O STF julga, desde o dia 26 de agosto, se a demarcação de terras indígenas deve seguir o critério que define que índios só podem reivindicar a demarcação das terras que já eram ocupadas por eles antes da data de promulgação da Constituição de 1988, o chamado “marco temporal”.
Relator do caso, Fachin defendeu que a posse indígena não se iguala à posse civil e não deve ser investigada sob essa perspectiva, e sim, com base na Constituição – que garante a eles o direito originário às terras.
“Autorizar, à revelia da Constituição, a perda da posse das terras tradicionais por comunidade indígena, significa o progressivo etnocídio de sua cultura, pela dispersão dos índios integrantes daquele grupo, além de lançar essas pessoas em situação de miserabilidade e aculturação, negando-lhes o direito à identidade e à diferença em relação ao modo de vida da sociedade envolvente”, afirmou o relator.
Segundo Fachin, “os direitos das comunidades indígenas consistem em direitos fundamentais, que garantem a manutenção das condições de existência e vida digna aos índios” e “a terra para os indígenas não tem valor comercial, como no sentido privado de posse”. “Trata-se de uma relação de identidade, espiritualidade e de existência”, disse.
O ministro ponderou também que aplicar o caso Raposa Serra do Sol, em que o Supremo reconheceu o marco temporal, a todas as demarcações é desconhecer a existência de diversas etnias indígenas.
“Muito embora decisão tenha a eficácia de coisa julgada em relação à demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, ela não incide automaticamente às demais demarcações de áreas de ocupação tradicional indígena no país”, argumentou.
Segundo o ministro, “não se desconsidera a complexidade da situação fundiária brasileira, menos ainda se desconhece a ampla gama de dificuldades dos produtores rurais de boa-fé”.
“No entanto, segurança jurídica não pode significar descumprir as normas constitucionais, em especial aquelas que asseguram direitos fundamentais”. “Não há segurança jurídica maior que cumprir a Constituição.”
Na semana passada, foram ouvidas mais de 30 entidades interessadas na causa, o advogado-geral da União e o procurador-geral da República.
A decisão dos ministros do STF é aguardada por milhares de indígenas de várias regiões do país que estão há dias em Brasília no acampamento “Luta pela Vida”, montado a cerca de dois quilômetros do Congresso Nacional. Atualmente, há mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas abertos no país.
Os indígenas são contra o reconhecimento da tese do “marco temporal”, enquanto proprietários rurais argumentam que o critério é importante para garantir segurança jurídica. O presidente Jair Bolsonaro é favorável à tese.
O caso está sendo julgado pelo STF, pois, em 2013, o TRF-4 aplicou o critério do “marco temporal’ ao conceder ao instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina uma área que é parte da Reserva Biológica do Sassafrás, Terra Indígena Ibirama LaKlãnõ.
Após a decisão, a Funai enviou ao Supremo um recurso questionando a decisão do TRF-4. O entendimento do STF poderá ser aplicado em outras decisões semelhantes no Brasil.