Categorias: Artigos

Os caras pretas de Anadia

“O poder não muda ninguém, apenas revela”, Michelle Obama.

Em época de campanha política deve-se ter cuidado com o que se fala e escreve. Assim já advertem os mais experientes. Nunca tive medo de me posicionar politicamente e continuo sem.
Quem quer conhecer um pouco da história política de Anadia terá que obrigatoriamente ser muito paciente, pois aqui o tempo custa a passar, as conversas são longas, enfadonhas e as caras são sempre as mesmas.
Outro dia em uma boa prosa com amigos, relembramos uma boa parte das lides, campanhas e duelos políticos. Preservamos os nomes dos personagens por uma questão de respeito, pois muitos já não estão entre nós e não devemos ser deselegantes com ninguém.
Eu guardo como muito carinho o que ouvi da minha avó Ana Cunha: Lá no povoado Tapera em Anadia – que para mim é um principado; o Jorge Paulino, o “Batité”, ao lado da igreja de Santa Luzia, amassava a mais doce cana caiana extraindo dela o caldo, e entre um atendimento e outro, uma conversa e outra, ele esbanjava sabedoria e simpatia.
E era justamente no auge de seu atendimento, quando mais freguês tinha, que nessa hora apareciam os gaiatos para importuná-lo.E o Batité, suado e com o sangue fervendo era interrompido com perguntas e exclamações na clara intensão de deixá-lo nervoso.
– Tá vendo eu Batité, dizia um dos tais; sou um homem de bem, honesto e trabalhador, sustento toda minha família com o suor do meu trabalho. Batité logo emendava: É como cá!
– Mas o cara insistia: Eu não sou como certos cabras safados que não trabalham, nunca fizeram nada, vivendo às custas dos outros e falando da vida alheia!. Batité respondia: É como lá!
Dar para lembrar as alcunhas, cognomes e denominações que as campanhas políticas receberam ao longo desses tempos, ilustrando o nosso folclore político, senão vejamos: Os marqueteiros ainda não existiam e as campanhas eram tocadas pelos filhos e filhas, esposos e esposas, parentes, compadres e amigos.
Era a “Nata” contra a “Poeirinha de Ouro”; “O homem que cortou o rabo do jumento” versus “O homem que furou o jereré”; “Frei Damião” enfrentando “A Irmã Dulce” e por ai afora…
E a antiga e famosa expressão “Os caras pretas”?. Ganhava esse cognome quem não era da mesma corrente política [da situação], os adversários, os que se opunham, a oposição.
Como bom observador que o nosso povo sempre foi, com o passar do tempo e a repetição dos mesmos no poder, ficou muito difícil definir quem são ”Os cara preta em Anadia”; pois, um votou no outro, o outro apoiou o outro, o outro foi vice do outro, que também foi vice, resumindo: um votou no outro, que votou no outro, que votou no outro, ou seja, Os mesmos se revezando no poder.
Com o advento do marketing e dos marqueteiros a coisa mudou. E apesar de se utilizarem sempre das mesmas práticas, discursos e promessas, surgiu a mais surrada e usada expressão: “O bem contra o mal”, e todos se colocando como sendo do “bem”. Parecendo um drama de um diretor de um filme, que só tem artista para o papel de “mocinho” e ninguém para o de “bandido”.
Sou sonhador por excelência, nada me afasta das minhas convicções e sonhos, por acreditar que é através da força do voto, livre, consciente, soberano, e que só com o exercício continuo da democracia – Votando, votando, votando… Somente assim, poderemos modificar os males que nos afligem e outros tantos que tentam encravar no nosso solo.
Ver em nossa terra serem revertidos os índices perversos dos seus indicadores sociais, reerguer as nossas festas tradicionais, recolocar o nosso município no seu merecido lugar, administrar nossas finanças com transparência e participação popular, soerguer a nossa alta estima, ressuscitar a esperança e a colocar efetivamente o povo no poder.
E quando isto acontecer, veremos de novo uma Anadia bela! Que ultimamente só visualizamos nas telas e pinturas do Cícero Rafael, o Ciçou, nos versos de Manoel Mingó “Toda flor tem respiro, todo tempo tem mudança, tudo no mundo passa, tudo enfada, tudo cansa” -, filho de Anadia e nascido na Tapera.
Isso serve de alerta aos postulantes ao mais honroso cargo do nosso município – Prefeito; E aqui não vou falar dos males, pragas, vergonhas e a vasta tipografia dos atos nocivos, a praxe política adotada, revelados a olhos nus a nossa sociedade, dando-nos um sentimento de frustação, impotência, impunidade e o amargo sabor de não valer a pena se colocar politicamente.
É desejando sorte e sucesso aos três postulantes a prefeito de Anadia – Todos com nomes de santo; e valendo-me de uma oração a Nossa Senhora da Piedade acompanhada de um pedido: Que o vencedor nos livre da repetição do duelo de Batités, ou seja, os mesmos repetindo: É como lá! É como cá!
Nós pobres mortais anadienses já não aguentamos mais os eternos e imortais erros públicos há dezenas de anos ocorridos e continuamente praticados! As caras já não são pretas por serem de oposição – Hoje são os mesmos; e sim pretas por atos praticados no poder.“O poder não muda ninguém, apenas revela”, Michelle Obama.

(*) Ex-secretário de Estado e filho de Anadia

Recentes