Contrariando as recomendações de isolamento social do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde, para conter o avanço do coronavírus, os brasileiros estão saindo mais de casa desde o final de março.
Todos os estados, além do Distrito Federal, registraram aumento de pessoas nas ruas nos últimos dias, na comparação com as semanas anteriores.
Os dados são de um levantamento feito pela In Loco, empresa de tecnologia que diz possuir informações de localização em tempo real de 60 milhões de smartphones no Brasil.
A In Loco se baseia em dados enviados por aplicativos parceiros, e afirma que eles só são utilizados com a permissão dos usuários dos apps.
Foram consideradas 5 semanas, no período de 3 de março a 6 de abril. Nesse período, houve aumento do isolamento durante as 4 primeiras semanas, como mostra a tabela abaixo:
Índice de isolamento nos estados nas últimas semanas
3-9 de março | 10-16 de março | 17-23 de março | 24-30 de março | 31 de março – 6 de abril | |
Acre | 25,18% | 30,56% | 43,75% | 51,48% | 48,66% |
Alagoas | 26,56% | 32,29% | 43,69% | 55,55% | 51,11% |
Amapá | 26,04% | 31,55% | 47,56% | 55,94% | 53,31% |
Amazonas | 25,17% | 30,37% | 40,48% | 50,98% | 50,32% |
Bahia | 25,5% | 30,67% | 43,49% | 55,17% | 51,28% |
Ceará | 28,92% | 34,72% | 49,72% | 59,71% | 55,6% |
Distrito Federal | 33,08% | 36% | 51,84% | 61,18% | 57,98% |
Espírito Santo | 27,35% | 31,61% | 45,62% | 55,32% | 52,43% |
Goiás | 32,74% | 40,21% | 53% | 61,66% | 58,44% |
Maranhão | 29,2% | 34,51% | 45,01% | 55,67% | 53,82% |
Mato Grosso | 23,44% | 28,69% | 40,33% | 51,13% | 46,98% |
Mato Grosso do Sul | 22,41% | 27,57% | 41,91% | 53,19% | 47,59% |
Minas Gerais | 25,62% | 29,77% | 43,88% | 54,93% | 51,52% |
Pará | 27,93% | 33,37% | 42,8% | 52,20% | 50,54% |
Paraíba | 27,14% | 33,08% | 45% | 56,75% | 52,94% |
Paraná | 25,07% | 29,33% | 43,94% | 56,37% | 52,20% |
Pernambuco | 30,19% | 35,46% | 48,23% | 58,97% | 55,63% |
Piauí | 26,02% | 32,83% | 45,66% | 58,07% | 54,71% |
Rio de Janeiro | 26,12% | 31,02% | 48,29% | 57,02% | 53,71% |
Rio Grande do Norte | 29% | 35,23% | 45,46% | 56,12% | 53,54% |
Rio Grande do Sul | 25,58% | 30,47% | 46,56% | 59,88% | 55,05% |
Rondônia | 23,98% | 28,91% | 41,31% | 50,44% | 46,41% |
Roraima | 23,05% | 28,56% | 38,45% | 49,20% | 45,70% |
Santa Catarina | 26,76% | 30,41% | 53,21% | 61,13% | 54,28% |
São Paulo | 24,83% | 29,06% | 43,33% | 56,04% | 52,56% |
Sergipe | 28,88% | 34,31% | 46,24% | 56,43% | 51,91% |
Tocantins | 21,74% | 28,08% | 41,22% | 49,53% | 44,88% |
Em todos os casos, a primeira semana (3 a 9 de março) registrou índices de isolamento entre 20% e 30%. Na semana seguinte (10 a 16 de março), os valores subiram, e ficaram entre 27% e 40%.
Um aumento mais consistente pôde ser observado na semana de 17 a 23 de março, quando a quarentena passou a ser recomendada com mais ênfase. Nesse período, os estados registraram índices de isolamento entre 38% e 53%.
O pico do isolamento social, no entanto, foi alcançado na semana de 24 a 30 de março, quando todos os estados, com exceção de Roraima e Tocantins tiveram pelo menos 50% dos smartphones monitorados sem movimentação considerável.
Na última semana analisada, no entanto, entre 31 de março e 6 de abril, as 27 unidades da federação apresentaram redução nos índices de isolamento.
No mais recente pronunciamento na rede nacional de televisão, na última quarta-feira (8), o presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar as medidas de isolamento social, e considerou que elas são de “responsabilidade exclusiva” dos governadores.
