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PF prende 9 suspeitos em operação contra facção que planejava matar Moro e outras autoridades

O promotor de São Paulo Lincoln Gakiya também estava entre os alvos. O Jornal Nacional teve acesso a documentos de contabilidade da quadrilha que indicam onde as vítimas seriam mantidas em cativeiro.

Uma operação da Polícia Federal desmontou nesta quarta-feira (22) um plano criminoso articulado ao longo de meses por uma quadrilha: autoridades e servidores públicos eram os alvos de sequestros e de assassinatos. Entre essas pessoas estavam o senador Sergio Moro, do União Brasil, a família dele e um promotor de São Paulo.

Agentes da Polícia Federal precisaram derrubar uma parede para chegar ao esconderijo usado pela quadrilha. O endereço em São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, foi um dos 24 vistoriados nesta quarta pela Operação Sequaz.

Os investigadores cumpriram mandados de busca e apreensão também em Mato Grosso do Sul, São Paulo e Rondônia. A Polícia Federal tinha ordem da Justiça para prender 11 suspeitos de participar de um plano para sequestrar e matar autoridades de Estado.

“Essa é uma investigação que já transcorre há vários meses e que trouxe essa preocupação em razão do nível de risco de ameaça de várias autoridades públicas. Mas o que nós temos a convicção é de que o momento da deflagração mais oportuno foi esse e, portanto, a polícia agiu cumprindo a sua missão constitucional, cumprindo um papel de polícia de Estado, fazendo a operação que tinha que fazer nessa data”, diz o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues.
O promotor Lincoln Gakiya, que há quase 20 anos investiga a facção criminosa paulista, era um dos alvos dos bandidos. Ele também descobriu que a quadrilha pretendia atacar o senador Sergio Moro, a mulher dele, a deputada Rosângela Moro, ambos do União Brasil, e os filhos do casal. Na lista de alvos da quadrilha estavam outras autoridades e funcionários da segurança pública no país.

Os promotores identificaram que a quadrilha começou a monitorar o senador Sergio Moro e a família dele no dia 27 de janeiro. Três dias depois, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Sarrubbo, e o promotor Lincoln Gakiya foram a Brasília e se reuniram com Moro, com a deputada Rosângela Moro e com as polícias da Câmara e do Senado.

A cúpula da Polícia Federal foi informada de tudo e determinou a abertura de uma investigação sigilosa.

“Nós compartilhamos com a Polícia Federal todas as informações de inteligência que tínhamos aqui e auxiliamos a Polícia Federal nesse período de investigações. Nós agimos de maneira coordenada e integrada com a Polícia Federal e o resultado está aí”, explica Lincoln Gakiya.
Por precaução, Sergio Moro, a mulher e os filhos receberam reforço na segurança pessoal.

Nos últimos dois meses, equipes da Polícia Federal no Paraná e promotores de Justiça de São Paulo trabalharam juntos para aprofundar as investigações. Eles descobriram que integrantes da facção acompanhavam de perto toda a rotina da família Moro.

“Eu posso dizer que o plano havia vários meses que já estava em andamento. Já tinha imóveis, chácaras alugadas para um possível cativeiro. Casas, apartamentos alugados, veículos blindados já haviam sido levados para Curitiba, por exemplo. Armamento, muito dinheiro foi empregado nessa operação. Então era algo, no caso do senador Moro, do ex-ministro Moro, que já estava bastante adiantado. Não era algo que estava ainda em fase de planejamento. Já estava em fase de execução”, ressalta Gakiya.
A investigação mostra que a quadrilha tinha o objetivo de se vingar de Moro e Gakiya. O promotor foi o responsável pelo pedido de transferência dos chefes da quadrilha de penitenciárias do interior de São Paulo para presídios federais de segurança máxima. A remoção foi em fevereiro de 2019.

Na mesma época, Moro era ministro da Justiça do governo Bolsonaro e publicou uma portaria que, entre outras medidas, proibia os detentos de receberem visitas íntimas nas prisões federais.

Os nove presos nesta quarta-feira vão ficar na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo até que a Justiça decida o destino deles. As investigações para identificar outros envolvidos no plano para atacar autoridades continuam.

“Esses planos não param. Então, todos os dias, a gente está combatendo e a gente tem que lidar com esse tipo de retaliação”, afirma Gakiya.

Cativeiro estava definido

O Jornal Nacional teve acesso a documentos de contabilidade da quadrilha que indicam onde as vítimas seriam mantidas em cativeiro.

