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Justiça conclui que namorada atirou em delegado e se matou após discussão em prédio

Priscila Barrios e Paulo Bilynskyj: Namorada atirou em delegado e depois se matou, concluiu a Justiça de São Paulo. Policial teve de amputar um dos dedos por causa dos tiros que tomou — Foto: Reprodução/Arquivo pessoal/Redes sociais

A Justiça de São Paulo concluiu que um delegado e influenciador digital foi baleado pela namorada modelo e que ela se matou um dia após uma discussão entre o casal dentro do prédio dele, no ABC Paulista. O caso ocorreu em 20 de maio de 2020 em São Bernardo do Campo e teve repercussão na imprensa à época.

De acordo com a Polícia Civil, Priscila Delgado Barrios tentou matar Paulo Francisco Muniz Bilynskyj por ciúmes e depois tirou a própria vida. Ela tinha 27 anos. Esta também foi a versão do delegado, que tomou seis tiros e sobreviveu, após passar por cirurgias. Neste ano, teve de amputar o dedo médio da mão direita, que foi atingido pelos disparos, perdeu os movimentos e teve complicações.

A perícia Polícia Técnico-Científica analisou a residência e também comprovou por laudos o relato do policial.

Como a autora dos disparos se matou, o Ministério Público (MP) pediu o arquivamento do caso, que foi investigado e concluído como tentativa de assassinato e suicídio pelo 1º Distrito Policial (DP) da cidade. A Justiça arquivou o inquérito em 15 de junho de 2021. O g1 teve a confirmação disso na última sexta-feira (8). O caso estava sob sigilo judicial, que foi parcialmente suspenso há alguns meses.

Por meio de nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que a Corregedoria da Polícia Civil ainda apura, no entanto, a conduta de Paulo no caso, mas na esfera administrativa.

Procurado pelo g1 para comentar o assunto, o delegado, atualmente com 35 anos, escreveu uma nota na qual lembra que a decisão da Justiça confirmou o que ele sempre havia dito: de que foi “vítima de uma tentativa de homicídio”. No texto, Paulo também critica, de maneira geral, a cobertura da imprensa no caso. Afirma que, segundo ele, o acusou de ser “feminicida”.

Questionada pela reportagem, a advogada do delegado, Priscila Silveira, confirmou a decisão da Justiça pelo arquivamento. Segundo ela, que preferiu não dar mais declarações sobre o caso, seu cliente chegou a divulgar essa informação em suas redes sociais, no ano passado.

Para o advogado José Roberto Rodrigues da Rosa, que defende os interesses da família de Priscila, os pais dela ainda querem saber mais detalhes do que levou a filha deles a atirar em Paulo e depois se suicidar. Ele quer saber, por exemplo, se o namorado da modelo a instigou ou não a cometer o suicídio.

O que diz o delegado
Por meio de nota, divulgada por ele mesmo ao g1, Paulo voltou a dizer que foi vítima no caso e criticou a mídia. O delegado é conhecido na internet por postar diversos vídeos, fotos e mensagens sobre seu trabalho, além de dar aulas como instrutor de tiro. Ele tem mais de 680 mil seguidores no Instagram.

Veja a seguir a declaração dele:

“No dia 20 de maio de 2020 fui vítima de uma tentativa de homicídio, fui baleado 6 vezes, no peito, mão, braços e pernas. Permaneci entre a vida e a morte por 11 dias na UTI, passei por 3 cirurgias, tive o peito e o abdômen aberto.
Passei por um período de recuperação que ainda não se encerrou, recentemente sofri a amputação de um dedo, que tentei sem sucesso reparar com mais de 8 cirurgias.

O que mais me choca foi a forma criminosa como fui taxado pela mídia que, sem nenhuma prova, me acusou de feminicida.

O crime praticado contra mim foi apurado por um extenso Inquérito Policial, foram realizadas perícias que em 5 anos como Delegado atuante no Departamento de Homicídios nunca vi serem realizadas.
Em junho de 2021 o Inquérito concluiu o óbvio, que eu tinha sido vítima de uma tentativa de homicídio e que a autora suicidou-se.

O Ministério Público opinou pelo arquivamento do caso, tendo em vista a morte da autora.

O Juiz do caso determinou o arquivamento.
Por fim, deixo claro que sofri duas tentativas de homicídio, uma por uma mulher, outra por todos os repórteres que divulgaram informações falsas e absurdas sobre o caso.

Sinto-me extremamente decepcionado com a mídia e sua falta de honestidade intelectual. O mínimo que deveriam ter feito era um pedido formal de desculpas pelas falsas notícias divulgadas.

Dois anos do fato, um ano da decisão judicial e ainda assim nenhuma palavra.”

