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Seca e ondas de calor em 2023 custarão R$ 700 milhões a mais na conta de energia

Impacto médio na tarifa de energia vai ser de 0,3%, aplicado nos próximos reajustes tarifários das distribuidoras.

Equatorial

Arquivo. Créditos: Equatorial

O cenário de secas, ondas de calor e de menor geração eólica em 2023 vai custar R$ 700 milhões a mais que o esperado na conta de energia para quem compra das distribuidoras. Os dados são da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), levantados a pedido do g1.

Apesar do aumento, o impacto médio na tarifa de energia vai ser de 0,3%, aplicado nos próximos reajustes tarifários das distribuidoras (entenda mais abaixo).

Os números se referem ao aumento nos Encargos de Serviço de Sistema (ESS) — pago na conta de luz para custear o acionamento de usinas termelétricas em casos pontuais, quando é necessário garantir a segurança do sistema nacional.

“[Esses] encargos são para ressarcir geradores quando eles não estariam originalmente programados para gerar, mas por uma razão ou por outra o operador acaba programando”, explicou o pesquisador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Brandão.

Foi por meio do ESS que as usinas termelétricas acionadas no ano passado foram remuneradas. Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), a elevação se deve a:

  • aumento do consumo, especialmente no horário de pico — por volta das 19h; e
  • queda na geração de energia eólica.

“Isso tem relação com a temperatura também, por conta de ventiladores e ar-condicionado”, concluiu a CCEE.
O consumo de energia bateu recorde em novembro de 2023, por causa do calor. Em novembro e dezembro, a demanda aumentou com o uso de ares-condicionados e equipamentos de refrigeração.

Além disso, segundo Brandão, as hidrelétricas do Norte costumam gerar menos energia nos últimos meses do ano, o que já motiva o acionamento de usinas termelétricas para suprir o consumo. Contudo, esse comportamento sazonal foi intensificado em 2023 pelo fenômeno climático El Niño, que causou secas na região.

“Normalmente, essas usinas geram muito pouco no segundo semestre. […] Ano passado, como a gente teve uma seca no Norte muito pronunciada, a situação foi ainda pior”, afirmou o pesquisador.

Soma-se a esse cenário a menor geração das usinas eólicas no fim do ano, período em que há uma queda sazonal.

“A geração eólica na média é mais intensa entre agosto e outubro. São os meses em que você tem grande geração eólica, o que é bom porque é o período seco já, isso é muito bom. Mas quando você está chegando mais para o final do ano e início do ano, sobretudo, a geração eólica cai um pouco”, explica o pesquisador.

Houve então um cenário de consumo maior que o esperado, por causa do calor, junto a uma redução na geração hidrelétrica, por conta das secas, e da geração eólica –cuja queda é comum para esse período do ano.

Valores maiores que o esperado
O repasse dos valores do Encargos de Serviço de Sistema ocorre anualmente, quando a Aneel reajusta as tarifas das distribuidoras de energia, no aniversário do contrato. Dessa forma, todo ano a Aneel faz uma projeção do quanto deve custar o ESS e incorpora esse valor no reajuste das distribuidoras.

Para 2023, a projeção da Aneel com base na previsão anual do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) era de R$ 142,9 milhões. Contudo, as despesas reais chegaram a R$ 842,3 milhões.

A diferença de cerca de R$ 700 milhões será incorporada nos processos de reajuste de 2024, resultando numa elevação da tarifa para o consumidor este ano.

Esse aumento vai ter impacto de 0,3% na tarifa média para o consumidor que compra energia das distribuidoras, segundo estimativa da Aneel.

Elevação em novembro e dezembro
Os valores da CCEE, que incluem todos os consumidores, apontam um pagamento de R$ 384,3 milhões em novembro e de R$ 465,4 milhões em dezembro — muito acima dos meses anteriores.

A Câmara de Comercialização faz a contabilização desses encargos para todos que compram energia no sistema, sejam distribuidoras ou consumidores livres — empresas que têm consumo alto e podem escolher o seu fornecedor de energia, negociando contratos.

Bandeira tarifária
Na última terça-feira (5), a Aneel aprovou uma mudança no sistema de bandeiras tarifárias que pode transferir os valores que seriam cobrados dentro do Encargos de Serviço de Sistema para as bandeiras.

Na prática, significa que os consumidores sentirão o impacto do acionamento de térmicas mais cedo.

As bandeiras tarifárias sinalizam o custo da geração de energia. Ou seja, se é preciso acionar usinas mais caras, o valor da energia também fica mais caro na conta de luz.
Isso é sinalizado por cores:

 bandeira verde — cenário favorável, não há cobrança extra;
➡️ bandeira amarela — cenário menos favorável, cobrança de R$ 18,85 por MWh (megawatt-hora) utilizado;
➡️ bandeira vermelha patamar 1 — condições desfavoráveis, tarifa de R$ 44,63 por MWh utilizado;
➡️ bandeira vermelha patamar 2 — condições muito desfavoráveis, tarifa de R$ 78,77 por MWh utilizado.

A mudança implementada pela Aneel é um novo “gatilho” para acionamento dessas bandeiras. Agora, quando o ONS precisar utilizar usinas termelétricas de forma extraordinária e pontual para garantir o funcionamento do sistema, o custo dessa medida pode mudar a cor da bandeira depois.

No modelo anterior, esse custo entrava no ESS. Ou seja, se a regra já estivesse em vigor no ano passado, esses R$ 700 milhões de ESS que não estavam previstos e vão entrar na conta em 2024 poderiam ter sido remunerados pelas bandeiras tarifárias.