Em uma mensagem, os bandidos fazem uma espécie de contabilidade do que estava sendo gasto para executar o plano, como R$ 12 mil em viagens e R$ 50 mil com aluguéis e manutenção. Os valores somam mais de meio milhão de reais.

Fotos mostram a entrada de uma chácara alugada pelos bandidos, que, segundo a investigação, serviria de esconderijo e de um eventual cativeiro.

Os investigadores também conseguiram imagens do arsenal que seria usado no plano de ataque às autoridades. São fuzis e pistolas. Em uma anotação, aparece uma lista com a quantidade de munição guardada pelos bandidos. A coluna da esquerda mostra o calibre das armas e, a da direita, o número de projéteis: 903 no total.

Dino: operação não tem relação com a política nacional

Logo cedo, em uma rede social, o ministro da Justiça, Flávio Dino, cumprimentou as equipes da Polícia Federal pela operação.

Depois, em entrevista, ele ressaltou que a PF cumpriu seu dever legal e que a operação não tem nenhuma relação com a política nacional. O senador Sergio Moro, do União Brasil, é opositor político do presidente Lula. O ministro da Justiça reagiu a insinuações da oposição de que a atuação da facção criminosa tivesse algum componente político.

“É vil, leviana, descabida qualquer vinculação a esses eventos com a política brasileira. Eu fico realmente espantado com o nível de mau-caratismo de quem tenta politizar uma investigação séria. Investigação essa que é tão séria que foi feita em defesa da vida e da integridade de um senador de oposição ao nosso governo”, afirmou Dino.
A TV Globo apurou que a ação da PF já estava programada desde o último dia 16 para ser executada nesta quarta-feira (22).

Em Florianópolis, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, repercutiu a operação e afirmou que a polícia vai sempre cumprir seu papel constitucional.

“A Polícia Federal não pode descuidar da sua condição de polícia de Estado. Não investigamos pessoas, mas fatos criminosos. O inquérito policial é instrumento da apuração da verdade real. Não trabalha para acusação ou para defesa, mas sim para a sociedade e para a Justiça. Aliás, hoje realizamos uma operação importante em razão de ameaças graves – gravíssimas, eu diria – de várias autoridades públicas, seguindo exatamente isso: sem olhar para qual partido, para qual ideologia, para qual governo, para qual situação. Essas pessoas estão simplesmente cumprindo o nosso dever constitucional e legal”, disse.

Moro defende combate constante

Em Brasília, em entrevista ao programa Estúdio i, da GloboNews, o senador Moro defendeu que o combate a criminosos deve ser constante, independentemente de ideologias e governos. Ele fez uma relação entre a operação desta quarta e os ataques que aterrorizam o Rio Grande do Norte há nove dias.

“Claro que isso foi assustador para mim, para minha família. É um preço infelizmente alto a se pagar pelo combate que a gente fez ao crime organizado. Não só como juiz, mas também como ministro da Justiça. Espero que esse evento no Rio Grande do Norte e esse evento de hoje que foi desmantelado, sejam eventos isolados e não revelem, não sejam reveladores de uma tendência do crime organizado querer novamente colocar-se para fora para intimidar a sociedade. Em um e outro caso, o combate às organizações criminosas tem que ser perene. E nós não podemos deixar que a politização ou a polarização comprometa essa batalha. O Brasil não pode ser vencido pelo crime. Essa que tem que ser a grande lição”, afirmou Moro.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, do PSD, disse que, desde o início do ano, quando soube do risco à integridade de Moro, já vinha tratando do reforço na segurança na equipe dele e da esposa, a deputada federal Rosângela Moro, também do União Brasil. Pacheco elogiou a atuação das forças de segurança na operação desta quarta.

“Eu quero cumprimentar as forças de segurança do Brasil, todas que estiveram envolvidas nessa operação; o próprio ministro da Justiça, Flávio Dino. A minha solidariedade ao ex-juiz e senador Sergio Moro pelo que ele tem passado e todo o nosso empenho da presidência do Senado para garantir a segurança de todos os senadores, inclusive do senador Sergio Moro”, disse Pacheco.
À tarde, Sergio Moro subiu à tribuna do Senado para falar sobre a operação e apresentou um projeto de lei que busca criminalizar a conspiração e ordens de ataques a agentes públicos com o objetivo de atrapalhar investigações contra facções criminosas.