No Brasil, quantos alunos pobres, de 15 anos, conseguem resolver problemas simples de matemática, com frações, porcentagem e números decimais? Entre aqueles de menor renda que participaram da mais recente edição do Pisa (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), em 2022, apenas 3% demonstraram ter esse conhecimento básico.
Já no grupo dos mais ricos, a taxa é bem mais alta, apesar de também ser insatisfatória: 33%.
É o que indica uma análise exclusiva obtida pelo g1, formulada pelo centro de pesquisas Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional), a partir de microdados dos resultados da principal avaliação de aprendizado do mundo.
Os números gerais do Pisa, divulgados em dezembro de 2023 pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), ainda não consideravam os aspectos de renda, mas já mostravam que 7 em cada 10 alunos brasileiros não sabiam converter moedas ou comparar distâncias.
Nesta reportagem, entenda:
Para analisar o desempenho do país no Pisa, o Iede separou os 10.798 brasileiros que fizeram a prova em três grupos, de acordo com a renda, e comparou as notas dos dois extremos: da “fatia” dos 33% mais ricos com a “fatia” dos 33% mais pobres.
No Brasil, quantos alunos pobres, de 15 anos, conseguem resolver problemas simples de matemática, com frações, porcentagem e números decimais? Entre aqueles de menor renda que participaram da mais recente edição do Pisa (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), em 2022, apenas 3% demonstraram ter esse conhecimento básico.
Já no grupo dos mais ricos, a taxa é bem mais alta, apesar de também ser insatisfatória: 33%.
É o que indica uma análise exclusiva obtida pelo g1, formulada pelo centro de pesquisas Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional), a partir de microdados dos resultados da principal avaliação de aprendizado do mundo.
Os números gerais do Pisa, divulgados em dezembro de 2023 pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), ainda não consideravam os aspectos de renda, mas já mostravam que 7 em cada 10 alunos brasileiros não sabiam converter moedas ou comparar distâncias.
Nesta reportagem, entenda:
“Não dá para dizer que as escolas mais ricas estejam tendo resultados excepcionais. Mas esses dados mostram que o nível socioeconômico continua muito determinante para a aprendizagem dos alunos no país. A educação deveria ser justamente uma ferramenta para diminuir essa desigualdade”, afirma Ivan Gontijo, gerente de políticas educacionais da ONG Todos Pela Educação.
Entre as cinco regiões, também há diferenças acentuadas:
“Há casos que estão avançando, como no Ceará e em Alagoas, mas são poucos exemplos. É preciso pensar em uma melhor distribuição de recursos para as regiões Norte e Nordeste”, explica Ernesto Faria, diretor-executivo do Iede. “O ensino de qualidade não pode depender do CEP de onde a pessoa nasceu.”
Émerson de Pietri, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), lembra que as desigualdades existem também dentro do mesmo município e da mesma rede (pública e particular). “Há condições muito insatisfatórias até em escolas particulares de cidades pobres. É fundamental pensar nessa heterogeneidade”, diz.
🔔 Atenção: a desigualdade de aprendizado não é observada só no Brasil. Países desenvolvidos, como os Estados Unidos, apresentam abismos ainda maiores entre o desempenho de pobres e de ricos na escola.
A diferença é que, no caso brasileiro, as médias são muito insatisfatórias, mesmo entre as classes favorecidas economicamente.
“No mundo, em poucos casos, essa diferença social diminuiu [nos últimos anos]. Isso significa que algo está falhando nos sistemas educativos”, afirma Tiago Caliço, analista da OCDE.
Em primeiro lugar, é preciso fazer uma ressalva. Quando os primeiros dados do Pisa 2022 foram divulgados, em dezembro do ano passado, ficou claro que o Brasil estava estagnado – as notas variaram pouquíssimo em dez anos. Nem mesmo a pandemia provocou mudanças no desempenho. Levantou-se, então, uma hipótese: será que o nível de qualidade das escolas é tão baixo que tanto faz se elas estiverem abertas ou fechadas (como no período da Covid)?
Caliço, da OCDE, descarta essa ideia. Ele explica que a estagnação pode estar relacionada a outro fator: uma maior participação de alunos vulneráveis no Pisa. Em 2003, quase metade (45%) dos estudantes não era representada na prova. Em 2022, a porcentagem de excluídos caiu para 24%.
