Ela é Coordenadora de Políticas de Promoção e Proteção da Diversidade Religiosa do governo do DF.
A mãe de santo xingada de “filha da puta”, “macumbeira” e “miserável” pelo presidente da Fundação Palmares Sérgio Camargo, em áudios, procurou a Polícia Civil do Distrito Federal nesta quarta-feira (3) para prestar queixa. Ela denunciou Camargo por injúria racial, discriminação racial e discriminação religiosa.
Educafro pede ao MPF abertura de ação penal por racismo contra presidente da Fundação Palmares
Mãe Baiana de Oyá é Coordenadora de Políticas de Promoção e Proteção da Diversidade Religiosa da Secretaria de Justiça do DF. Ao G1, ela disse ter ficado “em choque” com a situação.
“Eu fiquei chocada. Trabalhei dentro da fundação e dei minha contribuição. Aí você ouve isso de uma pessoa que é responsável pela instituição. Foi um choque.”
Acionado pela reportagem, por meio da Fundação Palmares, Sérgio Camargo não havia se manifestado até a última atualização desta reportagem.
A ocorrência policial foi registrada na Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual ou contra a Pessoa Idosa ou com Deficiência (Decrin). Segundo a Polícia Civil, a investigação será encaminhada para a Polícia Federal, já que envolve o presidente de uma entidade do governo federal.
“Foi um ato discriminatório contra a mulher, contra a negritude. Eu não tenho histórico de mulher vagabunda, sou amada pelo meu povo, pela minha tradição.”
Reunião gravada
As ofensas foram proferidas em uma reunião, no dia 30 de abril, gravada sem consentimento do presidente da Fundação Palmares. Os áudios foram divulgados na terça-feira (2) pelo jornal “O Estado de S. Paulo”. Nas gravações, Camargo faz acusações a Mãe Baiana.
“Tem gente vazando informação aqui pra mídia. Vazando pra uma mãe de santo, uma filha da puta de uma macumbeira. Uma tal de Mãe Baiana, aquela que infernizava a vida de todo mundo. É. Além de fazer macumba pra mim, essa miserável tá querendo agitar invasão aqui de novo. Eu sei, tem gente no grupo dela de WhatsApp. Tinha esquema. Não vai ter nada, nada pra terreiro, da Palmares, enquanto eu estiver aqui dentro. Nada, sério. Macumbeiro não vai ter nenhum centavo”, disse.
Ao G1, a mãe de santo disse que trabalhou na Fundação Palmares entre 2015 e 2019 e que nunca teve contato com Sérgio Camargo.
“Eu não conheço esse rapaz [Sérgio]. Creio que, depois de quatro meses depois que eu saí, ele chegou. Eu nunca tive contato. Nem antes. Nunca ouvi falar.”
Outras declarações
Nos áudios divulgados pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, Sérgio Camargo também chamou o movimento negro de “escória maldita”, também disse que Zumbi dos Palmares era “filho da puta que escravizava pretos”, criticou o Dia da Consciência Negra e falou em demitir “esquerdista”.
A reunião foi marcada para tratar do desaparecimento de um celular corporativo de Camargo. Questionado no encontro a respeito de quem poderia ter pego o aparelho, respondeu: “Qualquer um. Eu exonerei três diretores nossos assim que voltei. Qualquer um deles pode ter feito isso. Quem poderia? Alguém que quer me prejudicar, invadindo esse prédio aqui pra me espancar. Quem poderia ter feito isso? Invadindo com a ajuda de funcionários daqui. O movimento negro, os vagabundos do movimento negro, essa escória maldita”.
Sobre Zumbi dos Palmares – que dá nome ao órgão de promoção da cultura afro-brasileira –, Camargo comentou:
“Não tenho que admirar Zumbi dos Palmares, que pra mim era um filho da puta que escravizava pretos. Não tenho que apoiar Dia da Consciência Negra. Aqui não vai ter, zero – aqui vai ser zero pra [Dia da] Consciência Negra. Quando eu cheguei aqui, tinha eventos até no Amapá, tinha show de pagode com dinheiro da Consciência Negra. Aí, tem que mandar um cara lá, pra viajar, se hospedar, pra fiscalizar… Que palhaçada é essa?”.
Após a divulgação do material, a Fundação Palmares divulgou nota afirmando que “está sob um novo modelo de comando, este mais eficiente, transparente, voltado para a população e não apenas para determinados grupos que, ao se autointitularem representantes de toda a população negra, histórica e deliberadamente se beneficiaram do dinheiro público” (leia a íntegra ao final da reportagem).
Nomeação e suspensão
A nomeação de Camargo para a presidência da Fundação Palmares ocorreu no fim de novembro de 2019 e causou uma onda de reações. O motivo foi uma série de publicações, nas redes sociais, em que o jornalista relativizou temas como a escravidão e o racismo no Brasil.
Em 4 dezembro, a Justiça Federal do Ceará aceitou um pedido de ação popular e determinou a suspensão a indicação.
Dias depois, o governo do presidente Jair Bolsonaro suspendeu a nomeação do jornalista. Finalmente, em fevereiro deste ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reverteu a decisão da Justiça Federal do Ceará, atendendo a um pedido feito pela Advocacia-Geral da União (AGU).
O que diz a Fundação Palmares
Na terça, a Fundação Palmares enviou nota sobre os áudios de Sérgio Camargo. Veja íntegra abaixo:
“O presidente da Fundação Cultural Palmares (FCP), Sérgio Camargo, lamenta a gravação ilegal de uma reunião interna e privada. Assim, reitera que a Fundação, em sintonia com o Governo Federal, está sob um novo modelo de comando, este mais eficiente, transparente, voltado para a população e não apenas para determinados grupos que, ao se autointitularem representantes de toda a população negra, histórica e deliberadamente se beneficiaram do dinheiro público.
Infelizmente ainda existem, na gestão pública, pessoas que não assimilaram esta mudança e tentam desconstruir o trabalho sério que está sendo desenvolvido. Seguimos firmes em prol do Brasil e dos brasileiros! (Sérgio Camargo).
Fundação Cultural Palmares”