Alberto Nisman acusou a presidente de encobrir atentado a centro judaico. Ataque aconteceu em 1994 e teria sido encomendado por iranianos.
O promotor federal argentino Alberto Nisman, de 51 anos, foi encontrado morto em seu apartamento em Puerto Madero, bairro de alto padrão na capital argentina, na madrugada desta segunda-feira (19).
Ele era o responsável pela investigação do atentado contra a sede da Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994, quando uma explosão deixou 85 mortos e provocou danos estruturais em outros 9 edifícios no bairro Once.
Ele disse na semana passada que a presidente argentina, Cristina Kirchner, havia aberto um canal de comunicação secreto com o grupo de iranianos suspeito de ter plantado a bomba.
Segundo o promotor, o esquema tinha como objetivo inocentar os suspeitos para que a Argentina pudesse começar a negociar grãos em troca de petróleo do Irã. Ele apresentaria detalhes da denúncia ao Congresso nesta segunda.
De acordo com o jornal argentino "Clarín", as primeiras informações davam conta de que o corpo de Nisman foi encontrado com perfuração na cabeça, compatível com uma arma de pequeno calibre.
"Alberto Nisman foi encontrado morto no domingo à noite em seu apartamento no 13º andar da torre Le Par, no bairro de Puerto Madero em Buenos Aires", informou o Ministério da Segurança Pública da Argentina em comunicado.
Suspeita de suicídio
A suspeita é que ele tenha se suicidado, ainda que as circunstâncias de sua morte não tenham sido esclarecidas e que autoridades policiais estejam evitando dar informações sobre o caso. "Todos os caminhos levam ao suicídio", declarou o secretário de Segurança, Sergio Berni.
O funcionário indicou que a presidente Kirchner foi notificada do caso e afirmou que as perícias foram feitas "com absoluta transparência em frente ao juiz, à procuradora, e com a presença de testemunhas e da família de Nisman", disse o canal de notícias TN.
O governo argentino ofereceu apoio para esclarecer a morte. "O juiz tem todo o apoio por parte das forças de segurança para garantir o esclarecimento deste fato doloroso", disse o chefe de Gabinete do governo argentino, Jorge Capitanich.
"Me dói terrivelmente que tenha ocorrido isto", disse o secretário-geral da presidência, Aníbal Fernández, que pediu que a morte do promotor não interrompa a investigação. "Agora o importante é que sigam adiante as investigações. É preciso analisar o que há revelado nos expedientes", acrescentou Fernández ao canal "Todo Noticias".
Arma encontrada
A promotora que investiga a morte de Nisman confirmou que foi encontrada uma arma na residência dele em Buenos Aires, mas pediu prudência e cautela à espera das conclusões das investigações.
“Peço prudência”, disse a promotora Viviana Fein, que confirmou que o corpo foi achado pela mãe de Nisman no banheiro de seu apartamento, em um edifício que conta com segurança privada no exclusivo bairro portenho de Puerto Madero.
Viviana confirmou aos meios de comunicação que também foi encontrada uma arma do calibre 22 no imóvel, mas evitou fazer comentários sobre as circunstâncias da morte de Nisman.
Ela confirmou que a mãe do promotor foi contatada pelos seguranças pessoais deles – 10 agentes da polícia, no total –, que alertaram a família diante da falta de resposta aos insistentes telefonemas no domingo (18).
Investigação
Em um relatório de 300 páginas, Nisman pediu uma investigação
contra Kirchner, que supostamente teria favorecido a assinatura em 2013 de um Memorando de Entendimento entre Argentina e Irã para poder interrogar os acusados em um terceiro país e avançar em um caso estancado há 20 anos.
A acusação de Nisman foi o último de uma série de confrontos entre funcionários de alto escalão e a justiça argentina sobre o esclarecimento deste atentado.
Além da investigação, Nisman havia pedido um embargo preventivo de bens no valor de 200 milhões de pesos (US$ 23 milhões) de Kirchner, de Timerman e de outros funcionários.
A denúncia foi recebida com cautela por grupos da comunidade judaica, embora ao longo da semana tenham pedido que as provas que Nisman tinha fossem divulgadas.
Segundo o promotor, a posição do governo de Kirchner obedecia a seu interesse pelo petróleo iraniano, porque "buscava restabelecer relações comerciais de Estado a Estado, sem prejuízo dos intercâmbios que já existiam em nível privado".
Para a audiência desta segunda-feira o promotor solicitava que seu comparecimento ocorresse em particular, mas parlamentares governistas exigiam que a audiência fosse pública e transmitida pela televisão.
Acusação vil, segundo o governo
O governo argentino rejeitou a denúncia "vil" do promotor. "Depois de anos contando com o apoio político do [falecido ex-presidente] Néstor Kirchner e da atual presidente, o promotor acusa vilmente a política mais ativa (…) em relação ao julgamento e castigo dos responsáveis pelo brutal atentado terrorista", afirmou Timerman em uma declaração na quinta-feira.
A assinatura de um memorando de entendimento com o Irã – denunciado como inconstitucional pela AMIA e por outras organizações judaicas – aumentou a tensão nas relações entre o governo de Kirchner e esta comunidade, integrada por 300.000 membros, a maior da América Latina.
O governo defendeu o acordo bilateral com o Irã para investigar os acusados de planejar o ataque. Cinco ex-funcionários iranianos, entre eles um ex-presidente, atuais ministros e líderes religiosos locais, têm uma ordem de captura internacional da Interpol a pedido da justiça argentina.