Investigação
Segundo a Polícia Civil, o motivo da discussão entre o casal foi ciúmes por parte de Priscila em relação a Paulo. Ela teria visto mensagens de uma outra mulher no computador dele. A modelo e o delegado tinham se conhecido havia quase três meses pela internet. Ela deixou Curitiba, no Paraná, onde morava, para viver junto com ele em São Bernardo. Em duas semanas de convivência, eram noivos.

Testemunhas foram ouvidas pela investigação, que analisou vídeos gravados por câmeras do circuito interno de segurança do prédio para tentar saber como Priscila morreu e como Paulo foi ferido a tiros.

A versão da tentativa de homicídio e suicídio foi apresentada inicialmente à delegacia que investiga o caso por um vizinho do delegado e três policiais militares que atenderam a ocorrência. Todos falaram com Paulo.

“A hora que eu abri a porta do banheiro, ela não falou nada. Ela estava parada na minha frente, apontou a arma para mim e já estava atirando”, contou o delegado em entrevista ao Fantástico em junho do ano passado. “Ela achou que tinha me matado. Eu achei que ia morrer. Eu tomei seis tiros.”

“Eu vi que ela atirou nela”, falou Paulo à reportagem da TV Globo, sobre o momento em que, segundo ele, Priscila se suicidou. “Eu não consegui acreditar.”

De acordo com os agentes da PM, para entrar no apartamento, eles arrombaram uma porta da área de serviço que estava trancada. E ali encontraram a modelo “inconsciente”, de cócoras, mas com “sinais vitais”.

Ao socorrerem Priscila, viram que ela estava sangrando e tinha uma perfuração no peito. Perto dela estava uma faca, mas sem sangue. A mulher também foi levada ao hospital, mas não resistiu ao ferimento e morreu.

Segundo os PMs, havia sangue no banheiro, no piso e em algumas paredes dentro do apartamento. E marcas de mãos ensanguentadas no espelho de uma academia dentro de um dos quartos.

Ainda segundo o registro policial do caso, foram encontradas cinco armas (duas pistolas, um fuzil, uma metralhadora e uma espingarda) e munições do delegado espalhadas em cômodos da residência (corredor, sofá da sala e cama do quarto). Também havia marca de tiro na parede e projétil no piso.

As armas e as munições foram apreendidas juntamente com celulares, computadores e o vídeo da gravação das câmeras do prédio.

Ainda de acordo com a ocorrência, a perícia encontrou pólvora nas mãos da modelo. Como o delegado foi direto para o hospital, ele não passou pelo exame residuográfico.

Também foi coletado material genético (DNA) no gatilho da pistola Glock 9 mm, da qual teriam partido os disparos. Para a polícia, Priscila usou a arma e sabia atirar. Fotos dela em rede social posando com armas foram analisadas pelos policiais.

Advogado da família da modelo
O advogado que defende os interesses dos pais de Priscila entrou na Justiça com um pedido para que o celular da modelo seja desbloqueado por uma empresa particular e que o aparelho depois seja entregue para perícia. Até a última atualização desta reportagem, não havia decisão a esse respeito.

“Como é que eu vou saber se esse fato aconteceu ou não? Através da perícia no telefone celular da Priscila. Com quem ela conversou naquela noite, naquela manhã, momentos antes do crime… O que que aconteceu, o que foi dito, o que ela achou. O que que o Paulo falou, o que mandaram pra ela, o que ela mandou pra alguém”, falou José Roberto.

De acordo com ele, é preciso saber mais detalhes do que ocorreu no dia para saber se Paulo a induziu a cometer o suicídio.

“Entendemos que alguma coisa mais aconteceu. O artigo 122 do Código Penal, ele diz induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio… a pena é de 6 meses a dois anos de reclusão”, falou o advogado.

O que diz a SSP
Por meio de nota, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo confirmou que o inquérito policial do caso foi concluído. Como o caso envolve um agente público de segurança da Polícia Civil, a Corregedoria da instituição apura administrativamente a conduta de Paulo para saber se ele cometeu alguma irregularidade funcional.

“O inquérito policial instaurado pelo 1º DP de São Bernardo do Campo para apurar tentativa de homicídio seguida de suicídio foi relatado à Justiça em 25 de maio de 2021. Não houve indiciamentos no procedimento. A Polícia Civil esclarece que não solicita arquivamento de inquéritos junto à Justiça. Detalhes a respeito devem ser solicitados aos órgãos judiciais competentes. O policial citado segue respondendo a processo administrativo instaurado pela Corregedoria da Polícia Civil, o qual tramita sob sigilo”, informa nota divulgada pela pasta da Segurança.

Paulo chegou a ficar afastado do trabalho em razão de uma licença médica. O motivo estaria relacionado a eventuais sequelas em razão dos tiros que sofreu. Atualmente ele estaria em férias da polícia.