Convidada por Arthur do Val a depor, ex-namorada diz na Alesp que áudios foram desrespeitosos com ucranianas
Giulia Blagitz namorava o parlamentar havia três anos. Ela declarou ao Conselho de Ética da Casa nesta terça (5) que soube dos áudios pelo próprio deputado, que ligou para ela chorando, antes de sair da Europa, contando do vazamento para a imprensa das conversas no grupo de amigos.
05/04/2022 17:11
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Convidada a depor no Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) como testemunha de defesa do deputado estadual Arthur do Val (União Brasil), a ex-namorada do parlamentar disse que condena os áudios sexistas e machistas que vazaram em que ele diz que mulheres ucranianas “são fáceis porque são pobres”.
Reprodução
A enfermeira Giulia Blagitz, ex-namorada de Arthur do Val, em depoimento no Conselho de Ética da Alesp nesta terça-feira (5)
“Achei falta de respeito e condeno os áudios. Fiquei confusa na hora que eu ouvi os áudios, fiquei nervosa e terminei nas redes sociais. Eu acabei [o namoro] durante a viagem”, afirmou a enfermeira Giulia Blagitz.
Blagitz namorava o parlamentar havia três anos e declarou na Alesp que soube dos áudios pelo próprio Arthur do Val, que ligou para ela chorando, antes de sair da Europa, e contou do vazamento para a imprensa das conversas dele em um grupo de amigos.
“Ele, antes de entrar no avião [de volta ao Brasil após viagem à Ucrânia], me ligou chorando e disse que os áudios iriam pra imprensa. Explicou o que tinha nos áudios e me enviou os áudios”, afirmou.
A ex-namorada também disse que, após a chegada do deputado ao Brasil, o casal se encontrou, e o parlamentar voltou a confirmou o conteúdo dos áudios vazados.
“Nós nos encontramos, e eu toquei os áudios na frente dele, a gente conversou sobre os áudios”, afirmou.
Questionada pelo advogado de defesa do deputado sobre o relacionamento dos dois, Blagitz disse que nunca presenciou nenhuma atitude violenta ou machista do ex-namorado e que conhecida toda a família dele.
Dez testemunhas
Além da ex-namorada, uma amiga do parlamentar também foi ouvida pelo conselho. O advogado de defesa de Arthur do Val havia arrolado dez testemunhas para serem ouvidas no conselho na sessão desta terça (5), mas apenas duas compareceram. O colegiado decidiu então, por unanimidade, cancelar as demais oitivas.
Os membros do conselho entenderam que as demais testemunhas faltantes eram apenas uma “manobra protelatória da defesa” para estender o processo por quebra de decoro parlamentar no colegiado, adiando a conclusão do processo.
O colegiado também negou o pedido da defesa do deputado para que os áudios fossem periciados. Os parlamentares entenderam que as entrevistas de Arthur do Val na imprensa reconhecendo a autoria do conteúdo e o depoimento da ex-namorada já confirmam a veracidade das falas.
O relator do processo no conselho, deputado Delegado Olim (PP), afirmou que irá entregar um parecer dele sobre o caso já na próxima quinta-feira (7).
Dessa forma, o Conselho de Ética da Alesp deve se reunir novamente na próxima terça-feira (12) para justamente julgar o documento do relator.
Processo de cassação
O Conselho de Ética da Alesp aprovou, por unanimidade, em 18 de março, a abertura do processo contra o deputado Arthur do Val, que pode gerar a cassação do mandato do parlamentar.
Ele é alvo no colegiado de 21 representações pedindo a cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar após dizer frases sexistas contra mulheres refugiadas ucranianas.
O parlamentar entregou a defesa prévia ao conselho dizendo que não pode ser punido por áudios “vazados ilicitamente” de conversas privadas dele no aplicativo WhatsApp.
Nos áudios, o deputado diz, entre outras coisas, que as “ucranianas são fáceis porque são pobres”.
Ao pedir a inadmissibilidade das representações, o advogado do deputado também alegou que há “extraterritorialidade do ato supostamente ilícito praticado”, já que os áudios foram feitos na Ucrânia, o que “afasta a competência jurídica do Colegiado para processar e julgar o acusado com base nas leis brasileiras”.
“É juridicamente impossível o pedido de perda de mandato de parlamentar licenciado, uma vez que as normas regimentais preveem que a quebra de decoro parlamentar somente se dá ‘no desempenho do mandato’”, declarou a defesa.
Na época da viagem à Ucrânia, Do Val tinha pedido dois dias de licença não remunerada para a Mesa Diretora da Alesp.
Tramitação do processo
Os 11 deputados que integram o Conselho de Ética da Alesp decidiram transformar as 21 representações recebidas em um único processo.
Após a entrega da defesa prévia, o Conselho voltou a se reunir na tarde desta terça-feira (5) para deliberar e abriu o processo de cassação e ouvir dez testemunhas dele no caso.
A presidente do Conselho de Ética, deputada Maria Lúcia Amary (PSDB), já formalizou que o deputado Delegado Olim (PP) é o relator do caso no colegiado.
Em entrevista ao blog da jornalista Andréia Sadi, no g1, em 10 de março, o deputado Delegado Olim já tinha declarado que ‘ninguém vai passar a mão na cabeça’ de Arthur do Val no Conselho de Ética da casa.
