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Negros são 66% dos réus em processos da Lei de Drogas na Justiça Estadual, diz pesquisa

Estudo feito pelo Ministério da Justiça ,em parceria com o Ipea, analisou mais de 5 mil processos nos tribunais de Justiça estaduais, e 253 na Justiça Federal.

Um estudo lançado nesta sexta-feira (22) aponta que 66% dos réus em processos relacionados à Lei de Drogas na Justiça Estadual são negros.

O levantamento foi feito pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O estudo analisou mais de 5 mil processos dos tribunais de Justiça estaduais, e 253 da Justiça Federal, todos sentenciados no primeiro semestre de 2019.

Ilustração

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Segundo o Ipea, no caso da Justiça Federal, todos os processos ligados à Lei de Drogas foram analisados. Já na Justiça Estadual, foi realizada a chamada pesquisa por amostragem, com análise de mais de 5 mil processos, em um universo de mais de 40 mil réus.

A pesquisa pretende fazer um diagnóstico sobre a aplicação da legislação contra o tráfico de drogas no país e, segundo a secretária Nacional Políticas sobre Drogas, Marta Machado, permitiu vislumbrar um perfil comum dos réus.

“Os casos de tráfico de drogas focam em pequenos traficantes ou pessoas que até mesmo são usuárias. O perfil do processado é de baixa escolaridade, pequena quantidade de droga apreendida, sem porte de arma, a maioria não branco, e mostra esse padrão de atuação do sistema de justiça criminal, especialmente o sistema de Justiça Estadual, em que 84% dos casos não são fruto de investigação”, afirmou Marta.

Dados

A pesquisa apontou que a maioria dos réus é composta por:

Na Justiça Estadual

  • Homens (86%);
  • Negro (66%);
  • 18 a 30 anos (71%);
  • Não chegou ao ensino médio (68%).

Na Justiça Federal

  • Homens (79%);
  • Negro (67%);
  • 22 a 40 anos (65%);
  • Com ensino superior (57%).

De acordo com a pesquisadora do Ipea Milena Soares, os dados apresentados são percentuais ajustados. O levantamento desconsiderou casos em que houve lacuna de informação.

Segundo o Ipea, em 30% dos processos estaduais, não foi possível obter dados sobre cor ou raça. Na Justiça Federal, esse dado foi de 71%.

Em relação aos crimes previstos na Lei de Drogas pelos quais os réus foram condenados, tanto na Justiça Estadual quanto na Federal, a pesquisa aponta a predominância dos delitos de tráfico de drogas e associação para o tráfico, sendo:

Justiça Estadual

  • Tráfico de drogas (90%);
  • Associação criminosa (36%);

Justiça Federal

  • Tráfico de drogas (83%);
  • Associação Criminosa (50%).

No que se refere à espera pela sentença, a pesquisa constatou que, em média, os réus aguardaram 327 dias na Justiça Estadual e 752 dias na Justiça Federal.

Investigação

A pesquisa também levantou dados sobre a fase policial dos processos e diagnosticou que, no caso da Justiça Estadual, 87% dos inquéritos foram abertos por flagrante, e 16% decorrentes de investigações anteriores.

Já na Justiça Federal, 53% dos inquéritos foram abertos motivados pelo flagrante, e 44% decorrentes de investigação anterior.

Outro dado levantado pela pesquisa é relacionado à violação de domicílios. Na Justiça Estadual, em 49% das abordagens, houve entrada em domicílio do réu. Destes, em 15% dos casos havia mandado judicial.

Na Justiça Federal, o percentual foi de 20% de entrada no domicílio, sendo que em 64% dos casos havia mandado judicial.

A secretária nacional de Política sobre Drogas, Marta Machado, apontou que um dos principais desafios é qualificar o trabalho policial, e afirmou que a pesquisa mostra que o sistema judiciário está “enxugando gelo”.

“Acho que o nosso maior desafio é a qualificação do trabalho policial, é a qualificação da aplicação da Lei de Drogas para que ela seja mais eficiente. Basicamente, a pesquisa mostra que estamos enxugando gelo, estamos apreendendo pessoas que ou são usuários e estão classificados erroneamente como traficantes, ou são pequenos usuários que são rapidamente substituídos”, disse.

“Então, os nossos recursos estão sendo mal investidos e não é à toa que a população carcerária brasileira cresceu muito, ao mesmo tempo em que as organizações criminosas se fortaleceram”, finalizou.