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Bob não se cansa de me ensinar…

Arquivo Pessoal

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Como já disse, ele vem me visitar no fim de semana, mais precisamente no sábado que ē o dia que a colaboradora se demora aqui em casa, com o almoço servido na mesa nas companhias de Pedro, João e quase sempre com mais gente conosco.

Como eu passo a semana aguardando por ele, procuro ter à disposição mimos que o agradem, por exemplo: na feira da família passou a ser item obrigatório aqueles ossinhos de couro, bolachinhas, tudo o que ele gosta, além disso comprei uma coleira mais bonita e confortável (que ele solenemente roeu e inutilizou) que objetivava não o machucar nas caminhadas.

Sem falar que na hora da mesa, já deixo providenciado peito de frango ou carne magrinha para aumentar minha vantagem competitiva no coração dele, uma prática inequívoca de tentativa de suborno.

Essa possibilidade de compra de afeto se passa no meu imaginário de forma fantasiosa, na realidade o lugar que ele me destinou não ultrapassa o tamanho de uma foto 3×4, bem pequena, independente do que faço ou desejo.

Nosso dia festivo inicia com a sua chegada, feliz, abanando o rabão, rodando em meu entorno, pulando na cama, fazendo toda a cena necessária para demonstrar afeto, sem me deixar dúvidas sobre isso, o problema é que eu quero mais e ele só oferece o que sente.

E me deixa entender sem subterfúgios que eu não sou sua preferida, demonstrando isso em várias ocasiões, mas é na hora que percebe o movimento de partida da dona do coração dele, nossa colaboradora Tiana, que isso fica bem claro.

No fundo eu entendo e aceito, ela é a única referência que o acompanha por toda a vida sem nunca ter sumido e isso deve ter importância, afinal, ele conhece despedida das mais diversas formas (e deve ter sofrido).

Até aí está tudo bem claro, quando reflito sobre essa relação, eu me certifico que devo acomodar minha expectativa a parcela de carinho que ele me dedica, entendendo como sendo suficiente, para tornar possível sermos todos felizes.

Meu incomodo reside na constatação da repetição dessa prática de “forçar” afeto na tentativa ilusória de conquistar amores que não me pertencem, me negando a entender que a semelhança das relações com Bob, o mesmo pode acontecer com as pessoas.

Por mais pragmática que eu tente ser, lembrando todos os ensinamentos das sessões de análise que já tive, da observação da vida ou da experiência da idade, repito de maneira irresponsável o costume de me desdobrar numa conquista de relações que já nascem mortas, acreditando na eficiência de meus apelos.

Afetos só são saudáveis enquanto recíprocos, espontâneos, sem forçar a barra, assim como o pedacinho que Bob tem por mim, sem se sentir culpado por não retribuir a atenção que lhe dedico na intensidade que me julgo merecedora.

Quando o Bob se sacode desajeitado, feliz com nosso reencontro tenta me ensinar a aproveitar aquele instante, naquelas condições e me diz com seus pulos alegres que sua demonstração de carinho não é um contrato e que ele não pretende me dedicar mais atenção que a permitida pelo seu coração.

Tonta eu se mantiver os olhos para o instante seguinte, correndo o risco de perder o prazer daquele momento, quando ele puxa a minha mão “convidando”, vamos brincar juntos?

Ele me cativou, tem espaço no meu afeto e retribui isso oferecendo atenção na medida possível, cabe só a mim conseguir ser feliz com o que ele pode ofertar, sem a ilusão de me tornar a dona do seu amor, afinal sou eu quem dedico mais carinho que o necessário para compreensão de felicidade dele e sendo assim, nenhuma culpa ele tem.

Bob não se cansa de me ensinar, tomara ter aprendido mais essa lição, que afetos só são possíveis de serem retribuídos na mesma intensidade, se acontecer aquela alquimia (ou não) dentro do peito, à revelia da vantagem, da lógica ou da razão.

E assim, quando chega a hora da partida, toda tentativa que faço de segurá-lo para esticar o tempo do abraço, de retardar a aproximação dele ao grupo que parte, se resulta inútil e em dores mútuas, ele chora e me machuca tentado se desgrudar de mim e seguir seu caminho.

Amor não se compra, não se obriga, não se suborna, não se sujeita, ele me ajuda a entender e aceitar a inutilidade de inventar artifícios para forçar uma atenção que não me cabe.

Abril de 2018

Katia Betina

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