas eu não fiz esse cálculo, ele não é fácil de ser feito. Os leigos não têm conhecimento dos fatores que devem ser corrigidos”, conta ele.

O período a que ele se refere é o intervalo entre 2006 e 2014. Em 2006, a Varig parou de voar e foi decretada a intervenção e liquidação extrajudicial do Aerus. Dessa época até 2014, os aposentados e pensionistas da Varig receberam apenas 8% do valor a que tinham direito. Até que, em setembro de 2014, conseguiram uma liminar que obrigou a União a antecipar o crédito devido.

Desde então, eles estão recebendo o benefício integral de suas pensões, mas ainda aguardam uma definição sobre o que será do valor retroativo referente aos anos anteriores à decisão.

Guidolin, que comanda a Comissão dos Aposentados do Aerus no Rio Grande do Sul, diz que o principal temor entre os trabalhadores é não viver o bastante para receber os benefícios atrasados. “Nós todos acreditamos que ainda vai levar muito tempo até vermos a cor desse dinheiro. Os cálculos são demorados, e aí com certeza depois o governo vai entrar com recurso”, diz.

“Só para se ter uma ideia, desde 2006, quando o nosso fundo teve decretada a liquidação, mais ou menos 1,5 mil pessoas já faleceram. E hoje a gente está nessa faixa de idade muito alta, a expectativa é de poucos anos mais”, afirma o aposentado.

De qualquer forma, Guidolin diz que receber os pagamentos atuais em dia já trouxe um alívio em relação à época em que recebiam “valores minguados”. “Hoje a gente está recebendo atualizado e estamos podendo viver um pouquinho melhor. Nos possibilita comprar um remédio, pagar um plano de saúde, trocar coisas que a gente estava segurando dentro na nossa casa, fazer uma pintura.”

A quebra do Aerus

O Aerus foi criado em 1982 pela Varig, Cruzeiro e Transbrasil. Quando a Varig parou de operar, o fundo, com vários repasses atrasados, não tinha reservas suficientes para pagar os benefícios de todos aqueles que tinham contribuído.

Em março, Graziela Baggio, que foi comissária da Varig entre 1974 e 1976 e é ex-presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, disse ao G1 que o número de pessoas que aguardam uma decisão definitiva da Justiça passa de 10 mil trabalhadores.

A dívida do Aerus ficou com a chamada “Varig Velha”, empresa que restou do processo de recuperação judicial e que teve falência decretada em 2010. A parte boa da empresa, com aviões e rotas, foi vendida à Gol. Neste ano, a venda da Varig à Gol completou 10 anos.