Brasil

Professora registra boletim de ocorrência depois de tirar a roupa em protesto contra racismo em supermercado de Curitiba

Isabel Oliveira foi até a delegacia acompanhada de representantes de movimentos negros. Ela será ouvida na tarde desta segunda-feira (10) por uma delegada. Empresa diz ter 'tolerância zero contra qualquer comportamento discriminatório'.

A professora Isabel Oliveira, de 43 anos, registrou um Boletim de Ocorrência (B.O.) às 15h desta segunda-feira (10) após ter dito ser perseguida por um segurança enquanto fazia compras no supermercado Atacadão no bairro Portão, em Curitiba, na sexta (7).

Reprodução

Professora Isabel Oliveira, de 43 anos, registrou um Boletim de Ocorrência (B.O.)

O B.O. foi feito na Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Curitiba. Isabel foi à delegacia acompanhada de uma advogada e representantes de movimentos negros.

A empresa afirmou que tem “tolerância zero com qualquer comportamento discriminatório”, mas que não “identificou indícios de abordagem indevida” e se colocou à disposição de Isabel.

Horas depois do acontecido, a professora voltou ao mercado e protestou contra o racismo ficando seminua e com a frase “sou uma ameaça” escrita no corpo.

“Entendo que a repercussão é fruto da ruptura com o silenciamento em que nós mantemos diante das violências que sofremos diariamente. Muitas pessoas pretas tem me agradecido por (de alguma forma) o meu ato ter feito ecoar o grito de cada uma delas”, disse.

Como foi

Isabel relatou que foi até o estabelecimento para fazer compras para a Páscoa programada com a família. Em certo momento, contou ao g1, a professora começou a reparar que um segurança a seguia em todos os lugares que ela ia.

“Eu olhava pra ele, ele desviava o olhar. Num momento eu olhei pra ele e fiquei esperando pra ver o que ele ia fazer. Ele ficou desconfortável. Caminhei mais um pouco e ele continuou olhando”, disse.

 

Em seguida, ela disse que foi conversar com o homem e perguntou se ela apresentava ameaça para a loja. Ele negou.

Presidente se manifesta

O caso foi comentado nesta segunda-feira (10) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A declaração aconteceu durante a abertura da reunião para debater os 100 primeiros dias do governo.

Lula acusou a empresa de cometer crime e disse que “neste país a gente não vai admitir o racismo”.

“Ontem, […] o Carrefour cometeu mais um crime de racismo. Mais um crime. Um fiscal do Carrefour acompanhou uma moça negra, que ia fazer compra, achando que ela ia roubar, ela teve que ficar só de calcinha e sutiã para provar que ela não ia roubar. É a segunda vez que o Carrefour faz esse tipo de coisa”, disse.

“Então, a gente tem que dizer para A direção do Carrefour, se quiserem fazer isso no seu país de origem, que façam, mas neste país a gente não vai admitir o racismo”, finalizou.

 

O Atacadão foi adquirido pelo Grupo Carrefour em 2007.

Questionamentos

Segundo Isabel, ainda no mercado, ela chegou à conclusão de que não podia aceitar a situação e ligou para a polícia para denunciar.

A professora contou que foi questionada pelos policiais se funcionários da empresa recusaram atendimento ou se houve algo que caracterizasse crime de racismo.

Professora registrou Boletim de Ocorrência (B.O.) na tarde desta segunda-feira (10) — Foto: Wilson Kirsche/RPC

“A gerente me ofereceu um copo d’água. Mas eu queria respeito, só isso. Ela pediu desculpas e falou que a empresa ia tomar as providências cabíveis”, contou.

Desabafo nas redes sociais

Nas redes sociais, a professora gravou um vídeo e postou contando como se sentiu mal após toda a situação. Ela informou que se sentiu como uma “marginal”.

Segundo Isabel, o segurança a seguiu por mais de 30 minutos.

“Não pode ficar assim, eu tenho dois filhos, não quero que eles passem por isso”, contou chorando.

 

O protesto

Isabel disse que resolveu dar uma resposta à situação. Algumas horas após o acontecimento, Isabel foi para casa e resolveu voltar ao estabelecimento e protestar.

Escreveu em seu corpo “sou uma ameaça”. Dentro do mercado, retirou a roupa e ficou somente com as roupas íntimas, deixando a frase a mostra.

“Eu não fui sexualizar nada, era um corpo perguntando se podia ser uma ameaça para aquele ambiente”, concluiu.

De acordo com a professora, ninguém fez nada contra o ato de protesto e a empresa não a procurou.

O que diz a empresa

Em nota, na sexta-feira (7), a empresa informou que não identificou indícios de abordagem indevida durante uma apuração interna da denúncia. Alegou, ainda, que se colocou à disposição de Isabel.

“Lamentamos que a cliente tenha se sentido da maneira relatada, o que, evidentemente, vai totalmente contra nossos objetivos. A empresa possui uma política de tolerância zero contra qualquer tipo de comportamento discriminatório ou abordagem inadequada”, diz a nota.

A empresa afirmou ainda na nota que realiza treinamento rotineiro com funcionários para que essas ações não aconteçam.

“Ressaltamos, ainda, que nosso modelo de prevenção tem como foco o acolhimento aos clientes, com diretrizes de inclusão e respeito que também são repassadas aos nossos colaboradores por meio de treinamentos intensos e frequentes”, conclui.