Raiana Ribeiro, de 25 anos, saltou do terceiro andar do prédio onde trabalhava, para fugir das agressões da patroa. Ministério Público do Trabalho apura trabalho análogo à escravidão.
Melina Esteves França, suspeita de agredir e manter em cárcere privado a babá Raiana Ribeiro, de 25 anos, deixou o apartamento onde ela mora, no bairro do Imbuí, em Salvador, sob vaias de moradores e escoltada por policiais civis, para prestar depoimento na tarde desta sexta-feira (3).
A ex-patroa conversou com policiais civis por cerca de um hora e deixou o apartamento por volta das 15h, com duas malas. Ela estava acompanhada de um homem e dos policiais. A agressora entrou em um carro preto.
Segundo a Polícia Civil, foi cumprido um mandado de busca e apreensão no apartamento de Melina Esteves França. Além das buscas por dispositivos eletrônicos e outros elementos que possam colaborar para a elucidação do caso, a agressora compareceu à delegacia para prestar um novo depoimento.
A polícia informou que os desdobramentos compõem o conjunto de ações realizadas para a finalização do inquérito policial.
Babá diz que desmaiou após agressão
Nesta sexta-feira, Raiana, que pulou do terceiro andar de um prédio onde trabalhava para fugir de agressões da patroa, disse que desmaiou após ser atacada porque, além da violência, ficava sem comer no trabalho.
Imagens mostram a empregada desmaiando após uma série de pancadas.
O desmaio aconteceu por volta das 6h30 do dia em que ela pulou da janela para fugir do imóvel. Depois de uma sequência de tapas, socos, chutes e puxões de cabelos, Raiana levanta e se aproxima de uma porta de vidro para respirar. Ela se desequilibra e cai desacordada. Durante a queda, a babá chega a se chocar contra uma das filhas de Melina, que também cai no chão.
“Não tem corpo que aguente ficar sem alimentação, sem beber e ainda recebendo pancada. Eu lembro que minha cabeça começou a rodar e eu ficava sem conseguir respirar direito”, disse a babá.
Desespero
Raiana disse que a decisão de pular a janela foi um ato de desespero. Ao saber das imagens registradas pelas câmeras dentro do apartamento, ela disse que é importante para serem usadas no processo contra a ex-patroa. Raiana disse que não consegue assistir o vídeo das agressões.
É um momento difícil porque mesmo lá, dentro vivendo tudo isso em desespero, a gente só queria sair dali. E vendo as imagens, é mais difícil. É muito triste passar pelo que eu passei. Nem eu consigo ver toda hora.
Muito importante [as imagens serem usadas no processo], mas eu prefiro não estar vendo as imagens”, comentou.
É possível ver uma terceira mulher no apartamento durante as agressões. Ela presencia toda a ação, mas em nenhum momento tenta impedir que Melina prosseguisse desferindo os tapas e socos contra a babá.
A babá disse que a mulher chegou no imóvel na terça-feira, 24 de agosto, um dia antes dela ter pulado a janela do apartamento. Raiana, no entanto, afirma que ela não era outra empregada, e não sabe afirmar qual a relação entre as duas.
“Eu não sei quem é essa mulher. Ela entrou [na casa] na terça-feira. Mas o que ela é de Melina, eu não sei. Ela não é empregada doméstica e eu não sei dizer se era parente. Ela não impede as agressões, não pede ajuda, não faz nada.
O que diz a defesa
A defesa da empregada disse que os vídeos serão utilizados para endossar as acusações contra Melina e poderão provar os crimes que aconteceram no apartamento. Segundo o advogado Bruno Oliveira, vários crimes poderão ser investigados com base nas imagens registradas.
“Diante daquelas imagens, que são preliminares (ainda têm muitas imagens a serem analisadas, tendo em vista que ela começou a ser agredida na terça-feira pela manhã), crime de tortura, cárcere privado e o Ministério Público do Trabalho está apurando para um inquérito civil referente ao trabalho análogo ao escravo”, disse.
Histórico de agressões e ameaças
Além de Raiana, pelo menos outras 11 mulheres registraram ocorrência contra Melina Esteves França, de acordo com a Polícia Civil.
Sete ocorrências são apuradas na 12ª Delegacia Territorial, em Itapuã, e outras cinco na 9ª Delegacia, no bairro da Boca do Rio.
Segundo o advogado Bruno Oliveira, todas as denúncias são semelhantes. As mulheres alegam que ela praticava agressões físicas e ameaças, tomava aparelhos celulares, não obedecia horários acertados para o serviço e, em alguns casos, não pagou pelos dias trabalhados.
Na manhã de domingo (29), um grupo de pessoas se reuniu em frente ao prédio onde a babá pulou do terceiro andar. Eles fizeram uma manifestação de apoio à vítima e pediram justiça pelo caso.
Um novo protesto foi realizado contra Melina Esteves França na quarta-feira, 1º de setembro. Um grupo formado por trabalhadores domésticos e representantes de movimentos sociais se reuniu em frente ao condomínio onde ocorreu o caso contra Raiana, no Imbuí, pedindo punição à mulher e buscando chamar a atenção para as condições de trabalho dos empregados na Bahia.