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Como Lázaro foi para o semiaberto em 2016 e fugiu durante ‘saidão’

Foto recente de Lázaro Barbosa enviada pela Polícia Civil — Foto: Reprodução TV Anhanguera

Anos antes da caçada que já dura 13 dias, Lázaro Barbosa de Souza, de 32 anos, havia fugido de presídios diversas vezes. A primeira foi em março de 2016, quando ele escapou do Centro de Progressão Penitenciária (CPP), durante um “saidão” de Páscoa.

O benefício foi concedido depois que Lázaro, que cumpria pena em regime fechado, conseguiu progressão para o semiaberto. O G1 teve acesso ao processo que concedeu o benefício para o procurado, que à época já tinha sido condenado por roubo e estupro.

Os documentos mostram que houve receio em relação à medida, por conta da alta chance de Lázaro voltar a cometer crimes. A Justiça permitiu a concessão por entender que ele já cumpria os requisitos necessários. No entanto, os documentos indicam que Lázaro não tinha autorização para saídas temporárias.

A reportagem questionou a Secretaria de Administração Penitenciária do DF (Seape-DF) e o Tribunal de Justiça do DF sobre quem foi responsável pela liberação de Lázaro. No entanto, não recebeu reposta até a última atualização desta reportagem.

Cinco anos depois, Lázaro é procurado por centenas de agentes de forças de segurança do DF e de Goiás, pelo homicídio de quatro pessoas de uma mesma família, em Ceilândia. Durante a fuga, já invadiu chácaras, fez reféns, e conseguiu escapar dos policiais.

Lázaro foi preso no DF em agosto de 2010. No ano seguinte, acabou condenado a penas que somavam 15 anos, 8 meses e 19 dias de reclusão, por crimes de roubo, estupro e porte ilegal de arma de fogo. O tempo que passou preso preventivamente contou como cumprimento da pena.

Inicialmente, Lázaro ficou detido na Penitenciária do DF II (PDF II), no Complexo da Papuda. O primeiro pedido de progressão para o semiaberto veio em 2013, três anos após a prisão.

Lázaro chegou a escrever uma carta à mão, endereçada ao então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, com o pedido.

Carta escrita por Lázaro Barbosa e enviada ao STF pedindo concessão de regime semiaberto — Foto: Reprodução

À ocasião, o juiz Rodrigo Cordeiro de Souza Rodrigues demonstrou “receio”. O magistrado citou o “comportamento singular do autor, consubstanciado em ações de violência contra outro ser humano, tudo a demonstrar uma personalidade que se revela, nitidamente antissocial”. Por isso, antes de decidir, determinou a realização de um exame criminológico de Lázaro.

Foi desse pedido que veio o laudo que, em 2013, apontou traços como “agressividade, ausência de mecanismos de controle, dependência emocional, impulsividade, instabilidade emocional, possibilidade de ruptura do equilíbrio, preocupações sexuais e sentimentos de angústia”.

O documento também apontava que Lázaro “provavelmente retornará a delinquir”, e recomendou a “implementação de algumas medidas e posterior avaliação psicológica antes da concessão de qualquer benefício”.

Questionado pelo juiz, o Ministério Público do DF (MPDFT) reconheceu que Lázaro já tinha cumprido dois quintos da pena e tinha direito à progressão. Mas alertou para os cuidados necessários frente ao perfil do condenado.

“O sentenciado ainda não está apto a retornar ao convívio social e que, no momento, o seu grau de periculosidade é alto”, disse o Ministério Público.

 

O MP recomendou que Lázaro cumprisse a pena no semiaberto, mas sem direito a benefícios externos, como trabalho e saídas. Em 14 de março de 2014, o juiz Ademar Silva de Vasconcelos atendeu a sugestão, e o preso foi transferido para o Centro de Internamento e Reeducação (CIR), que recebe detentos nessa situação. Determinou também que ele fosse submetido a tratamento psicológico.

Benefícios externos

 

Fachada do Centro de Progressão Penitenciária (CPP) — Foto: TV Globo / Reprodução

Em 2015, a defesa de Lázaro apresentou um novo pedido, para que ele tivesse direito aos benefícios externos. À ocasião, o condenado já tinha cumprido integralmente a pena por estupro, de 6 anos. Portanto, não pesava contra ele condenação por crimes hediondos.

Após a nova solicitação, o Ministério Público pediu à Justiça, em dezembro daquele ano, a realização de um novo exame criminológico. O órgão argumentou que o laudo anterior “apontou diversos traços negativos, e mencionou expressamente a forte possibilidade de reincidência“.

Para o MP, era “imprescindível a realização de exame especializado, a fim de aferir-se se houve evolução positiva no quadro do sentenciado, diminuindo-se os riscos decorrentes de seu retorno ao convívio social”.

Em janeiro de 2016, a juíza Yeda Maria Morales Sanchez permitiu que Lázaro trabalhasse fora do presídio, e ele foi transferido para o Centro de Progressão Penitenciária (CPP). Porém, proibiu que tivesse direito às saídas temporárias, os chamados “saidões”, por conta “das peculiaridades do caso, dos traços negativos de personalidade e das circunstâncias que envolvem a prática do fato criminoso”.

Mesmo com essa determinação, em 24 de março de 2016, Lázaro foi um dos 1.450 detentos beneficiados com o “saidão” de Páscoa. Ele deveria ter retornado ao presídio na segunda-feira seguinte, 28 de março. No entanto, não voltou mais.

À época, ao comunicar a fuga à Justiça, o então diretor do presídio reforçou que o preso não podia ser beneficiado pelas saídas. Mesmo assim, foi liberado e não voltou. Veja:

Ofício comunicando fuga de Lázaro Barbosa de presídio do DF — Foto: Reprodução

Só em 6 de abril de 2016, a Justiça analisou o pedido de um novo exame criminológico feito pelo MP. O juiz Bruno Aielo Macacari negou a solicitação, alegando entender que “inexiste motivação concreta ou outros elementos informativos que pudessem justificar, de forma razoável, a realização de novo exame criminológico como condição inarredável à apreciação das benesses legalmente asseguradas”.

Na mesma decisão, também revogou a proibição de que Lázaro tivesse acesso às saídas temporárias. A essa altura, ele já havia sido beneficiado e estava foragido.

Lázaro chegou a ser recapturado em Águas Lindas de Goiás, em 2018, e foi levado para o presídio da cidade. A Justiça do DF chegou a determinar a transferência dele “com urgência” para um dos presídios da capital. Mas antes que isso fosse possível, Lázaro fugiu da unidade e, desde então, não foi mais pego.