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Justiça condena Uber a pagar indenização de R$ 2 mil a usuário vítima de LGBTfobia em BH

Motorista do aplicativo chamou o passageiro de "bicha" e "veadinho" durante uma corrida. Caso aconteceu em 2019. Uber diz que "defende o respeito à diversidade e reafirma o seu compromisso de promover o respeito, igualdade e justiça para todas as pessoas LGBTQIA+".

Ilustração

Motorista por aplicativo

A Justiça condenou a Uber a indenizar em R$ 2 mil um usuário vítima de LGBTfobia em Belo Horizonte.

O caso aconteceu em agosto de 2019, quando o músico, de 31 anos, que pediu para ser identificado apenas como João, solicitou uma corrida pelo aplicativo.

Ele estava indo para um evento cultural e, durante trajeto, o motorista fez uma rota diferente da indicada pelo GPS, prolongando a distância.

O passageiro se sentiu inseguro e solicitou a parada do veículo e o encerramento da corrida, mas o motorista se exaltou e passou a proferir ofensas de cunho homofóbico, como “bicha” e “veadinho”. O condutor ainda desceu do carro e continuou xingando-o em público.

“Foi muito constrangedor. Senti uma mistura de raiva, porque eu tinha sido convidado para um evento cultural, estava vestido como um artista queer, maquiado, estava em um dia bom, e impotência, porque o que eu poderia fazer? O que mais me deixou frustrado foi o fato de a empresa ter tirado o corpo fora”, disse a vítima ao G1.

Defesa

De acordo com a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG), responsável pela defesa do passageiro, ao ser informada sobre o caso, a Uber não ofereceu respostas satisfatórias nem informou os dados do motorista, alegando que só poderia repassá-los mediante ordem judicial.

O músico registrou boletim de ocorrência e juntou as reclamações registradas na empresa, que liberou os dados do condutor após solicitação da Polícia Civil.

O defensor público Vladimir Rodrigues, que atua na Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais, entrou em contato com a Uber. A companhia alegou que o motorista parceiro não presta serviços à empresa e, sim, aos usuários da plataforma.

Rodrigues não concordou com a resposta e entrou com uma ação no Juizado Especial, solicitando a indenização por danos morais. Segundo ele, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, a Uber opera como prestadora de serviços e deve se responsabilizar pelos danos ocorridos.

“Os atos LGBTfóbicos ou de agressão cometidos pelos motoristas de aplicativos de transporte são também e, principalmente, responsabilidade das empresas prestadoras de serviços. As empresas informam os usuários que não têm responsabilidade, jogando nas costas dos motoristas que, de outro lado, são a parte mais fragilizada. Em regra, são pessoas desempregadas, procurando seu sustento”, afirma o defensor.

A Justiça teve o mesmo entendimento da Defensoria e considerou que, ao realizar atividade de intermediação entre os consumidores e os motoristas, a empresa “passa a integrar a cadeia de fornecimento do serviço”.

Segundo a decisão, embora a empresa tenha informado que “tenha tomado as medidas administrativas cabíveis e estornado o valor da viagem”, não apresentou nos autos “o procedimento administrativo interno instaurado para apurar o incidente, se é que ele existe, nem o histórico de avaliações e reclamações do motorista”.

“A conduta do motorista certamente trouxe ao autor prejuízos que extrapolam o mero aborrecimento cotidiano e adentram os direitos da personalidade, afetando bens que têm um valor precípuo na vida do ser humano: a dignidade, a paz, a tranquilidade de espírito, a integridade psíquica, entre outros afetos, caracterizando assim a produção de um dano de natureza moral”, diz um trecho da decisão, assinada pela juíza Claudia Regina Macegosso.

O músico acredita que a decisão é importante para incentivar outras pessoas, vítimas de LGBTfobia, a denunciar casos semelhantes.

“Acho que é um início para que quem se sentir agredido saber que deve ir em frente, denunciar, fazer com que as ocorrências virem processos para que a LGBTfobia não passe mais batido no Brasil”, afirma.

 

O que diz a Uber

Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em favor da criminalização da homofobia e da transfobia. Desde então, essas condutas passaram a ser enquadradas como crime de racismo.

Em nota, a Uber informou que “defende o respeito à diversidade e reafirma o seu compromisso de promover o respeito, igualdade e justiça para todas as pessoas LGBTQIA+”.

“A empresa considera inaceitável qualquer tipo de discriminação. Em casos dessa natureza, a Uber fica à disposição para colaborar com as autoridades e compartilhar informações sobre os envolvidos, observada a legislação aplicável”, concluiu.