Mercado Público em Florianópolis com filas na última semana — Foto: Marcelo Siqueira/ NSC TV
Santa Catarina, que estava entre os 3 estados que mais conseguiram manter a população em casa, foi o que registrou a maior queda percentual no índice de isolamento, passando de mais de 61%, para menos de 55%.
Por outro lado, o Amazonas, que está entre os piores índices de isolamento na última semana de março, teve a menor variação, de menos de 1 ponto percentual.
Em abril, nenhum estado brasileiro registrou isolamento maior que 60%. Goiás (58,44%) e Distrito Federal (57,98%) foram os que chegaram mais perto.
Na outra ponta, Tocantins (44,88%), Roraima (45,7%), Rondônia (46,41%), Mato Grosso (46,98%), Mato Grosso do Sul (47,59%) e Acre (48,66%) não estão conseguindo manter, de acordo com os dados, nem metade da população em suas casas.
São Paulo, que também monitora o isolamento usando dados da operadora de celular Vivo também registrou queda no isolamento. Na última quinta-feira, o índice foi o menor desde o início da quarentena.
Na maioria das situações, as capitais registraram índices de isolamento piores do que os estados ao longo das 5 semanas analisadas:
Nas outras 4 capitais, houve variação. Em algumas semanas, o índice na capital foi melhor, em outras, pior.
Em Salvador, Vitória e Belém, por exemplo, houve maior movimentação do que no restante dos respectivos estados nas duas primeiras semanas. Na terceira, o isolamento foi semelhante. Porém, nas duas últimas semanas analisadas, os moradores das capitais ficaram mais em casa.
A tendência foi repetida também em Cuiabá, Belo Horizonte, Florianópolis e Palmas, mas, a “virada”, aconteceu em diferentes períodos.
Em entrevista ao G1, o médico infectologista Julio Croda, professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), afirmou que está desenvolvendo um estudo que pretende estimar a falta de leitos hospitalares e UTIs de acordo com o aumento de deslocamento de pessoas. Ele utiliza os dados da In Loco.
“Estamos fazendo pesquisa tentando validar índices de isolamento para predizer o número de casos no futuro. Como o isolamento é a melhor medida de controle no número de casos, talvez esse índice de isolamento captado por celulares seja um bom indicador para prever casos no futuro”, afirma.
“Queremos saber o quanto o isolamento social diminui o número de casos. Podemos dizer que com 58% de isolamento, o número de casos diminui? Ou não, que com 58% de isolamento, os casos seguem aumentando?”, completa.
Croda explica que atualmente os modelos matemáticos usam dados de casos confirmados para prever o aumento das transmissões de coronavírus. Mas, segundo ele, este método tem problemas. “Como projetar se você não entende quantos casos têm no momento? A maioria das modelagens matemáticas trabalham com o número de casos confirmados, mas isso tem o problema da subnotificação, devido à falta de testes”, diz.
Ele cita como exemplo dados de Manaus. Os dados apontam que, em 6 de abril, a capital do Amazonas tinha 50% das pessoas em isolamento. Nesta quarta-feira (8), Manaus registrou 58% de isolamento após a veiculação de notícias sobre o aumento de casos e um possível colapso do sistema de saúde.
“Com certeza, isso se deve a todas as reportagens que passaram [falando sobre Manaus] e ao anúncio do ministro [Luiz Henrique Mandetta] dizendo que Manaus é preocupante. Você vê o impacto em tempo real na vida das pessoas”, conclui.
Em ações isoladas, as operadoras de telefonia também estão colaborando com as autoridades, fornecendo dados de localização de seus clientes. As ações, no entanto, são pontuais.
Em São Paulo, a Vivo está fornecendo para o Governo do Estado os dados de localização de aparelhos de 39 dos 645 municípios. O governo do estado disse que o sistema está sendo atualizado diariamente para incluir informações referentes aos municípios com até 30 mil habitantes.
Nesta quinta-feira (8), por exemplo, o índice de isolamento nas cidades monitoradas foi de 50%. Segundo a Secretaria de Saúde do Estado, a adesão ideal para controlar a propagação da Covid-19 é de 70%. Assim, a quantidade de leitos no sistema de saúde deve ser suficiente para atender a população.
Na cidade do Rio de Janeiro, a parceria da prefeitura é com a Tim. A empresa se comprometeu a enviar os dados de localização de seus usuários na cidade. Procurada pelo G1, a operadora não deu mais detalhes.
O Google também divulgou esse tipo de levantamento. Só que a última atualização foi em 29 de março. A empresa ainda não deu previsão de quando terá dados mais atualizados.