O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta sexta-feira (30), o julgamento que vai decidir se réus em processos criminais, condenados em júri popular, devem cumprir a pena imediatamente após a decisão dos jurados, mesmo com a possibilidade de novos recursos.
Há cinco votos no sentido de permitir a execução imediata, independentemente do total da pena aplicada. Outros três ministros votaram no sentido contrário. Faltam os votos dos ministros Nunes Marques, Luiz Fux e Edson Fachin.
A análise foi reiniciada no plenário virtual, formato de deliberação em que os ministros depositam seus votos em uma página eletrônica da Corte, sem a necessidade de sessão presencial ou por videoconferência.
A deliberação vai ocorrer até 7 de agosto, se não houver pedido de vista ou de destaque. O prazo estendido até agosto ocorre por conta do recesso na Corte. Na prática, se não houver suspensão, o caso será concluído no segundo semestre.
Por ter repercussão geral, a decisão ser tomada pelo STF valerá para todos os casos semelhantes nas demais instâncias da Justiça.
A análise estava suspensa desde novembro de 2022, quando o ministro André Mendonça pediu vista – mais tempo para avaliação do processo. Na retomada, o ministro acompanhou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, pelo cumprimento imediato da pena.
O júri popular – previsto na Constituição e formado por sete pessoas – julga crimes dolosos (quando há intenção) contra a vida, entre os quais homicídio, feminicídio e infanticídio.
O relator, Luís Roberto Barroso, votou no sentido de estabelecer o entendimento de que a execução imediata da condenação pelo júri vai ocorrer independentemente do total da pena aplicada. Ele propôs a seguinte tese:
“A soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada.”
O ministro também concluiu que deve ser invalidada a restrição, prevista na Lei Anticrime, do início imediato do cumprimento de pena apenas nos casos em que a punição é igual ou maior que 15 anos. Para Barroso, a medida limita o princípio da soberania do júri, previsto na Constituição.
“Se, de fato, são soberanas as decisões do Júri, não cabe à lei limitar a concretização e o alcance dessas mesmas deliberações. Limitar ou categorizar as decisões do Júri, além de contrariar a vontade objetiva da Constituição, caracteriza injustificável ofensa ao princípio da isonomia, conferindo tratamento diferenciado a pessoas submetidas a situações equivalentes”, afirmou.
Acompanharam o voto do relator os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia. À posição, se soma agora o ministro André Mendonça.
Para Toffoli, “a condenação deve ser imediatamente cumprida nos crimes julgados pelo tribunal do júri, em razão da estatura constitucional desse órgão do Judiciário, mormente se levado em consideração a soberania dos vereditos”.
Moraes argumentou que, “ao reconhecer como inviável a execução provisória da pena nos casos de condenações relativas ao Tribunal do Júri, estar-se-ia dando de ombros à garantia constitucional da soberania dos vereditos”.
Os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber divergiram do relator e votaram contra a possibilidade de execução imediata da pena imposta pelos jurados, permitindo apenas a prisão preventiva justificada dos réus.
O decano da Corte, Gilmar Mendes, afirmou que a presunção de inocência é “regra”. “Ninguém pode ser punido sem ser considerado culpado; ninguém pode ser preso sem ter a sua culpa definida por ter cometido um crime; não se pode executar uma pena a alguém que não seja considerado culpado”, votou.
Para Lewandowski, “afigura-se até compreensível que alguns magistrados queiram flexibilizar essa importante garantia dos cidadãos por, ingenuamente, acreditarem que assim melhor contribuirão para evitar o crescente número de homicídios dolosos que perturba nossa harmonia social”.
A ministra Rosa Weber, que antecipou o voto, considerou que o princípio da presunção de inocência estabelece uma proibição da execução provisória da pena, mesmos nos casos do júri.
“Não extraio, contudo, da soberania dos veredictos a imposição constitucional de execução provisória da pena desde a condenação proferida pela primeira instância. Na realidade, como já dito, o art. 5º, LVII, da Constituição da República encerra proibição peremptória de execução provisória de qualquer pena e tal fato, na minha compreensão, não se altera pela soberania dos veredictos”.
O caso que chegou ao STF é de Santa Catarina. No recurso, o Ministério Público contesta uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que derrubou a prisão de um condenado pelo júri por feminicídio duplamente qualificado e posse irregular de arma de fogo.
O MP afirma que a execução da pena é possível em respeito ao princípio da soberania dos vereditos, e que uma decisão do júri não pode ser revista pelo tribunal de apelação.
Já o STJ entendeu que é ilegal a prisão decretada apenas com base na condenação pelo júri, sem elemento para justificar a prisão cautelar e sem a confirmação da condenação por colegiado ou o esgotamento das possibilidades de recursos.
Em 2019, por 6 votos a 5, o Supremo decidiu derrubar a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância, alterando um entendimento adotado desde 2016, mas essa decisão não se aplicou ao júri popular.
A maioria dos ministros entendeu que, segundo a Constituição, ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado (fase em que não cabe mais recurso), e que a execução provisória da pena fere o princípio da presunção de inocência.