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Sem ter como sair de casa, homem faz geladeiras de canoa no Acre

Morador usa geladeiras como canoa em Rio Branco — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre

Com a decisão de continuar em casa e sem ter uma canoa para garantir o transporte e chegar à margem da rua, o autônomo Juarez Ferreira das Chagas resolveu improvisar e usar carcaças de duas geladeiras que uniu para atravessar a água que inundou a Rua Baguari, no Bairro Taquari, segundo Distrito de Rio Branco.

“Foi a saída que encontrei para a gente não ficar ilhado em casa. A gente não tem condições e tem que sair, porque não consegue ficar esse tempo todo dentro de casa e improvisei para conseguir sair”, contou, durante entrevista à Rede Amazônica Acre.

O Rio Acre está com 15 metros, na medição das 18 horas desta quinta-feira (25). Mesmo apresentando sinais de vazante, o nível ainda é alto já que está um metro acima da cota de inundação, que é de 14 metros.

O estado do Acre vive uma situação complicada com dez municípios atingidos pela cheia de rios. Mais de 130 mil pessoas chegaram a ser atingidas pelas enchentes dos rios. O governo federal reconheceu o decreto de calamidade pública por causa dos alagamentos. Os municípios de Rio Branco, Sena Madureira, Santa Rosa do Purus, Feijó, Tarauacá, Jordão, Cruzeiro do Sul, Porto Walter, Mâncio Lima e Rodrigues Alves enfrentam dificuldades com parte da população desabrigada (encaminhada para abrigos) e desalojada (levada para casa de parentes).

Além de ter que se virar no improviso, o morador, que está ilhado com a esposa em casa, ainda ficou doente durante o período de enchente. Durante a noite, ele diz passar várias horas acordado com medo de bichos que podem entrar em casa. Mesmo assim, ele fala que prefere não sair e afirma que a família precisa de ajuda.

“A gente precisa de ajuda, porque adoeci e nem procurei médico e estou com mais de 20 dias parado por causa do fechamento dos bares e não tem nenhum ganho. É um problema, animais, doenças e a pandemia, não consigo trabalhar. Já matamos cobra dentro da cozinha, mas a gente não pode sair não tem condições, então é encarar”, contou, sobre a situação que vive com a esposa.

Maria Evonilde, de 59, anos, pesca no quintal de casa para passar o tempo e alimentar animais — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre

Pesca no quintal

Só em Rio Branco são pelo menos 13,7 mil pessoas afetadas e 24 bairros atingidos. No conjunto Canaã, Maria Evonilde, de 59 anos, mora com o marido ao lado do Igarapé Judia e consegue até pescar no quintal de casa. Sem energia e água, ela reclama que até agora não recebeu nenhuma ajuda.

“A gente está sem energia e sem água também porque não estamos comprando. E é difícil, porque os bichos entram dentro de casa, formiga, insetos. Tenho medo e coloco o cortinado bem colocado, porque toda imundice entra para procurar o lugar enxuto. Me acordo, levanto para olhar, tem barulho na água e abro a janela para olhar mesmo com medo. Também tenho medo que ela [água] suba. Ainda não fui para a colônia da minha filha porque se alagar, o pouco que a gente tem perde”, conta.

Mesmo com a situação difícil que vive, ela não perdeu a solidariedade. Com uma vara de pescar, da área de casa ela pega peixes que dá para os animais que ficaram pela região.

“Eu gosto mesmo de dar comida aos bichinhos que estão ilhados, o gatinho. E ajuda a passar o tempo”, contou.

Estes moradores que conseguem permanecer em casa, mesmo como o nível do rio elevado, possuem casas suspensas, que permite resistir.

Situação de calamidade

O Ministério de Desenvolvimento reconheceu estado de calamidade decretado pelo governo do Acre para 10 cidades atingidas pelas cheias no estado. Nessa quarta (24), o presidente Jair Bolsonaro visitou o Acre para ver de perto a situação. O estado deve receber, para distribuir entre os 10 municípios que estão com a situação de calamidade reconhecida o montante de R$ 16 milhões.

O coordenador da Defesa Civil Estadual, Eudemir Bezerra, explica que o valor deve estar disponível a partir desta sexta (26).

“Estamos saindo da fase de socorro, de retirada das pessoas. Passada essa parte, a gente precisa, dentro do nosso sistema, informar a ocorrência à Defesa Civil Nacional, que é o decreto, depois disso temos que mostrar uma resposta, que é o que precisa tentar resolver o problema de socorro. E o governo Federal atendeu nossos pedidos que foi em torno de R$ 16 milhões”, afirma.

O coordenador acrescenta ainda que a situação é preocupante em todas as cidades que estão afetadas, apesar de alguns locais já estarem apresentando a vazante dos rios.

“A gente fica preocupado ainda porque a terra está saturada, pouco sol e qualquer chuva eleva rapidamente o nível dos rios, então, é nesta expectativa que a gente trabalha”, acrescenta.