Política

Imposições de sigilo viram prática comum durante governo Bolsonaro

Especialistas apontam que as imposições de sigilo impostas pelo governo Bolsonaro geram retrocesso na Lei de Acesso à Informação (LAI)

Imposições de sigilo sobre informações que deveriam ser públicas viraram hábito no governo do presidente Jair Bolsonaro (PL). Especialistas alertam que esse tipo de decisão tem impacto negativo na transparência da gestão pública.

O caso mais recente foi a decretação de sigilo, e depois um recuo e liberação das informações, em relação às visitas de pastores ao Palácio do Planalto. Gilmar Santos e Arilton Moura estariam envolvidos na intermediação de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para prefeituras de todo o país.

Dados do Painel de Acesso à Informação, mantido pela Controladoria Geral da União (CGU), mostram que a alegação de sigilo para negar às solicitações de informações pelo portal Fala.BR, aumentou 663,08% durante o governo de Bolsonaro em relação à gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Foram decretadas sigilosas, por exemplo, informações sobre a vacinação do presidente contra a Covid e visitas dos filhos de Bolsonaro ao Planalto (veja outros casos abaixo).

Diretor da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco diz que a postura do atual presidente representa um golpe no processo de transparência pública. “Estamos assistindo um retrocesso brutal. Existe uma máxima da Lei de Acesso à Informação que diz que a regra é a transparência, o sigilo deve ser a exceção e isso está sendo invertido. Qualquer situação delicada para o presidente da República é considera sigilosa”, afirma.

Criada em 2011, a Lei de Acesso à Informação (LAI) prevê que é dever do Estado garantir o direito à informação ao cidadão. Na gestão de Bolsonaro, o processo para obter informações por meio da LAI se tornou mais complicado.

“Quando esse tipo de atitudes são tomadas pelo presidente da República, isso abre precedentes. Ações como essa passam a permear o poder público, com, por exemplo, prefeitos e governadores impondo sigilo sobre assuntos que são de interesse da população”, argumenta Castello Branco.

Para o diretor executivo da Transparência Brasil, Manoel Galdino, as constantes negativas de solicitações de acesso à informação pela LAI demonstram falta de compromisso do GSI com a transparência na gestão pública.

“Isso mostra um completo descaso com a transparência pública, que é uma obrigação legal e um dever constitucional. O GSI toma essas decisões já sabendo que vão ser revertidas depois. Ao fazer isso, o órgão mostra que não tem preocupação em seguir a Lei de Acesso à Informação, que obriga a administração pública a dar publicidade aos seus atos”, afirma Galdino.

O advogado Rafael Arruda, doutorando em Direito Público na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), diz não ver base jurídica para os decretos de sigilo feitos pelo atual governo.

“Não há nada que autorize o sigilo quanto a eventuais visitas de pessoas comuns recebidas pelo presidente da República e outros que já observamos nesse governo. Nesse ponto, é importante que se diga que a regra é a transparência, o sigilo é a exceção.”

Imposições de sigilo

O sigilo de 100 anos de temas ligados a Bolsonaro foi imposto em diversas situações. Em janeiro de 2021, o Palácio do Planalto decretou sigilo de até 100 anos sobre o cartão de vacinação do presidente. Segundo a Presidência da República, os dados “dizem respeito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem” do presidente.

O governo também impôs sigilo de 100 anos sobre os dados dos crachás de acesso ao Planalto dos filhos do presidente, Carlos Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro em julho de 2021. A Secretaria-Geral da Presidência alegou que as informações dizem respeito “à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem dos familiares do senhor Presidente da República, que são protegidas com restrição de acesso, nos termos do artigo 31 da Lei nº 12.527, de 2011”.

Em junho do ano passado, o Exército negou acesso ao processo administrativo contra o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazzuello. Em 23 de maio do ano passado, o general na ativa na época participou de ato a favor do presidente Jair Bolsonaro, o que não é permitido para militares que não tenham ido para reserva.

Também foi imposto sigilo sobre documentos que levaram à admissão da filha mais nova de Jair Bolsonaro, Laura Bolsonaro, no Colégio Militar de Brasília, sem ter de passar por um processo seletivo. O Exército justificou que a exposição dessas informações colocariam em risco a vida de Laura e do presidente.

Encontros de Jair Bolsonaro com o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, condenado no mensalão do PT, também foram mantidos sob sigilo. Novamente o governo alegou risco à segurança do presidente da República como justificativa para omitir as informações das visitas feitas pelo presidente do partido de Bolsonaro ao Palácio do Planalto.