Política

‘Em Pernambuco, não existe PM paralela’, diz secretário após policiais atirarem em manifestantes

Nesta segunda (31), governo recebe parentes dos dois homens que perderam parte da visão ao serem atingidos em protesto no Recife, no sábado (29).

Policiais Militares atiraram balas de borracha, spray de pimenta e gás lacrimogêneo contra participantes de protesto contra Bolsonaro, no Recife — Foto: Agência JCMazella/Sintepe/Divulgação

“A Polícia Militar vem, ao longo de todo esse período de governo, acompanhando manifestações, às vezes até impedindo manifestações, mas sem uso da violência, sem uso de esforço físico de forma dura e radical. Então, essa medida, essa decisão, esse comportamento será investigado. Quero deixar bem claro: em Pernambuco, não existe Polícia Militar paralela. Existe a Polícia Militar de Pernambuco, que tem como o seu comandante o governador de Pernambuco.”

Essa declaração é do secretário estadual de Justiça e Desenvolvimento, Pedro Eurico, que se pronunciou nesta segunda-feira (31) sobre a ação truculenta da PM durante o protesto pacífico contra o presidente Bolsonaro (sem partido), ocorrido no sábado (29) no Recife. Dois homens que não participavam do ato foram atingidos por balas de borracha nos olhos e perderam parte da visão.

O governo estadual não informou quem deu a ordem para a Polícia Militar usar gás lacrimogêneo, spray de pimenta e balas de borracha contra os manifestantes. No sábado (29), em um vídeo postado no Twitter, a vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos (PCdoB) afirmou que a ação policial não foi autorizada pelo estado.

Ainda segundo o secretário, foram abertos um inquérito policial de lesão corporal gravíssima e um inquérito policial militar para investigar a atuação da polícia. “Tudo vai ser objeto de investigação. Das câmeras, já foram colhidas as imagens. As imagens estão sendo estudadas e evidentemente tudo vai ser esclarecido”, afirmou Pedro Eurico.

O G1 entrou em contato com a Polícia Civil para saber quais crimes são apurados e com a Secretaria de Defesa Social de Pernambuco para solicitar os nomes do comandante da operação e dos quatro PMs afastados das funções pelo governador Paulo Câmara (PSB), mas não recebeu resposta até a última atualização desta reportagem.

“Quem desrespeitar vai responder de acordo com a lei. Nós temos um código de disciplina militar, tem a lei de abuso de autoridade… Então, tudo vai ser objeto de uma investigação clara e criteriosa. […] Nada vai ficar debaixo do tapete”, declarou Pedro Eurico.

O secretário também falou sobre como deve ser a atuação da polícia em manifestações. “O protocolo é de acompanhamento e respeito aos manifestantes e qualquer esforço terá que ser de forma gradual e mínima. Sempre o protocolo indica primeiro negociação, segundo entendimento e terceiro, se tiver necessidade de um confronto, que se dê com o mínimo de violência possível. Primamos pelo respeito aos direitos humanos e pela ordem democrática”, declarou.

Indenização
Após serem atingidos nos olhos pelas balas de borracha atiradas pelos PMs, Daniel Campelo da Silva, de 51 anos, e Jonas Correia de França, de 29 anos, foram socorridos para o Hospital da Restauração, na área central do Recife, onde seguem em observação nesta segunda-feira (31).

Daniel passa por uma operação no olho atingido pela bala de borracha ainda nesta segunda-feira (31). O G1 entrou em contato com a família de Jonas para saber se ele também vai passar por cirurgia, mas não recebeu resposta até a última atualização desta reportagem.

Um terceiro ferido, Ednaldo Pereira de Lima, de 58 anos, foi atingido na perna, mas teve alta na manhã do domingo (30).

Os parentes de Daniel e Jonas participam, na manhã desta segunda-feira (31), de uma reunião no Palácio do Campo das Princesas, a sede do governo estadual. O Poder Executivo também informou que acompanha a assistência médica aos dois feridos.

“Nós vamos conversar com os familiares e iniciar um trabalho de negociação, de ouvir as pessoas, no sentido de se buscar uma reparação em dinheiro, uma indenização”, disse.

Manifestação pacífica
O ato do sábado (29) foi organizado por centrais sindicais e movimentos sociais em uma mobilização nacional que promoveu manifestações em todo o país contra Bolsonaro e a favor da aceleração de medidas de prevenção à Covid-19, como a campanha de vacinação e auxílio emergencial de, ao menos, R$ 600.

No Recife, os manifestantes caminhavam com faixas com dizeres como “estou na rua porque Bolsonaro recusou mais de 150 milhões de vacinas” e “fora Bolsonaro genocida”, e estavam organizados em filas, para tentar respeitar um distanciamento social mínimo e prevenir o contágio pela Covid-19.

Após sair da Praça do Derby, o protesto chegou, por volta das 11h30, à Ponte Duarte Coelho, também no Centro da capital. No local, a Polícia Militar começou a dispersar os manifestantes. Bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha foram atiradas contra os participantes do ato.

Houve correria e gritaria. Entre as vítimas, está a vereadora do Recife Liana Cirne (PT), que foi atingida com spray de pimenta no rosto por policiais. O cantor Afroito foi arrastado e detido por policiais militares durante o protesto, sendo liberado após pagar fiança de R$ 350.

O advogado Roberto Rocha Leandro, que é presidente da Comissão de Direito Parlamentar da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB), foi agredido com dois tiros na perna e dois nas costas disparados pelos policiais militares.