“Nós sabemos que as populações menos favorecidas vão ter desempenhos mais fracos, e elas passaram a ser mais representadas no Pisa. Se as notas ficaram estagnadas mesmo assim, está implícito aí que houve algum ‘sucesso’ educativo”, afirma Caliço.
A seguir, veja um resumo das principais dificuldades encontradas pelo Brasil para melhorar a média geral no Pisa:
🧑🏫 BAIXA ATRATIVIDADE: A carreira de professor não é atrativa no país, em geral, pela baixa remuneração e pelas condições de trabalho. Nos cursos de licenciatura em matemática, então, a procura por vagas é baixíssima, e a evasão é alta. Quando um aluno tem bom desempenho em cálculo, acaba migrando para carreiras com melhores perspectivas de mercado de trabalho, como economia, engenharia e ciências da computação.
“Existe um gargalo de formação. Os professores [que se formam] em matemática não costumam ter uma bagagem tão robusta, porque não puderam desenvolver essas habilidades quando eram alunos”, afirma Ernesto.
E mais: com os baixos salários, o mesmo professor precisa dar aula em mais de uma escola. O ideal seria que ele ganhasse o suficiente para poder se dedicar integralmente somente a um colégio.
❌ QUALIDADE RUIM EM FACULDADES: Émerson, da USP, explica que o crescimento desenfreado do ensino à distância (EAD) foi um retrocesso na educação: está rebaixando o nível de formação de professores. Em geral, são graduações formuladas a baixo custo, com aulas gravadas e reproduzidas para um número ilimitado de alunos.
DESEQUILÍBRIO NA DISTRIBUIÇÃO DE PROFESSORES: Forma-se um ciclo. Os estudantes aprovados nas faculdades privadas entram, em geral, com uma defasagem nos conhecimentos básicos, provavelmente pela baixa qualidade do ensino médio público. ➡️ Têm acesso a um curso superior fraco. ➡️Após a formatura, enfrentam maior dificuldade para passar nos concursos públicos mais concorridos.➡️ São contratados como professores temporários, em escolas de pior estrutura.➡️ Ensinam alunos que já são mais socialmente vulneráveis e que, por tabela, continuarão recebendo uma formação escolar pior que a dos mais ricos.
Ivan, do Todos Pela Educação, acrescenta mais um detalhe: no sistema de concursos públicos, os professores efetivos com mais experiência adquirem o direito de escolher a região onde trabalharão. Por buscarem melhores condições de infraestrutura, transporte e segurança, por exemplo, acabam optando, em geral, por escolas mais centrais, que já têm melhores desempenhos.
“No bairro vulnerável, fica o docente temporário [e menos experiente], que dá aula em três colégios diferentes”, diz o especialista.
✏️ PASTEURIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO: Neide Noffs, professora de pós-graduação em educação na PUC-SP, diz que é preciso pensar em estratégias de ensino-aprendizagem voltadas para a realidade de determinada escola ou região. “Não faz sentido padronizar os alunos, se os recursos não são padronizados. Precisamos respeitar o contexto das crianças e propor situações para que elas aprendam dentro da realidade delas”, diz.
💰 DESIGUALDADE ECONÔMICA: Entram aqui nos três aspectos, explica Emerson de Pietri. Veja abaixo:
As consequências vão além das dificuldades de se chegar ao ensino superior ou de ocupar funções reconhecidas no mercado de trabalho:
Tiago, da OCDE, reforça que as análises do Pisa devem sempre levar em conta o desempenho do país por um período mais extenso. Não faz sentido, segundo ele, olhar apenas para duas edições do exame e tirar alguma conclusão sobre determinada política educacional.
E mais: rankings não são apropriados. Os países têm diferentes realidades econômicas e sociais, dimensões territoriais, organização política, tamanhos de população…
Tendo isso em mente, os especialistas entrevistados nesta reportagem apontam como estratégias de melhoria:
“Equidade não é dar a mesma coisa para todos, e sim ver as necessidades de cada um e customizar o sistema”, diz Ivan Gontijo.