Ministério Público investiga rede que abastece o mercado informal de Belém.
Com pouco ou nenhum alarde, o centro comercial de Belém aos poucos evidencia a presença de uma rede de contrabando com ligações internacionais, possivelmente com origem em organizações mafiosas chinesas. De acordo com o Grupo Especial de Prevenção e Repressão ao Crime Organizado (Geproc), do Ministério Público do Estado, pelo menos 90% dos estabelecimentos administrados por chineses na área comercial revendem mercadorias contrabandeadas, mas o Geproc afirma que a prática ocorre também em outros estabelecimentos, que servem inclusive de ponto de distribuição para o mercado informal.
Segundo o coordenador do Geproc, promotor Gilberto Valente, o comércio desses produtos é mais intenso em ruas como a Manoel Barata, 13 de Maio, Frutuoso Guimarães, 15 de Novembro e 28 de Setembro. O presidente do Sindicato dos Lojistas de Belém (Sindilojas), Jorge Colares, reconhece a existência do problema e afirma que a ocupação do comércio pelos chineses remonta cinco anos, sendo portanto recente, mas considera que tais comerciantes se constituem numa minoria de 15 a 20 lojistas.
De forma explícita, o comércio informal se apresenta como principal receptor desses produtos. No entanto, em setembro passado, a operação Máfia Chinesa, deflagrada pelo Geproc no centro comercial de Belém, apreendeu R$ 15 milhões em mercadorias contrabandeadas, armazenadas em dois depósitos controlados por chineses. As mercadorias tinham o selo falsificado do Instituto Nacional de Metrologia (Inmetro), e um dos homens presos se encontrava em situação ilegal no País.
Polícia Federal, Receita Federal e Geproc apontam a rota do Suriname como a principal via de entrada no continente dos produtos que chegam a Belém, passando pela costa do Amapá e seguindo por uma malha fluvial capilarizada. Com suas 72 ilhas e histórico relacionado ao contrabando, Abaetetuba, município do nordeste do Estado, aparece como importante foco distribuidor.
A atividade no município é privilegiada por seu emaranhado fluvial e, desde 2003, pela inauguração da Alça Viária, por onde seguem produtos não-declarados para Belém e para outros estados. Áreas permeáveis à entrada desses produtos também são observadas na orla da capital, a exemplo da avenida Bernardo Sayão, que registra diversas apreensões de produtos contrabandeados. Pelas rodovias estaduais e federais também chegam produtos desembarcados no porto da cidade paulista de Santos e de Tubarão, em Vitória, no Espírito Santo, transportados em ônibus ou caminhões.
CAIXA DOIS
‘Os produtos contrabandeados ou falsificados são distribuídos tanto para comerciantes formais como para camelôs’, observa Gilberto Valente. A estrutura em rede típica do crime organizado é complexa e envolve diversos agentes. Eles atuam na aquisição do produto, na quase totalidade de origem chinesa; no transporte e ingresso no País, fraudando os meios alfandegários; na distribuição pelo território na
Valor das apreensões cresceu 111% em 2007
O trabalho do Geproc é realizado em conjunto com a Receita Federal, cuja estrutura pulverizada permite atacar o problema de forma mais direta. Em 2007, a 2ª Região Fiscal da Receita – que compreende, além do Pará, os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Roraima e Rondônia – apreendeu R$ 28 milhões em produtos não-declarados ou frutos de descaminho, a que se generalizou chamar de contrabando.
O valor é 111% maior que o apreendido em 2006 e o sexto maior dentre as dez regiões fiscais do País. Somente em janeiro deste ano, a Divisão de Repressão ao Contrabando e Descaminho (Direp) da Receita Federal já apreendeu R$ 2,848 milhões em mercadorias contrabandeadas. O contrabando, na verdade, representa apenas o comércio de produtos proibidos, mas seu uso hoje é observado até mesmo em contextualizações no âmbito jurídico para o crime de descaminho.
De acordo com Cícero Arnaldo Lima, chefe substituto da Direp no Pará, as evidências são encaminhadas ao Ministério Público Federal, que formaliza a denúncia. A Direp atua em portos e aeroportos da região Norte, além de pontos de fronteira alfandegários. Embora não especifique o efetivo de que dispõe a Receita para a repressão ao contrabando, Cícero considera que seria preciso um contingente maior de agentes principalmente nas regiões de fronteira. ‘Precisamos de aumento de pessoal, não só da Receita.
Uma fronteira como a da Amazônia, que começa em Oiapoque e termina em Mato Grosso, é grande demais’, afirma Cícero. Não apenas o contrabando aparece como problema endêmico na região. Em Roraima, a dor de cabeça da Receita Federal está relacionada à entrada ilegal de gasolina, comprada na vizinha Venezuela a R$ 0,50 o litro. No Amazonas, é o tráfico de drogas. A área de Santa Elena, na Venezuela, beneficiada por regime fiscal especial, também aparece como origem de produtos que circulam pela região. ‘O contrabandista compra lá produtos de Miami tributados a 1% e envia para o País’, afirma Lima.
O Liberal/PA