Esporte

Menino com hidrocefalia e doença na coluna vertebral se apaixona por corridas de rua: ‘Já fomos a mais de 50 provas’, diz pai

Samuel Nascimento Valentim, de 11 anos, mora em São Bernardo do Campo; ele nasceu com mielomeningocele, que causa má-formação na coluna vertebral e hidrocefalia. Família fará corrida beneficente no domingo (21) para arrecadar dinheiro para custos com nova cadeira de rodas.

Arquivo Pessoal

Samuel Nascimento, de 11 anos, em uma das corridas

Com uma má-formação na coluna vertebral e hidrocefalia, Samuel Nascimento Valentim, de apenas 11 anos, vive uma rotina cercada de idas ao hospital e cirurgias desde recém-nascido. Ao todo, já foram 18 procedimentos cirúrgicos.

A mielomeningocele (entenda abaixo) fez com que o pequeno perdesse os movimentos das pernas e precisasse de fisioterapia constantemente. Mas foi justamente por um esporte conhecido pelo esforço físico das pernas que ele se apaixonou e se tornou praticante mesmo sendo paraplégico: a corrida de rua.

“Em 2019, um amigo nosso disse para eu levar o Samuel em uma corrida que ia acontecer aqui em São Bernardo do Campo, onde moramos. Falei que eu era sedentário, que não costumava correr, mas mesmo assim ele insistiu. Eu o levei e pronto, Samuel se apaixonou na hora. Disse que tinha virado corredor e, com isso, eu me tornei corredor para poder levá-lo”, afirmou o pai, Aldemir Valentim dos Santos.

Aldemir conta que desde então os dois não pararam mais de participar das corridas de rua, seja na cidade deles ou em outras, como a capital paulista. A dupla se tornou conhecida pelos participantes e até pelos organizadores.

“Passamos a ser bem conhecidos nas corridas e isso fez com que Samuel se sentisse bem, feliz. O pessoal o aplaude, o locutor fala o nome dele. Isso o deixa muito animado. E eu mesmo deixei o sedentarismo para termos isso. Já participamos de mais de 50 provas em São Bernardo do Campo e São Paulo“, relatou o pai.

Vídeos enviados pelo pai ao g1 mostram Samuel participando das corridas em momentos em que faz questão de não ter a ajuda do pai ou de algum parente.

“Ele passou a fazer sempre as largadas e chegadas das corridas sozinho. Só no meio do percurso que vou ajudando ele. Ele mesmo que pediu que queria sempre ir sozinho nesses momentos. É o momento dele, de se sentir realizado”, ressalta Aldemir.

Samuel Nascimento Valentim, 11 anos, se apaixonou por corrida de rua — Foto: Arquivo Pessoal/Aldemir Santos

Corrida beneficente

Segundo Aldemir, desde que ele e a esposa souberam do diagnóstico do filho, foi preciso organizar ações beneficentes para conseguir arcar com todos os custos.

“Nada é barato e, se não fosse pela ajuda de pessoas, da igreja, de ações mesmo, não conseguiríamos. O tratamento, graças a Deus conseguimos pela AACD, mas o resto tivemos que ir pagando e fazendo campanha. Uma cadeira de rodas para crianças é muito cara. Eu trabalho com marcenaria e minha esposa, com salão de beleza aos fins de semana.”

“Um dia, pensando em como íamos arcar com os custos, pensamos em fazer uma corrida em prol do Samuel. Foi aí que surgiu a primeira edição do ‘Correndo pelo Samuel’. Conseguimos muitos parceiros e nos ajudou muito. Depois, fizemos outra.”

Samuel Nascimento, de 11 anos, tem hidrocefalia e doença na coluna vertebral — Foto: Arquivo Pessoal

Neste domingo (21) será feita a terceira edição, que deve reunir mil participantes na Avenida Robert Kennedy. A prova é organizada por uma série de parceiros, como o Sindicato Nacional dos Cegonheiros.

A largada está prevista para 7h com as modalidades corrida e caminhada em percursos de 5 km e 10 km. Doações também podem ser feitas para a família, que atualiza o estado de saúde de Samuel no perfil do Instagram @unidospelo_samuel.

“O tratamento é contínuo. Tem fisioterapia, remédios, cadeira de rodas e outros cuidados especiais. apesar de o plano de saúde cobrir boa parte do tratamento, as despesas são muitas e altas. Em maio de 2023, Samuel fez uma cirurgia para escoliose, mas teve complicação e ficou em coma induzido. Foram gastos inesperados”, explica Aldemir.

Samuel com medalha da segunda corrida feita em prol ao seu tratamento médico — Foto: Arquivo Pessoal

Mielomeningocele

A mielomeningocele, também chamada de espinha bífida aberta, causa malformação na coluna vertebral nas primeiras semanas de gestação devido ao aparecimento de uma pequena bolsa nas costas, sendo mais comum no fim da espinha.

A doença também faz com que o bebê apresente hidrocefalia e, também, perda da função motora. “A criança pode não conseguir se locomover sozinha ou sem o uso de aparelhos, ou de uma cadeira de rodas. E pode perder funções também como controle urinário, controle intestinal”, explicou o especialista em medicina fetal Fábio Peralta, em entrevista ao Fantástico.

Antigamente, a doença causava uma alta taxa de letalidade aos bebês nos primeiros anos de vida. Depois, foram desenvolvidas cirurgias feitas logo depois do parto e, em 2004, começaram as primeiras cirurgias intrauterinas do país.

O pai de Samuel disse que, quando ele e a esposa souberam do diagnóstico, precisaram entender melhor sobre a doença. “O médico viu no ultrassom que na coluna dele tinha algo que não era normal e que a cabeça estava crescendo mais do que o normal. Aí detectou a doença. A gente ficou desesperado e começou a ir atrás de médicos, de relatos.”

Ainda conforme Aldemir, o filho colocou uma válvula assim que nasceu, o que impediu que a cabeça crescesse de forma desproporcional devido à hidrocefalia. “A válvula tira o excesso de líquido da cabeça. Na sequência, já conseguimos que ele fosse assistido pela AACD, e isso foi ótimo para nossa família.”

“Em maio de 2023, ele precisou fazer uma cirurgia de escoliose, mas teve complicação e Samuel teve choque anafilático. Ficou em coma induzido, internado por 75 dias. Mas graças a Deus deu tudo certo e ele se recuperou. Na época, eu e minha esposa ficamos sem chão. Uma luta a cada dia.”

Samuel com os pais durante corrida em São Bernardo do Campo — Foto: Arquivo Pessoal

Samuel Nascimento, de 11 anos, mora em São Bernardo do Campo — Foto: Arquivo Pessoal