Mas o medo de perder renda certa ainda impede medida de deslanchar.
Até o fim do mandato da presidente Dilma Rousseff, o governo quer transformar 400 mil pessoas dependentes do Bolsa Família em empresários. A estratégia para criar uma porta de saída para o programa de complementação de renda é usar a Lei do microempreendedor individual. Até agora, o governo identificou 103 mil pessoas que – espontaneamente – se formalizaram para prestar algum tipo de serviço. A estimativa conservadora é que esses novos empresários já movimentem R$ 1,8 bilhão na economia por ano. No entanto, o principal obstáculo para o sucesso da iniciativa é o medo de quem depende do dinheiro do governo tem de perder seu sustento.
— Eles cortam à toa o benefício — diz Maria de Fátima Lopes da Silva, que reclama ainda mais: — Se olharem que você tem máquina de lavar ou cartão de crédito, já querem cortar o benefício. Pobre também não pode ter TV.
Ela já se formalizou e pretende trocar o programa por uma renda maior no futuro gerada pelo próprio negócio, mas admite que perder esse dinheiro seria um grande problema familiar.
— Cortaram o Bolsa Família da minha cunhada só porque ela se mudou. Ela tentou e nunca mais conseguiu — conta a empregada doméstica Antônia Gomes.
O Sebrae já começou a distribuir uma cartilha para explicar que só será excluído do Bolsa Família quem ultrapassar uma renda mensal de R$ 140 por pessoa. Outro ponto que deverá ser abordado é que se o microempreendedor individual não conseguir manter um faturamento maior e precisar voltar para o Bolsa Família, não regressará para o fim da fila.
A determinação da presidente Dilma é retirar 16,2 milhões de pessoas de uma situação de extrema pobreza e inserir essa gente no mercado formal de trabalho. A principal saída é qualificação de mão de obra porque o governo sabe que não tem como transformar todos em empresários, porque é preciso duas coisas para abrir o próprio negócio: vocação e mercado consumidor. A ideia é aproveitar o sucesso da Lei.
— Sempre se combateu a praga da informalidade, mas eu não conheço nenhum país do mundo que formalizou 2 milhões de pessoas em 2 anos — alega o presidente do Sebrae, Luiz Barretto.
Até agora, o governo não incentivou novos empreendedores entre os beneficiários, apenas identificou os 103 mil que se formalizaram. Desses, somente 20% receberam a visita de um consultor do Sebrae. No estado do Rio, o número é ainda menor: 10,8% de 10.456 pessoas que recebem o benefício e já se transformaram em microempreendedor individual. A ideia é dar consultoria para todos e depois influenciar novos possíveis empresários.
— Para esse público, é ver para crer. Se a vizinha contar que se formalizou e manteve o benefício, a pessoa vai acreditar — diz Barretto.
Como no Bolsa Família, entre os microempreendedor individual, o destaque é a mulher. É ela que recebe o benefício por garantir que esse dinheiro será destinado para os filhos. No microempreendedor individual, o percentual de empresárias é de 45%: muito maior que os de microempresárias que é de 29%. A flexibilidade na jornada de trabalho é o principal chamariz: poder cuidar da casa, dos filhos e aumentar a renda.
Até para o Estado, esses microempreendores já vendem. E a tendência é aumentar o número de negócios porque o limite do faturamento anual deles subiu de R$ 36 mil para R$ 60 mil neste mês. Segundo a pesquisa mais recente, 78% não possui outra fonte de renda. No entanto, apenas 12% buscaram crédito no banco para ampliar o negócio. Dessas pessoas, 57% teve o pedido de crédito negado. Mesmo assim, o Sebrae diz que se formalizar é garantia de acesso a juros mais baixos e comprar mais barato de fornecedores e maior poder de barganha.
Hoje, cerca de 7% desses novos empresários recebem o Bolsa Família. A tendência é que com a divulgação da cartinha, esse número aumente.