Os dados fazem parte do estudo Dossiê.
Brasília – O Brasil registra, ao ano, 250 mil internações de mulheres por complicações decorrentes de abortos ilegais. O número leva à estimativa de cerca de um milhão de abortos realizados no país anualmente. Os dados fazem parte do estudo Dossiê sobre a Realidade do Aborto Inseguro em Pernambuco: o Impacto da Ilegalidade do Abortamento na Saúde das Mulheres e nos Serviços de Saúde do Recife e Petrolina, divulgado hoje (2) pelo Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFemea).
“Encontramos uma situação bastante dramática. Visitamos duas maternidades, que atendem mulheres que recorrem por complicações de aborto. O volume de casos nessas unidades é muito grande e, muitas vezes, comparável ao número de mulheres que chegam para ter filhos”, diz Beatriz Galli, coordenadora do estudo.
Ela destaca que as mulheres internadas por complicações decorrentes de abortos sofrem com a discriminação – às vezes, segundo a especialista, chegam a ser colocadas no último lugar da fila, durante o processo de triagem. Beatriz relata que, em Pernambuco, houve caso, inclusive, de erro de diagnóstico. Uma mulher que deu entrada no hospital, mas não explicou que tipo de procedimento havia provocado o sangramento vaginal, que apresentava, chegou a ser diagnosticada com dengue hemorrágica e leucemia. Em seguida, foi levada ao Recife, onde acabou morrendo.
“Depois é que se descobriu que ela tinha provocado um aborto e estava com um sangramento por conta disso. É uma situação muito grave, que mostra um descaso do Estado e o impacto da criminalização do aborto no dia-a-dia dos serviços de saúde”, disse Beatriz Galli.
A coordenadora do estudo lembra que a questão ainda é muito debatida no Congresso Nacional sob um fundo religioso, quando deveria ser abordada como uma questão de saúde pública. Beatriz acredita que também não adianta continuar tratando o assunto dentro da esfera penal.
O deputado Paulo Rubens Santiago (PDT-PE), que participou das visitas a Pernambuco e da elaboração do dossiê, afirma que a visão exclusivamente penal – que criminaliza a prática – não tem impedido a realização de abortos no país. Para ele, descriminalizar o aborto é “dar um passo adiante” na construção de uma política de saúde, que trate as mulheres em situação de aborto como cidadãs, e não como criminosas.
“Temos que conviver com parlamentares de vários credos religiosos e ateus, mas não estamos em uma disputa. O que temos que discutir é um Estado que olhe para as pessoas independentemente do seu credo religioso e que formule políticas universais”, disse Santiago.
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara realiza duas audiências públicas nesta semana para debater o PL 1135, de 1991, dos ex-deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling, que suprime do Código Penal (Decreto-Lei 2.84, de 1940) o artigo que define como crime o aborto provocado pela gestante ou com o seu consentimento.
Agência Brasil