Abrir este artigo com a frase de Albert Camus: “Há a beleza. E há os humilhados”. É trazer o cunho reflexivo sobre a exclusão resultante das flexibilizações capitais, neste momento agudo onde avança a mentalidade consumista, individualista e hedonista. Cercando uma parcela mínima que pode tudo e a grande contingência dos que não podem quase nada, a não ser trabalhar ou lutar por trabalho.
Em sua crítica à terceira fase do capitalismo, dita sociedade pós-moderna, Bauman utiliza a metáfora “Turistas e Vagabundos” como forma de visualizar as diferenças entre os heróis e as vítimas do nosso pseudo-avanço social. Diz que “a oposição entre os turistas e os vagabundos é a maior, a principal divisão da sociedade pós-moderna”. Compreendamos o turista de Bauman como uma representação daquele que tem a habilidade e a legitimidade para se mover; um constante fluxo cambiante, a recusa do fixo, a perseguição das fantasias, a relevância do hedonismo em diminutas coletividades societárias. Ou seja, os que participam por dentro, captando, escolhendo, pagando, possuindo, ao tempo em regulam as engrenagens na manutenção dos próprios interesses.
Enquanto os vagabundos “são luas escuras que refletem o brilho de sóis brilhantes; são os restos do mundo que se dedicaram aos serviços dos turistas.” Fixados em ações repetidas, amarrados pela força de uma necessidade brutal chamada sobrevivência. Cedo abdicam das fantasias, embora participem pela margem dos delírios do consumo, que lhes é restrito. Em delimitado tempo-espaço, os vagabundos estão sempre a serviço dos turistas, na oferta daquilo que Marx designou força de trabalho, o único capital dos descapitalizados.
A modernidade prometeu libertação, a pós-modernidade acentua a exclusão, e continuamos desperdiçando gerações para manter o status dos Turistas, em uma sociedade onde os Vagabundos constroem a Beleza e recebem ainda o salário da Humilhação.
O alto investimento de energias intelectuais na tentativa de convencimento de que não vale à pena discordar do erro, tem sido uma estratégia pós-moderna de silenciar e expor negativamente aqueles que pensam a partir de paradigmas mais salutares, além do consumismo, individualismo e hedonismo. Contudo, se bem lidos, perceberemos que tais textos nascem eivados de agressividade e pouco senso de coletividade, uma marca dessa luta pela aniquilação total dos direitos do trabalhador.
Nossa adesão à construção de uma sociedade plural, multicultural e democrática requer rigorosa seleção de textos lidos, para não perdermos o rumo diante da proliferação de militantes armados desse individualismo de classe, que desconsidera a própria espécie para reconhecer o próprio afã de viver como Turista.