País registrou o maior número diário de mortes e concentrou 49% dos infectados e 28% dos óbitos do mundo em 24 h. Mesmo assim, especialistas veem subnotificação nos dados oficiais.
A Índia registrou nesta quinta-feira (6) um novo recorde mundial de casos diários de Covid-19 (412 mil) e também o maior número de mortes do país (3.980), segundo dados oficiais do governo.
Os números do Ministério da Saúde indiano elevam o total de infectados para mais de 21,1 milhões e o de óbitos, para mais de 230 mil.
O país foi responsável por 49% dos casos e 28% das mortes registradas no planeta nas últimas 24 horas, segundo dados do “Our World in Data”, projeto ligado à Universidade de Oxford.
Mas especialistas consideram que os números oficiais estão muito abaixo da realidade e que o pior cenário ainda vai acontecer dentro de algumas semanas.
O vírus está se espalhando pelo interior, nas áreas rurais, onde vivem 70% dos mais de 1,3 bilhão de habitantes do país, que é o segundo mais populoso do mundo.
“A situação se tornou perigosa nas aldeias”, diz Suresh Kumar, coordenador de campo da Manav Sansadhan Evam Mahila Vikas Sansthan, uma instituição de caridade de direitos humanos.
Kumar diz que “há mortes em quase todas as casas” em aldeias onde a instituição trabalha, no estado de Uttar Pradesh (onde vivem cerca de 200 milhões, quase a população inteira do Brasil).
“As pessoas estão com medo e amontoadas em suas casas com febre e tosse”, afirma Kumar. “Os sintomas são todos de Covid-19, mas sem nenhuma informação disponível muitos pensam que é gripe sazonal”.
A explosão no número de casos provocou o colapso dos hospitais, que enfrentam falta de leitos, remédios e oxigênio. Crematórios não conseguem atender ao volume de corpos nas grandes cidades.
Muitas pessoas morrem em casa ou na porta dos hospitais, à espera de um leito ou oxigênio. Parentes precisam pagar pelos insumos médicos dos internados e até pela lenha da cremação.
Diversas cidades têm feito cremações em massa e até a noite, e o número de cerimônias sob os protocolos da Covid-19 são muito maiores do que o de vítimas dos balanços oficiais do governo.
Falhas do governo
O governo do primeiro-ministro Narendra Modi tem sofrido duras críticas por se negar a decretar um lockdown nacional e ter liberado festivais religiosos e comícios eleitorais, que reuniram multidões.
Em meio à escalada da segunda onda no país, várias regiões, incluindo a capital Nova Délhi e o estado mais populoso Maharashtra, onde fica o centro financeiro Mumbai, adotaram medidas de restrição.
O colapso sanitário do país ocorre após o governo ter comemorado precocemente o “fim da pandemia” e não ter agido para minimizar o impacto da segunda onda do vírus.
Em janeiro, Modi afirmou no Fórum Econômico Mundial de Davos que “a Índia foi bem-sucedida em salvar tantas vidas, nós salvamos a humanidade toda de uma grande tragédia”.
Em março, o ministro da Saúde indiano, Harsh Vardhan, declarou que o país estava na “fase final” da pandemia. Vardhan também chegou a dizer que o país estava mais bem preparado para enfrentar a segunda onda.
Terceira onda?
Ainda no meio da segunda onda, K. Vijay Raghavan, principal conselheiro científico do governo indiano, afirmou que uma terceira onda “é inevitável, dados os elevados níveis de contaminação atuais”.
“Não está claro exatamente quando acontecerá este terceiro episódio, mas temos que nos preparar para novas ondas”, afirmou Raghavan em uma entrevista coletiva.
Com a explosão de casos, novas variantes podem surgir. Há a suspeita que uma nova cepa do coronavírus, a B.1.617, tenha contribuído para a gravidade da segunda onda.
Problemas na vacinação
Para piorar, o país sofre com problemas em sua vacinação contra a Covid-19 mesmo sendo o maior produtor mundial de imunizantes.
A Índia é o terceiro país que mais aplicou doses até o momento (157 milhões), atrás apenas de China (284 milhões) e Estados Unidos (247 milhões), mas o ritmo da vacinação tem caído drasticamente.
A média de vacinas administradas por dia caiu pela metade em menos de um mês, de um pico de 3,66 milhões no dia 10 de abril, quando o país chegou a superar os EUA, para 1,84 milhões atualmente.
Segundo país mais populoso do mundo, com mais de 1,3 bilhão de habitantes, a Índia tem apenas 11,4 doses aplicadas a cada 100 habitantes, número inferior ao da China (19,7) e da média mundial (15,3).