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Professora vítima de racismo registra ocorrência na polícia contra funcionária e alunos por difamação e ameaça

Em outubro, Ana Koteban foi chamada de 'macaca' em lista de presença da Escola Municipal Linneu Prestes na Zona Sul, onde dá aulas de sociologia. Nesta semana ela fez novas denúncias: alega ter sido difamada e ameaçada de morte, respectivamente, por funcionária e alunos.

A professora que foi vítima de racismo, nos últimos dois meses, numa escola municipal de São Paulo, fez na última semana novas queixas na Polícia Civil, desta vez para denunciar ter sido difamada e ameaçada de morte, respectivamente por uma funcionária e por dois alunos.

Em 26 de outubro, a professora de sociologia Ana Paula Pereira Gomes, a Ana Koteban, de 41 anos, sofreu injúria racial depois de ter sido chamada de “macaca” numa lista de presença de alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental e Médio Professor Linneu Prestes, em Santo Amaro, Zona Sul da capital paulista. No documento em que deveria estar o nome dela, estava escrita à caneta a ofensa racista.

Depois, em 1º de novembro, estudantes encontraram desenhos com símbolos nazistas na carteira de uma das salas da escola em que Ana Koteban dá aulas. Lá estavam uma suástica e SS num dos assentos. As letra são a abreviação de Schutzstaffel, o “esquadrão de proteção” (numa tradução para o português) de Adolf Hitler e do Partido Nazista na Alemanha dos anos de 1930.

Os dois casos acima são investigados pela Polícia Civil e pela Secretaria Estadual da Justiça e Cidadania de São Paulo . Os órgãos apuram e tentam identificar e responsabilizar quem ofendeu a professora e fez os desenhos nazistas. Tanto a lista de presença quanto a carteira estudantil estavam dentro de classes.

Na escola estudam adolescentes de 15, 16 e 17 anos. Até a última atualização desta reportagem, os responsáveis pelos ataques racista e neonazista não tinham sido identificados. Em entrevista ao g1, no mês passado, Ana Koteban disse que não sabia quem poderia ter feito as ofensas. Pais e alunos ouvidos pelo g1 suspeitam que alguns estudantes possam estar envolvidos.

Injúria racial é quando uma pessoa ofende outra com falas ou palavras preconceituosas em razão da cor da pele de alguém, por exemplo. A pena na Justiça para quem for condenado por esse crime é de 1 ano a 3 anos de prisão. O crime de racismo se dá quando ocorre contra duas ou mais pessoas.

Apologia ao nazismo também é crime. Quem for punido judicialmente pode receber penas equiparadas ao racismo, que pode ser de 2 anos a 5 anos de reclusão ou pagamento de multa.

Novas denúncias: difamação e ameaça

As novas denúncias feitas por Ana são de difamação e ameaça. Segundo os boletins de ocorrência do caso, registrados na quinta-feira (8) pela professora, em 10 de novembro, uma funcionária da escola a difamou, dizendo que a professora a assediou moralmente no local de trabalho. A educadora nega a acusação.

Em outro registro policial feito também na quinta, Ana acusa dois alunos de ameaça por terem dito a ela que “já deveria ter morrido e merecia ser fuzilada”. A frase foi dita em 5 de dezembro, dentro da escola, segundo a educadora.

De acordo com o boletim de ocorrência, os alunos que a ameaçaram haviam discutido com a professora em 1º de novembro, quando ela debatia com os estudantes a necessidade de falar sobre o combate ao racismo na escola.

Segundo Ana Koteban, os alunos ainda a acusaram de tê-los xingado com palavrões, o que ela também nega.

Todos os três boletins de ocorrência foram feitos inicialmente na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi).

O que disse a professora

O g1 não conseguiu localizar a professora para comentar as novas denúncias sobre difamação e ameaça.

Na última vez que conversou com a reportagem, Ana Koteban havia dito que “o ambiente escolar é insalubre para pessoas negras. Prejudica a nossa saúde mental e gera problemas não só de desempenho escolar e ascensão na carreira, mas gera problema de saúde física. Por isso dizemos: o racismo mata”.

A Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio acompanha o caso de Ana. “A violência estrutural do racismo atinge todos os setores da sociedade. Precisamos de uma ação conjunta e efetiva de toda comunidade escolar para que isso não se repita”, disse Marcio Berhing Silva, articulador da rede na Zona Sul.

Na esfera administrativa, a Secretaria da Justiça do governo estadual, por meio da Coordenação de Políticas para População Negra e Indígena, abriu um procedimento para apurar as ofensas racistas e nazistas envolvendo a educadora.

De acordo com a pasta, assim que a Polícia Civil identificar e responsabilizar criminalmente quem atacou a professora, o autor ou os possíveis autores poderão ser punidos com pagamento de multa que pode chegar a R$ 95 mil. O dinheiro iria para os cofres do Estado.

Por meio de nota, a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo informou à época que “repudia qualquer ato de discriminação e racismo”. E que apurava internamente as denúncias de racismo e nazismo para identificar e punir os responsáveis.

Procurada para comentar as novas denúncias, de difamação e ameaça, a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal da Educação, informou que a apuração interna sobre o caso está em andamento.

“A administração municipal repudia qualquer ato de violência, discriminação e racismo dentro ou fora do ambiente escolar. A Diretoria Regional de Educação (DRE) está à disposição para colaborar com qualquer investigação oficial em curso”.

Ainda conforme a pasta, o Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem (NAAPA), que conta com psicopedagogos e psicólogos, acompanha o caso e prestará todo o apoio necessário durante o processo.

“A EMEFM Professor Linneu Prestes promove ações constantes com a temática antirracista, como rodas de conversa, apresentação de vídeos para discussão e elaboração de textos. Em novembro, ocorreu inclusive, uma palestra com os estudantes acerca da temática, como parte do calendário de atividades da escola”, afirmou a secretaria, em nota.