Futebol

Ex-craque do futebol feminino trabalha como gari após carreira nos anos 1980

"Realizei o maior sonho da minha vida", conta sobre jogar em Maracanã lotado

Arquivo Pessoal

Elzinha posa na pintura da grafiteira Andressa Gandra em Oswaldo Cruz, homenagem à seleção feminina

Funcionária da Companhia Municipal de Limpeza Urbana há 25 anos, Elza Nogueira trabalha como gari em Campo Grande, no Rio de Janeiro. A ex-jogadora de futebol, estrela do futebol feminino nos anos 80, agora tem 63 anos de idade e foi tema do quadro “Gols do Fantástico”, que foi reprisado no último domingo pela TV Globo.

Na expectativa de assistir a estreia da seleção feminina na Copa do Mundo de Futebol Feminino, Elzinha conta ao GLOBO: “Meu patrão Eduardo Paes que me perdoe, mas segunda-feira eu só varro a rua até 7h30. Às 7h40, vou dar uma olhada nas meninas da seleção. Vai ser 5 a 1 contra o Panamá.”

A carreira de Elzinha
Entre 1941 e 1979, por quase quatro décadas, o futebol feminino foi proibido no Brasil, a partir de decreto-lei assinado pelo então presidente Getúlio Vargas. No início de sua vida, Elzinha explica como teve seus primeiros contatos com a modalidade: “Eu comecei a jogar com 9 anos, com os moleques da rua, na Vila Kennedy. ‘Vamos jogar uma pelada? Vambora!'”.

Durante a adolescência, jogou em times amadores na Barra do Piraí e em Padre Miguel. Segundo seus relatos, na época, treinava com as equipes masculinas e depois jogava contra as femininas. Em seguida, passou pelo Bangu e foi emprestada ao Radar, time de Copacabana, da Zona Sul do Rio. Pelo time da Zona Oeste, ela era comandada por Castor de Andrade, famoso bicheiro, mafioso e presidente do Bangu Atlético Clube.

Enquanto amadoras, sem profissionalização, Elzinha e as outras jogadoras não eram remuneradas pelos clubes. Ela relembra que o presidente do Radar, Eurico Lira, dizia que as atletas precisavam estudar e ter um trabalho para se manter: “Porque não sabíamos o que ia acontecer com o futebol feminino. Então, fui atrás e consegui me formar no Ensino Médio”.

Com o Bangu, Elzinha foi tricampeã da Taça São Paulo, torneio disputado por clubes femininos. Em 1983, a jogadora de 1,50m entrou em campo em um amistoso contra o Cruzeiro em um Maracanã lotado, seis dias após a regularização do futebol feminino: “Realizei o maior sonho da minha vida”, revela.

A ex-atleta lembra que foi chamada pelo Atlético Mineiro com a sua companheira de time Rose, mas que não se adaptou. “Voltei logo para o Rio, para o Radar, que me pagava direitinho. Mas com um tempo, os campeonatos foram diminuindo. Aí parei de com o futebol, fui trabalhar numa ótica e depois na Comlurb, onde estou até hoje.”

A vida atual
Aos 63 anos e aposentada, Elzinha é casada com Mary Clares Fernandes há quase 30 anos. Com a esposa, tem três filhas e sete netos. “Ela é muito família e conserva uma alegria”, diz Gustavo, neto de 18 anos.

Moradora da Vila Kennedy e trabalhadora em Campo Grande, Elza Nogueira explica gostar da sua profissão: “Gosto de varrer, conversar com as pessoas… Acordo às 4h30 da manhã e vivo a vida com alegria”. Ela também diz estar na torcida pelo futebol feminino na Copa do Mundo: “Eu continuo na torcida pelas mulheres do Brasil! E pelo meu Botafogo! Fico nervosa assistindo às partidas.”