O brasiliense Sérgio Gabriel Ribeiro Gomes, que aos 10 anos mede quase 2 metros de altura, disse ao G1 que gostaria de ser menor.
O brasiliense Sérgio Gabriel Ribeiro Gomes, que aos 10 anos mede quase 2 metros de altura, disse ao G1 que gostaria de ser menor. "O que eu mais queria era voltar a ficar um pouco pequeno, que nem criança. Do mesmo jeito que eu sou, mas sendo normal. Queria parar de crescer."
Por causa de um tumor benigno do tamanho de um limão no cérebro, o menino produz hormônio do crescimento em uma quantidade muito superior à normal. Calçando 47 e com 1,97 metro de altura, Sérgio gosta de filmes de super-heróis, ainda não aprendeu a ler e não compreende muito bem por que os colegas da mesma idade são bem menores.
Ele, a mãe e a irmã, que tem 13 anos, sobrevivem com o auxílio-doença de um salário mínimo que a mulher recebe do Instituto Nacional do Seguro Social. Com quadro crônico de hepatite C e evolução na falência dos rins, Ricardene Ribeiro, de 47 anos, não consegue trabalhar para complementar a renda.
Ricardene diz que escolheu não tratar da própria doença para poder cuidar do filho. No máximo, toma chás para diminuir as dores provocadas pelas complicações da hepatice C. "Não consigo nem imaginar meu filho em um abrigo. As pessoas não o entendem, o veem desse tamanhozão e não compreendem que é criança", declarou emocionada. O pai das crianças morreu em 2008.
Mas o sofrimento da família vai além das dificuldades do garoto para acompanhar as aulas da primeira série da Escola Classe 206 de Santa Maria, no Distrito Federal.
A mãe afirma também que as chacotas nas ruas são diárias e que por vezes tem que interceder para que não agridam o menino. Além disso, ela conta ter dificuldades para conseguir doações de roupas que se enquadrem no tamanho dele e que frequentemente o caçula bate a cabeça ao passar pelas portas. O menino precisa ainda cortar as unhas todos os dias e ser depilado pela irmã.
O gigantismo foi descoberto quando a criança tinha 6 anos. Ricardene estranhou o crescimento acelerado do filho e o surgimento precoce de pelos pubianos e decidiu levá-lo ao médico. Na época, ela temia que ele pudesse ter contraído hepatite C durante a gravidez. O resultado dos exames, no entanto, apontou outra realidade.
De acordo com os laudos, o menino estava desenvolvendo um tumor na glândula hipófise, que fica na base do crânio e tem o tamanho aproximado de uma ervilha. A indicação era de que ele extraísse o caroço o quanto antes e assim interrompesse a estimulação excessiva para produção do GH – hormônio responsável pelo crescimento, pela retenção de cálcio nos ossos, pela redução do consumo de glicose por parte do fígado e pelo aumento da massa muscular.
A mãe começou então uma peregrinação por hospitais públicos do DF para fazer novos exames e realizar o tratamento. De acordo com Ricardene, a cirurgia para retirada de metade do tumor chegou a ser marcada no Hospital de Base, em Brasília. Após horas com o menino no local, ela afirma ter ouvido que não seria possível operá-lo por falta de maca e que por isso saiu "indignada" da unidade. A Secretaria de Saúde confirma que atendeu a criança, mas nega que tenha agendado o procedimento.
A mulher, que chegou a acionar a Defensoria Pública do DF para pedir ajuda, diz que desistiu de procurar os médicos depois da ocasião e de ser internada para cuidar da própria doença. Ela e a filha adolescente se dividem para cuidar de Sérgio Gabriel, que desenvolveu hiperatividade e retardo mental. O garoto, segundo a mãe, também não aprendeu a se controlar e ainda faz as fezes na roupa.
