Política

Caso Marielle: vice do PT afirma não haver provas contra irmãos Brazão; Anielle diz que acionará comissão de ética do partido

Washington Quaquá saiu em defesa de acusados de mandar matar vereadora. Irmã de Marielle chama ato de 'inacreditável'; presidente do PT afirma que sigla 'repudia' fala.

O vice-presidente nacional do PT e prefeito de Maricá (RJ), Washington Quaquá, saiu em defesa nesta quinta-feira (9) de Domingos e Chiquinho Brazão, réus por envolvimento no assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL).

Em uma publicação nas redes sociais, Quaquá afirmou que os irmãos Brazão foram utilizados como “bucha de canhão” e que não há provas de que Domingos e Chiquinho foram os mandantes da execução de Marielle.

No texto, que acompanha uma foto do dirigente do PT ao lado de familiares dos Brazão, Washington Quaquá também especula, sem apresentar qualquer prova, que a investigação do caso teria ocultado relações dos executores da vereadora com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

As declarações de Quaquá levaram a reações dentro e fora do PT. Irmã de Marielle, Anielle Franco – que é filiada à sigla e ministra da Igualdade Racial – classificou a postagem como “inacreditável”.

Investigação conduzida pela Polícia Federal concluiu que Chiquinho e Domingos Brazão foram os mandantes do assassinato de Marielle e do motorista Anderson Gomes, em 2018.

O deputado federal e o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, respectivamente, estão presos desde março de 2024. Os dois também são réus, no Supremo Tribunal Federal (STF), por homicídio qualificado e tentativa de homicídio.

Sem fazer qualquer menção explícita ao nome do prefeito de Maricá, Anielle acusou o dirigente de utilizar o caso de “maneira repugnante”.

Nas redes sociais, a ministra ainda afirmou que apresentará denúncia à Comissão de Ética do PT contra as declarações, que, na avaliação dela, vão “contra a postura do próprio governo e do partido”.

“Minha família e a de Anderson ainda choram todos os dias pelas nossas perdas e lutamos duramente para que a justiça começasse a ser feita”, escreveu Anielle Franco.

 

Denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo apontou que a morte de Marielle foi encomendada pelos irmãos Brazão como resposta à atuação do PSOL e da vereadora contra um esquema de loteamentos de terra em áreas de milícia na Zona Oeste do Rio.

“Vou protocolar nas instâncias do partido um pedido na comissão de ética pro dirigente que se utiliza desse caso de maneira repugnante e que é contra a postura do próprio governo e do partido. Tirem o nome da minha irmã da boca de vocês!”, prosseguiu a ministra da Igualdade Racial.

Procurado pelo g1, Washington Quaquá disse que não precisa “usar a morte de ninguém para fazer política”.

“Eu só brigo por justiça. Que a esquerda aprenda a ler o processo e fazer julgamento sem linchamentos. Eu defendo sempre o critério que defendi com Lula, Zé Dirceu, Vaccari, Genoíno e Delúbio. Ninguém pode ser condenado sem provas”, declarou.

 

O prefeito de Maricá afirmou ainda que “muita gente” ganhou “notoriedade” e constrói carreira “a partir da morte de Marielle”.

“Existem provas concretas e cabais para se chegar aos também brutais mandantes dos assassinatos”, declarou.

PT ‘repudia’, diz presidente

Além de Anielle, a presidente nacional da sigla, deputada Gleisi Hoffmann (PR), e a primeira-dama, Janja Lula da Silva, também se manifestaram sobre o caso.

Na manhã desta sexta (10), ao ser procurada pelo g1 para comentar se o partido aplicaria punição a Quaquá, Gleisi encaminhou publicação feita por ela, horas antes, em uma rede social.

postagem da deputada afirma que o PT repudia as declarações de Quaquá, classificadas por Gleisi como de “caráter exclusivamente pessoal”.

Também diz que o partido “luta desde o primeiro momento para que a Justiça seja feita por Marielle e Anderson, com punição para todos os criminosos”.

Poucas horas depois da publicação de Washington Quaquá, a primeira-dama afirmou ser “desrespeitoso” com a memória de Marielle e Anderson “promover a desinformação nas redes sociais sobre o andamento do caso”.

“À minha amiga Anielle Franco, dona Marinete e toda a família, meu abraço apertado, e meu lamento pelo uso indevido da memória de Marielle”, escreveu Janja em uma rede social.

 

Colecionador de polêmicas

Um dos vice-presidentes nacionais do PT desde 2020, Quaquá coleciona polêmicas ao longo dos anos. Por diversas vezes, foi criticado publicamente por colegas de sigla e “desautorizado” pela presidente do partido.

Entre 2021 e 2022, Gleisi Hoffmann e outros membros do PT rebateram declarações do atual prefeito de Maricá com críticas à ex-presidente Dilma Rousseff. Numa das ocasiões, Gleisi repetiu a tônica adotada no caso Marielle: “Opinião individual de Washington Quaquá não corresponde ao papel da presidenta Dilma”.

Há dois anos, quando exercia o mandato de deputado federal, Quaquá foi criticado por Gleisi por ter postado foto ao lado de Eduardo Pazuello (PL-RJ), também deputado e ex-ministro da Saúde de Bolsonaro.

Washington Quaquá e Pazuello em imagem de 2023 — Foto: Reprodução

“É desrespeitosa com o PT e ofensiva às vítimas da Covid. Na vida e na política, tudo tem limites”, escreveu a presidente do partido.

 

Em outro episódio, no ano passado, Gleisi Hoffmann rebateu falas do dirigente contra o apoio do PT à candidatura derrotada de Guilherme Boulos (PSOL) à Prefeitura de São Paulo.

O caso Marielle se somou aos atritos de Quaquá com outros dirigentes do partido ainda em 2024. Após diversas declarações de Washington Quaquá em apoio aos irmãos Brazão, Chiquinho indicou ao Supremo, em julho do último ano, o prefeito como uma de suas testemunhas.

Todo esse cenário levou a um pedido de afastamento do então deputado federal do cargo na direção nacional do PT.

A inclusão da análise dessa solicitação em uma reunião do comando da sigla, feita por uma das correntes internas do PT, foi rejeitada em julho do último ano.