Tramitação na Alesp
É papel do relator decidir qual a pena mais adequada no caso ao parlamentar. A pena pode ir de simples advertência até a cassação definitiva do mandato.
Durante a segunda fase do processo, o parlamentar terá outro prazo de cinco sessões ordinárias da Alesp para apresentar a defesa definitiva das acusações.
Após a apresentação do parecer no conselho, os 11 membros do colegiado votarão se aceitam ou não a punição estabelecida pelo relator.
Logo depois da aprovação pelos membros do Conselho de Ética, o processo vai para votação no plenário da Casa em forma de projeto de lei.
Para que uma punição seja aplicada em Arthur do Val, pelo menos 48 deputados (maioria simples) precisam votar favorável ao projeto.
Desfiliação
Nesta terça (8), o diretório nacional do Podemos acatou no pedido de desfiliação do deputado Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei, após abertura de processo disciplinar contra ele no Conselho de Ética da legenda. Ele estava filiado ao partido há cerca de 30 dias, segundo a legenda.
“No dia da mulher (08 de março), Podemos recebe e acata desfiliação do deputado estadual Arthur do Val (SP), diante da abertura do processo disciplinar que poderia resultar em expulsão do parlamentar. Ele estava filiado ao partido há cerca de 30 dias”, declarou a direção nacional do partido.
No início da tarde, Arthur do Val também havia anunciado a saída dele do Movimento Brasil Livre (MBL), devido à grande repercussão negativa dos áudios vazados.
O deputado estadual disse também, em vídeo divulgado em suas redes sociais, acreditar que perderá seu mandato no que considera “tempo recorde”.
“Vou ser cassado em três dias. Vai ser o recorde de tempo (…) Vou ser cassado em três dias porque meu áudio vazou”, afirma.
O tempo, porém, não condiz com a realidade. Pelo regimento da Casa, processos de pedidos de cassação tramitam por 30 dias no Conselho de Ética, com prazos para duas defesas e, uma vez aprovada a penalidade máxima, decisão ainda precisa passar por votação no plenário.
Na gravação, ele também considera que tal punição não seja justa. “É proporcional a punição que eu estou tendo? É justo, eu mereço ser cassado? Eu acho que não.”
Pré-candidatura
Arthur do Val confirmou a autoria de áudios. Após o vazamento das mensagens, o deputado pediu desculpas, disse que o que falou foi um erro e abandonou a pré-candidatura ao governo do estado de São Paulo.
As falas foram alvo de críticas de políticos e personalidades.
O que dizem os áudios?
Nos áudios, que circulam nas redes sociais desde a noite desta sexta (4) e teriam sido enviados para um grupo de amigos do parlamentar, há declarações machistas e misóginas.
“São fáceis, porque elas são pobres. E aqui minha carta do Instagram, cheia de inscritos, funciona demais. Não peguei ninguém, mas eu colei em duas ‘minas’, em dois grupos de ‘mina’. É inacreditável a facilidade. Essas ‘minas’ em São Paulo você dá bom dia e ela ia cuspir na sua cara e aqui são super simpáticas”, diz o áudio
As declarações teriam sido feitas durante viagem à Ucrânia. Ele disse ter viajado para enviar doações para refugiados ucranianos após a invasão da Rússia ao país.
Nos áudios, o deputado estadual também teria comparado a fila de refugiadas à fila de uma balada.
“Acabei de cruzar a fronteira a pé aqui, da Ucrânia com a Eslováquia. Eu juro, nunca na minha vida vi nada parecido em termos de ‘mina’ bonita. A fila das refugiadas, irmão. Imagina uma fila de sei lá, de 200 metros ou mais, só deusa. Sem noção, inacreditável, é um bagulho fora de série. Se pegar a fila da melhor balada do Brasil, na melhor época do ano, não chega aos pés da fila de refugiados aqui.”
Em outro trecho, o áudio diz: “Passei agora quatro barreiras alfandegárias, duas casinhas pra cada país. Eu contei, são doze policiais deusas. Que você casa e faz tudo que ela quiser. Eu estou mal cara, não tenho nem palavras para expressar. Quatro dessas eram ‘minas’ que você se ela cagar você limpa o c* dela com a língua. Assim que essa guerra passar eu vou voltar para cá”.
O que o deputado disse sobre os áudios?
Ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, na manhã deste sábado (5), o deputado estadual confirmou que são seus os áudios.
Inicialmente, ele disse que “houve um mal entendido” e que as “pessoas estão misturando os áudios com outro contexto”.
“Foi errado o que eu falei, não é isso que eu penso. O que eu falei foi um erro, em um momento de empolgação”, disse ele.
Depois, o deputado gravou um vídeo no qual declarou que suas frases foram “machistas” e “escrotas” e afirmou que se comportou “como um moleque” ao responder a perguntas de amigos em um grupo de conversas entre parceiros do futebol.
“Eu só quero que as pessoas me julguem pelo que eu fiz, não pelo que eu não fiz”, disse o deputado.
Segundo Arthur do Val, os áudios não foram enviados a grupos “de política” e ele já estava na Eslováquia, quando teve acesso a internet, ao enviá-los.