"Já aconteceu na escola, e achei a professora bruta com ele. Ninguém o levou ao banheiro para tomar banho, só brigaram mesmo. Também acontece com frequência na rua. As pessoas ficam chamando meu filho de ‘cagão’. Isso dói muito. Ele já foi muito humilhado", disse.
Temendo o sofrimento do filho, Ricardene diz mantê-lo sempre dentro de casa. O menino disse ao G1 preferir a situação. Lá, conta, pode brincar com bonecos, ver filmes do Batman e do Homem Aranha e comer. Sempre de olho nos movimentos da mãe, ele não esconde que gostaria de ser diferente.
"Esporte? O que significa isso? Ah, é futebol, correr, essas coisas? Eu não gosto. Eu não consigo. Eu acho que sou gordo ou muito grande", explica. O garoto revelou também que tem medo de cachorros, baratas e leão. Deixando de ir a muitas aulas por ficar enjoado andando de ônibus e porque a mãe não tem dinheiro para pagar o transporte, Sérgio Gabriel diz sentir falta apenas das refeições na escola.
"A questão da comida é um problema. Ele come demais", disse a mãe. "Enquanto tiver comida, ele come, não tem filtro. Fico desesperada. Eu já deixei de comer, já tirei da minha boca, para dar a ele e não vê-lo sofrendo."
Tratamento
Com a ajuda da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, o menino conseguiu atendimento no Hospital Universitário de Brasília na última segunda-feira (4). A unidade é referência em casos semelhantes e atende atualmente 200 crianças e adultos que fazem tratamento contra o mesmo tumor que Sérgio Gabriel.
Chefe do setor de endocrinologia do hospital e fundadora do laboratório, a médica Luciana Naves afirma aguardar o resultado dos exames de sangue e da tomografia computadorizada para definir como será o acompanhamento do garoto. Ele possivelmente será operado e passará por radioterapia, além de tomar injeções mensais e remédios pelos próximos anos.
"Apesar de ser um tumor benigno, ele é muito agressivo do ponto de vista clínico", explica. "Como essa criança passou um longo período sem ser assistida, a situação é mais delicada. O tratamento precisa ser imediato, justamente para minimizar as consequências. A cirurgia é fundamental. O tumor é muito grande e atrapalha o restante do funcionamento da hipófise."
De acordo com a endocrinologista, a produção excessiva do hormônio pode provocar, além da alta estatura, doenças no coração, diabetes, retardo mental e perda de visão. Os primeiros resultados dos testes mostraram que o tumor já está pressionando o nervo óptico do menino e aumentando a pressão intracraniana.
A expectativa é de que, na próxima semana e de posse de todos os laudos, a equipe consiga saber quando poderá marcar a cirurgia e o quanto do caroço poderá ser extraído. O tempo de tratamento só poderá ser definido depois. Luciana disse que há pacientes acompanhados pelo hospital há mais de 15 anos.
"É um tratamento muito caro, mas integralmente custeado pelo governo. O mais difícil aqui é que a gente precisa contar com o apoio da família, que precisa se convencer de que seguir todos os passos é essencial. Precisamos também contar com a ajuda da criança.
Como ocorre normalmente na idade dele, ele não gosta de tirar sangue e teve medo de fazer a tomografia. Tivemos que convencê-lo a fazer cada exame", conta.
Tumores como o que afeta a criança acontecem em 60 pessoas a cada 1 milhão de habitantes. Eles são mais comuns depois dos 40 anos. As vítimas geralmente se queixam de dores nas articulações e na cabeça, hipertensão e diabetes de difícil controle e crescimento da mandíbula, língua, mãos e pés. Em adultos, o quadro recebe o nome de acromegalia.
"Esses sintomas se apresentam de forma muito lenta, parecem coisas desconexas. Costuma-se demorar entre seis e dez anos para fazer o diagnóstico quando se está mais velho", diz Luciana. "O tratamento consiste em tirar o tumor e bloquear os seus efeitos. As pessoas conseguem levar uma vida normal depois."