Juiz responsável pelo caso não poderia ter bloqueado bens da empresa acusada de ser pirâmide, alega ministro.
A BBom, acusada de ser uma pirâmide financeira, obteve no Superior Tribunal de Justiça (STJ) uma liberação parcial e provisória de bens bloqueados em agosto de 2013. Os pedidos do grupo foram atendidos pelo ministro Marco Auréilo Bellizze, que também questionou o processo criminal que empresa enfrenta em São Paulo. A decisão foi publicada no Diário de Justiça eletrônico nesta terça-feira (6).
Trata-se da segunda vitória da empresa. Em novembro, o grupo conseguiu uma liberação parcial e provisória de suas atividades contra um bloqueio determinado em julho de 2013 pela 6ª Vara Federal de Goiás.
O ministro Bellizze considerou que o bloqueio não poderia ter sido determinado pela Justiça Federal, como aconteceu. Isso porque o crime de pirâmide financeira, um dos quais a BBom é acusada, é competência da Justiça Estadual.
"(…) ao que parece, as medidas constritivas [o bloqueio] forma decretadas por magistrado absolutamente incompetente [porque da Justiça Federal]", escreveu Bellizze.
A decisão permite que a BBom utilize os recursos que estavam bloqueados para pagar salários e verbas trabalhistas, “sem nenhum tipo de bônus”; despesas como contas de água, luz e telefone; e pagamento de impostos. A empresa deverá comprovar cada um dos gastos.
A liberação valerá até que o STJ analise definitivamente os pedidos da BBom, o que ainda não tem data para ocorrer.
Procurados, os representantes da BBom não comentaram imediatamente a informação. O Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP), responsável pelo pedido de bloqueio, também não falou sobre o assunto.
Faturamento da empresa saltou de R$ 300 mil para R$ 100 milhões
A BBom é apresentada como um sistema de marketing multinível que permitiu à empresa dona da marca, a Embrasystem, aumentar o faturamento de R$ 100 mil em 2012 para R$ 100 milhões num único mês de 2013, quando foi lançada.
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Para o Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO), essa disparada no faturamento foi sustentada pelas taxas cobradas de quem aderiu ao negócio com a promessa de lucrar. Os que entraram antes, então, eram remunerados com o dinheiro colocado por quem entrou depois, num clássico esquema de pirâmide, conforme apontaram os procuradores da República responsáveis pelo caso.
Em julho de 2013, as contas e atividades da empresa foram bloqueadas a pedido do MPF-GO. Em novembro, a BBom conseguiu uma liberação parcial e provisória no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), com sede em Brasília.
A liberação determinada agora pelo STJ se refere ao processo criminal que a BBom responde em São Paulo, sob acusação de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (SFN). Neste caso, o bloqueio foi determinado em agosto de 2013 pelo juiz Marcelo Costenaro Cavali, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo.
A decisão de Cavali exigia o congelamento de até R$ 2,4 bilhões nas contas das empresas Embrasystem e da BBrasil, integrantes do grupo BBom, e de João Francisco de Paulo, Jefferson Bernardo de lima e José Fernando Klinke, sócios do negócio.
Os advogados recorreram ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), que tem sede em São Paulo, mas o desembargador André Nekatschalow manteve o bloqueio, numa decisão do fim de março.
Em abril, os advogados do grupo levaram o caso ao STJ. O ministro Marco Aurélio Bellizze tomou a decisão no último dia 30.
Súmula do STF restringe decisões do tipo
Há uma orientação do Supremo Tribunal Federal (STF) que impõem restrições ao tipo de decisão que beneficiou a BBom. Editada em 2003, a súmula 691 tem por objetivo proteger o entendimento de uma instância inferior ante decisões dos Tribunais Superiores.
Essa súmula, entretanto, pode ser desconsiderada em casos considerados de "flagrante constrangimento ilegal".
"É difícil [desconsiderar a súmula]. Acontece muito em caso de prisão", afirma o advogado Euro Bento Maciel Filho, que concorda, entretanto, com a decisão favorável à BBom. "Sem conhecer o processo, eu acho que a decisão foi correta."
Professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Marcelo Figueiredo também elogia a postura do ministro Bellizze.
"Considero correto o afastamento da Súmula no caso porque a decisão guerreada [questionada pela BBom] confronta jurisprudência pacífica [interpretação dominante] dos Tribunais Superiores", afirma.
Decisão não bloqueia investigação da PF
Bellizze, entretanto, não aceitou o pedido para suspender o inquérito criminal aberto pela Polícia Federal para investigar as atividades da BBom. A empresa pede que o inquérito seja extinto ou transferido para a Justiça Estadual, e que o processo criminal movido na 6ª Vara seja anulado.
Além do crime de pirâmide financeira, a BBom é investigada em São Paulo por suspeita de lavagem de dinheiro. Como o iG mostrou, às vésperas do bloqueio, a empresa transferiu R$ 31,5 milhões a uma empresária de Campinas, no interior paulista.