“Não dá tempo da lágrima rolar”. É assim que a enfermeira de Volta Redonda (RJ), Giselle Guimarães, de 37 anos, relata o dia a dia dentro dos dois hospitais em que trabalha.
O G1 conversou com ela e com a também enfermeira Fabiana de Azevedo em reportagem especial para este 12 de maio, Dia Mundial da Enfermagem. Elas se emocionaram ao falar do trabalho realizado durante a pandemia da Covid-19.
“A enfermagem hoje carrega a saúde do Brasil e do mundo nas costas. Por muitos anos, nós ficamos menosprezados, esquecidos e não somos valorizados. Mas mesmo assim a gente não abaixa a cabeça, a gente não foge da luta, não abandona o paciente e não dá uma assistência inadequada”, afirmou Giselle.
Desde que o novo coronavírus chegou ao Brasil, milhares de pessoas já morreram pela doença. Giselle vivencia esse momento de tristeza todos os dias, confessa a dificuldade e o cansaço de lidar com a pandemia:
“Parece que a gente está em um redemoinho. Parece que não vamos sair nunca. Às vezes a curva epidemiológica cai, aí a gente acha que está amenizando, mas logo depois aparece uma variante, novos sintomas e a gente começa a luta tudo de novo. Parece que não tem fim”.
“Às vezes a gente acabou de perder uma vida e já temos que correr para tentar salvar uma outra”, completou.
Essa rotina também é vivenciada pela Fabiana de Azevedo, de 42 anos, moradora de Resende (RJ) que atua na linha de frente do combate à pandemia em um hospital particular da cidade.
Para ela, a vida mudou completamente depois que a Covid-19 começou a fazer vítimas no Brasil. “Quando a pandemia chegou no país era tudo desconhecido, não sabíamos como seria. Um misto de incerteza e insegurança”, disse ela.
Em março de 2020, logo que as aulas presenciais foram suspensas, Fabiana decidiu levar os filhos, um casal de gêmeos, para morar com os avós em Ipiabas, distrito de Barra do Piraí (RJ). A decisão foi tomada pela insegurança de conviver com eles enquanto trabalhava na linha de frente do combate à pandemia.
Contudo, pouco tempo depois, Fabiana perdeu o pai por um infarto fulminante e acabou trazendo novamente os filhos e a mãe para morar com ela em Resende.
Giselle também optou por se afastar do marido e do filho mais novo durante a pandemia e ficou morando apenas com o mais velho e a neta. O sacrifício de ficar longe de quem ama foi uma escolha pelo próprio bem deles, diz a enfermeira.
Porém, depois de se contaminar com a Covid-19, a família que estava longe voltou para cuidar dela.
Atualmente, tanto Giselle como Fabiana redobraram os cuidados no combate à Covid-19 para continuarem perto de quem amam .
“Como trabalho no hospital e tenho contato diariamente com pessoas, mantivemos o uso de máscaras e de higienização das mãos. Fizemos isolamento residencial”, explicou Fabiana.
“Pijama e roupa de hospital são lavados separadamente. Antes de sair do trabalho, eu tomo banho no hospital e já saio com outra roupa”, disse Giselle.
Entretanto, o contato com os demais familiares segue apenas por chamada de vídeo. Giselle conta que sua mãe faz parte do grupo de risco e, mesmo tomando todos os cuidados, tem medo de infectá-la durante uma visita. “É com coração apertado, mas apenas com vídeo chamada”, lamentou.
Giselle participa de três a quatro procedimentos de intubação por plantão. Ela precisa ser firme durante o processo, mas confessa que não é fácil:
“Preciso devolver um sorriso com um olhar para ele [o paciente] e passar esperança. Mas eu te confesso que: depois que isso tudo acontece, a gente sai do ambiente e desaba mais uma vez, porque a gente sabe que, muitas vezes, o comprometimento é tão grande que aquele conforto ali é só mesmo para ele fazer a passagem. Mas a gente tenta transmitir paz e esperança”.
A enfermeira de Volta Redonda conta que, às vezes, um paciente passa por ela em três estágios: pronto socorro, UTI e fechamento do óbito na Vigilância Epidemiológica, onde também atua.
“No pronto socorro, eles [pacientes] chegam graves pra gente. Na unidade de terapia intensiva, já estão gravíssimos, muita das vezes antes de intubar [estão] pedindo oração, mandando recado para a família. E na Vigilância Epidemiológica, fecho os dados daquele paciente que veio a óbito”, relatou.
A situação é parecida no hospital onde Fabiana trabalha:
“Já vivenciamos famílias perdendo membros importantes como pai e mãe, pacientes que lutaram para não serem intubados com medo da morte… São momentos que marcaram muito os profissionais da saúde”.
Entretanto, há também os momentos de felicidade e esperança. Fabiana conta que os resultados felizes impulsionam a equipe a acreditar que é possível vencer a luta, mesmo ela sendo grande e desafiadora.
Giselle, bastante emocionada, compartilhou com o G1 alguns desses resultados:
“A gente já se emocionou quando o paciente saiu do tubo. Quando esse paciente abriu o olho a primeira vez. Quando conseguimos colocá-lo sentado no leito. Quando suspendemos aquela medicação que era mais forte. Quando sacamos a sonda. Quando teve alta do CTI para a clínica médica. E, por fim, a gente já se emocionou quando esse paciente foi para casa”.
Mesmo com os breves momentos de alegria na rotina de trabalho e com a chegada da vacina contra a Covid-19, a sensação continua a mesma: medo e insegurança.
Fabiana e Giselle foram imunizadas em janeiro e relatam que, após receberem as doses, ficaram mais esperançosas. Porém, admitem o medo das variantes que a doença pode ter.
Por isso, as enfermeiras reforçam a confiança nas vacinas e incentivam a população a se vacinar: “Vacina salva vidas”, lembraram com esperança.
Fabiana lembrou também que as mortes provocadas pela Covid-19 não são números, mas sim famílias derrotadas. Em uma mensagem aos colegas de profissão neste Dia da Enfermagem, ela deseja que todos continuem fazendo a diferença, com amor e respeito à vida dos pacientes.
“Neste 12 de maio, a representatividade é isso: orgulho de carregar a saúde. Orgulho de ter a maior equipe dentro do hospital. Orgulho de saber que a saúde só está andando porque a gente está carregando. Eu sou feliz por ser enfermeira. Um abraço aos meus companheiros e à minha equipe”, concluiu Giselle.