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Jornalismo mundo-cão é o alvo de Jake Gyllenhaal

Ao interpretar repórter policial em 'O Abutre', ator reflete sobre o papel da mídia e da informação.

Reprodução

Jake Gyllenhaal em cena de ‘O Abutre’

O burburinho em torno de O Abutre começo em setembro, no Festival de Cinema de Toronto, no Canadá: o filme de estreia do diretor Dan Gillroy (roteirista de títulos como Gigantes de Aço e O Legado Bourne e irmão do diretor Tony Gillroy, indicado ao Oscar por Conduta de Risco), era o melhor trabalho já feito por Jake Gyllenhaal.

O ator de 34 anos, famoso pelos olhos azuis, indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante em 2006 pelo sofrido Jack Twist de O Segredo de Brokeback Mountain, apaixonou-se de tal maneira pela história de Louis Bloom que decidiu produzir o thriller. O longa, que estreia este mês nos cinemas brasileiros, foi eleito um dos dez melhores filmes do ano pela centenária National Board of Review por traçar um raio-x do telejornalismo mundo-cão americano.

Gyllenhaal vive Louis Bloom, uma figura sinistra, surgida do nada, dona de uma ambição sem tamanho, nenhum pendor ético e um desconhecimento absoluto do jornalismo acadêmico. Assim, ele se torna uma estrela da mídia televisiva de Los Angeles. “O filme é sombrio. Los Angeles, onde nasci e sempre vivi, é essencialmente horizontal. A topografia local e o fato de fazer sol praticamente o tempo todo imprime em seu cenário uma perversidade singular. Aqui, você pode ver tudo o que acontece, embora muitas vezes de dentro de um carro. Só é preciso ter a coragem de abrir a janela para observar o lado selvagem da segunda maior metrópole americana”, disse o ator a CartaCapital em um hotel do SoHo, em Manhattan.

Lúcido, Gyllenhaal diz que vê O Abutre como uma oportunidade para discutir, de forma intensa e hipnotizante, um tema criminosamente deixado de lado pelas sociedades civis do mundo ocidental: a transformação da indústria da informação nos últimos anos e o fim do que ele chama de “hierarquização da notícia”: “Eu sair na rua e comprar um café na esquina não pode ter o mesmo destaque, nem sequer aparecer na mesma página de um jornal ou no mesmo segmento de um telejornal que o discurso anual do presidente dos EUA. Não pode! Quando esta distinção se dissipa, o que fica é o caos. E isso é muito perigoso”.

Gyllenhaal, que havia perdido 11 kg para viver Bloom, chega para a conversa com braços imensos, explodindo na camisa de malha, resultado do treinamento intenso na famosa academia de boxe Church, em Nova York, por conta das filmagens de Southpaw (ainda sem título em português), o novo filme de Antoine Fuqua, em que vive o boxeador Billy Hope, um campeão nos ringues cuja vida pessoal devastada por uma série de tragédias.

CartaCapital: Você disse certa vez que gosta de voltar do set de filmagem e desabar, em casa ou no quarto de hotel, feliz e exausto de ter experimentado de fato um dia de trabalho duro. Foi assim em O Abutre?

Jake Gyllenhaal: Foi, mas havia uma pressão constante, inerente a este personagem, que me ajudou muito no processo de criação. Hoje, quando vejo o filme, penso que consegui deixar aquela energia muito específica dele lá nas filmagens, o que é muito gratificante

CC: Como foi o processo de pesquisa?

JG: Eu havia acabado de fazer Marcados para Morrer (dirigido por David Ayer, em 2012) e, para o filme, passei cinco meses no sudeste de Los Angeles tentando entender o que é de fato ser um policial naquela área mais barra-pesada da cidade. Zanzei com eles, neste período, pelo menos três vezes por semana, o dia todo. Observei cenas de crime e, quase sempre, haviam repórteres setoristas de polícia por lá. Ou seja: eu os vi primeiro pela ótica dos policiais. Quando O Abutre virou realidade, entrei em contato com dois irmãos que rodam L.A. fazendo isso à noite e com quem já havia esbarrado durante as filmagens de Marcados para Morrer. De um modo bizarro, a vida deles me era familiar, tive quase uma sensação de déjà vu. Em seguida, comecei imediatamente a memorizar este filme como se fosse uma peça.

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