O atleta e ator Terry Crews, famoso por sua atuação no seriado ‘Todo mundo odeia o Cris’, declarou em 2014, durante uma transmissão ao vivo pelo Facebook, vista por mais de três milhões de internautas, que a pornografia tinha “bagunçado a sua vida”.
Alguns dados sobre a indústria da pornografia são impressionantes: a indústria pornográfica faz mais dinheiro que a Major League Baseball, a NFL e o NBA juntos; 12% de todo conteúdo na internet é pornográfico; 1 novo filme pornô é lançado a cada 39 minutos; MindGeek, dona da Pornhub, Brazzers e YouPorn e RealityKings está no Top 3 das empresas com maior consumo de banda no mundo, sendo as outras duas Google e Netflix; XVideos é maior que CNN, Dropbox e New York Times juntos; Pornhub tem mais acessos mensais do que Netflix, Amazon e Twitter juntos; a cada segundo são gastos 3 mil dólares em pornografia.
Diante de tamanha expressão na produção e difusão de conteúdo pornográfico, o consumo de pornografia acompanha a mesma proporção. 90% dos meninos são expostos a pornografia; 22 milhões de brasileiros assumem consumir pornografia e 76% são homens; a maior parte é jovem (58% têm menos de 35 anos), de classe média alta (49% pertencem à classe B) e está em um relacionamento sério (69% são casados ou estão namorando). Além disso, 49% do público concluiu o ensino médio e 40% têm curso superior. Os dados são de uma pesquisa realizada pelo Quantas Pesquisas e Estudos de Mercado.
A expansão da indústria e do consumo do pornô têm causado sérios danos cognitivos, emocionais e comportamentais. Cresceu mais de 100% a procura por clínicas especializadas para tratamento em vício de pornografia. Os dependentes relatam, além do vício, problemas de intimidade, isolamento e prejuízos nas relações interpessoais.
Pesquisadores que atuam nos estudos de interface entre Mídia e Psicologia observam que o consumo dos conteúdos midiáticos altera nas pessoas a sua percepção sobre a realidade. Em outras palavras, a mídia possui uma potência discursiva que interfere na organização da subjetividade, ou seja, na percepção de si mesmo, do outro e do mundo. Dessa forma, o acesso aos conteúdos produzidos pela indústria pornográfica modela a maneira de percepção da sexualidade e das relações.
Os conteúdos dos filmes pornôs são centrados em gratificações e fantasias sexuais masculinas, reforçando estereótipos misóginos, violentos e racistas. Alguns exemplos evidenciam a brutalidade presente no vocabulário: “comer”, “socar”, “meter”, “passar a vara”, “dar uma bombada”, “dar uma pistolada”, entre outros.
Essa violência se manifesta na objetificação da mulher. A expectativa de vida média de uma atriz pornô é de 36 anos. Elas morrem antes dos 40, severamente maltratadas, apesar de muito dinheiro que possam ter feito, mas sua imagem continua a circular. No pornô, a maneira de perceber e agir sobre a sexualidade é distorcida. As pessoas se tornam objetos. Valorizam-se partes do corpo como o pênis e a vagina, que são coisas para serem usadas. Retifica-se o corpo no lugar de amá-lo.
A pornografia remove a intimidade do contato humano, desumaniza o encontro sexual, reduzido a um mecanicismo físico e agressivo. No pornô não há espaço para um engajamento mútuo e a dimensão humana do sexo que a mulher também exerce.
Escreveu o fundador da Psicologia Analítica, Carl Gustav Jung: “por ser o amor devotado e fiel o mais belo, nunca se deveria procurar o que pode torná-lo fácil. Alguém que se apavora e recua diante da dificuldade do amor é péssimo cavaleiro de sua amada. O amor é como Deus: ambos só se revelam aos seus mais bravos cavaleiros.(…) O amor custa caro e nunca deveríamos tentar torná-lo barato”.
“O prazer sexual serve para embelezar o amor”, disse o Papa Francisco na contramão da coisificação do humano e da sexualidade.
*Jorge Miklos é analista junguiano e sociólogo. Graduado em História e Ciências Sociais. Especialista em Psicologia Analítica. Mestre em Ciências da Religião e Doutor em Comunicação Social. Coordena uma pesquisa sobre as masculinidades contemporâneas.