Após muitos meses de expectativa e preparativos, Isabella Victória agora está no quartinho pensado com tanto amor por seus pais, Ellen e Rodrigo. A bebê, que nasceu em Montes Claros, representa a realização de um sonho do casal trans.
“Montamos tudo, pensamos em cada detalhe e imaginamos como seria esse quarto. Para ficar completo, só faltava ela. Estávamos ansiosos para chegarmos em casa, para ela conhecer esse lugar que foi feito com tanto amor”, fala Rodrigo Brayan da Silva
Foi ele quem deu à luz Isabella, que nasceu de parto normal na última terça-feira (6). Com 50 centímetros, a menina pesou três quilos.
“As pessoas perguntam se ela vai ser mimada, eu falo que vou mimar mesmo, sempre foi meu sonho, estamos aqui grudadinhas. Somos a prova de que toda forma de amor vale a pena”, diz Ellen Carine, companheira de Rodrigo.
Muitos dos itens que estão no quarto da pequena Isabella foram ganhados de pessoas que o casal sequer conhece. Os presentes vieram de vários estados do país, como Rio de Janeiro, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Minas Gerais.
“O sentimento é de gratidão, essas pessoas nos fazem sentir que estamos amparados. Queremos que as pessoas não coloquem rótulos e não nos marginalizem, que consigam entender que um casal trans pode construir uma família. Nosso desejo é que elas nos olhem e nos amem como somos, que ouçam nossa voz”, fala Ellen.
E já com Isabella em casa, ela e Rodrigo se revezam com as tarefas.
“É tudo muito novo, a ficha ainda está caindo. Ao olhar para a nossa filha só posso pensar que nos encontramos para realizar um sonho em comum”, completa Rodrigo.
O nome de Isabella foi escolhido com a intenção de fazer uma homenagem a uma pessoa que foi fundamental ao longo da gestação de Rodrigo.
“Nós confirmamos a gravidez com quatro testes. Em seguida, liguei para minha agente de saúde e ela disse que tínhamos que começar o pré-natal. Ao chegar no posto, conhecemos uma acadêmica de medicina chamada Isabella, que foi sempre muito carinhosa e atenciosa, nos tratou sem qualquer tipo de julgamento ou preconceito, a gente pensava: se tivermos uma filha, ela vai ser como essa mulher”, emociona-se Ellen.
Logo que descobriram que teriam uma menina, eles contaram à homenageada, Isabella Oliveira, sobre a escolha do nome. Além da estudante, eles contaram com o acompanhamento do médico que atende no posto.
“Fiquei muito feliz com a homenagem. É um misto de sensações, tive frio na barriga por ser uma situação nova e por não saber se iria corresponder à expectativa do paciente, me senti feliz por compartilhar o momento e por contribuir com a realização de um sonho, que pode ser o mesmo de vários casais que ainda não tiveram a oportunidade ou não conseguiram ter um filho”, diz a futura médica.
Além de acompanhar o pré-natal, a estudante, que está no último período de graduação, também esteve presente no parto. Para ela, a história de Ellen e Rodrigo evidenciou ainda mais a a importância do Sistema Único de Saúde.
“Todo o acompanhamento deles foi feito pelo SUS que, muitas vezes, é alvo de tantas críticas. Mas eu gostaria de dizer que nós estamos de portas abertas e que existem profissionais capacitados e com disposição para acolher. Sou muito grata ao serviço público de saúde, que me ensinou mais do que qualquer livro.”
E, para Isabella, que encontrou na medicina uma possibilidade de fazer o que mais gosta, conviver com pessoas, o nascimento da xará vai ficar marcado para sempre.
“Foi uma honra fazer parte da equipe, todos os profissionais do hospital estavam empenhados em tornar aquele momento especial. A história deles vai inspirar outras pessoas que têm o mesmo desejo e vai ajudar a quebrar preconceitos.”
E a pequena Isabella saiu do Hospital Universitário Clemente de Faria com os nomes de Rodrigo como pai e Ellen como mãe. Com orgulho, o casal saiu da unidade com a Declaração de Nascido Vivo como sempre sonharam.
“Quando fomos ao hospital nos explicaram que esse era o primeiro parto de um casal trans. Nos disseram que havia um protocolo, mas que iriam ver o que poderia ser feito para atender a nossa vontade de que ela tivesse meu nome como pai e o da Ellen como mãe. Nós não queríamos ter que ir atrás de advogado quando ela nascesse para fazer uma mudança na declaração, queríamos só curtir a nossa filha, que é o desejo de todo casal”, explica Rodrigo.
“Esperamos que a nossa filha possa viver em um mundo melhor, com o amor em primeiro lugar. Que esse mundo não seja um mundo em que as pessoas são julgadas por sua opção sexual, por cor, raça ou qualquer outro tipo de preconceito”.