Política

‘Sumia-se com estantes inteiras de processos’, diz Ronnie Lessa sobre o pagamento para dar fim às investigações

O réu colaborador Ronnie Lessa depõe na audiência do STF. Créditos: Reprodução

Em quase duas horas de depoimento, a testemunha Ronnie Lessa deu detalhes sobre a suposta corrupção policial. Com a experiência de quem foi adido da Polícia Civil, ou seja, emprestado às delegacias, apesar de ter sido policial militar, o réu colaborador contou que, quando os inquéritos eram exclusivamente em papel, bastava pagar R$ 50 mil aos policiais civis para “sumirem” com eles. Atualmente, como os documentos são inseridos no sistema da corporação, ou seja, são virtuais, a prática é pagar para desaparecer com provas, ou seja, criar obstáculos para o crime não ser elucidado, situação mais comum quando a autoria envolve contraventores e milicianos. As informações foram reveladas pelo blog Segredos do Crime, do Globo.

— Eu posso adiantar que um grande número de delegados, talvez hoje se tivesse uma intervenção, uma coisa séria, e aparecesse um cara para denunciar, provando que deu dinheiro a tantos delegados, ia ter que abrir concurso. Não ia ter espaço. Meia dúzia que iria se salvar. Essa é a realidade da Polícia Civil. E não é diferente da PM, não. É a mesma coisa. As polícias no Rio de Janeiro estão contaminadas há décadas — afirmou Lessa.

Ainda segundo o blog Segredos do Crime, do Globo, Lessa diz que muitos inquéritos eram destruídos com fogo:

— Então, vai lá e fala com ele (policial) que tem um negócio assim assado pra andar ou tem um inquérito pra jogar fora. Agora, como digitalizou, tá mais difícil. Mas antes, era pegar inquérito, jogar debaixo do braço, jogar gasolina e tacar fogo. Era por aí. Funcionava. Então sumiam estantes inteiras de processos. Isso quando era físico. Então, depois que digitalizou, a coisa ficou um pouco mais difícil. O que eles fazem hoje? Eles podem tentar manipular o processo. O inquérito manipula, desvia pra outro foco, por aí. Mas, antigamente, não. Pegava o processo dessa grossura, um palmo de grossura, botava debaixo do braço, apertava a mão, deixava R$ 50 mil e ia embora.

Isenta ex-bombeiro
Nas primeiras três horas de depoimento, Ronnie Lessa tentou tirar o amigo e ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel, do foco da execução de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Segundo Lessa, o ex-militar nunca matou ninguém, e pôs a culpa em Edmilson da Silva Oliveira, o Macalé, pelo convite ao Suel. Macalé, é apontado pela Polícia Federal, baseada na delação premiada de Lessa, como intermediário entre ele e os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, acusados de encomendarem o assassinato da parlamentar. Macalé foi assassinado em novembro de 2021.

— Não é a dele (Suel). Nunca tinha dado tiro em ninguém. Ele era bombeiro! Quando Macalé chamou ele, eu fui contra. Eu estou acostumado a atirar. Suel não era para isso. Ele é preparado demais, mas não é a dele — defendeu o colaborador.

O ex-bombeiro, de acordo com as investigações da Polícia Federal, participou do plano do assassinato e monitorou a rotina da vereadora, além de ter ajudado Lessa e o ex-PM Élcio Queiroz — motorista da emboscada — no desmanche do carro usado no crime e do sumiço das cápsulas da munição. As informações, inclusive, constam na delação do colaborador Lessa, mas em seu depoimento, ele saiu em defesa do amigo.