A menos de uma semana do aniversário de 15 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), familiares de vítimas de crimes de extermínio em Alagoas, reclamam a lentidão da justiça que condena inúmeros casos ao esquecimento.
A menos de uma semana do aniversário de 15 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), familiares de vítimas de crimes de extermínio em Alagoas, reclamam a lentidão da justiça que condena inúmeros casos ao esquecimento.
Desde o dia 9 de junho de 2001, quando teve o filho executado, em uma chacina que também vitimou outros três jovens, em uma viela do bairro da Santa Lúcia, o corretor de imóveis José Aloízio Félix dos Santos, luta para ver condenados os ex-policiais militares acusados pelo crime.
O filho de José Aloízio, o mecânico David de Araújo Félix, tinha 16 anos quando foi assassinado. “Estava lá por caso, ia pagar a prestação de uma bermuda comprada uma semana antes a uma sacoleira do bairro, quando foi encurralado com os outros rapazes”, diz recordando a infeliz coincidência, que custou a vida do filho adolescente.
Vítima de vários tiros de calibre 380, disparados por homens encapuzados, o garoto morreu quando voltava do trabalho e decidiu passar pela viela onde ocorreu a chacina. O pai ainda lembra de ter encontrado a nota de R$ 50, guardada em um envelope sob a bermuda ensangüentada. Dinheiro que seria usado para honrar a dívida.
Junto com o mecânico foram assassinados outros três adolescentes. A autoria da chacina foi atribuída a quatro policiais militares do 5º BPM de Maceió, com sede no bairro do Benedito Bentes. Uma das versões alegada para os crimes foi ajustes de contas por disputa de espaço pelo tráfico de drogas na região.
De acordo com o site oficial do Tribunal de Justiça, o processo 11457-3 tramita atualmente na 9ª Vara Criminal da Capital, mas o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Narciso Fernandes, que acompanhou o caso no início das investigações, não soube informar se há novidades a respeito.
Até o final do ano passado, dois policiais acusados haviam sido expulsos da PM e os outros dois aguardavam a decisão da Justiça. A única testemunha do caso, que era adolescente, na época, permanece no Programa de Proteção das Testemunhas, do Ministério da Justiça.
Há três anos, o município de União dos Palmares testemunhou a execução dos adolescentes Tiago Holanda da Silva, 18 anos, Cisenando Francisco da Silva, 17, Sidrônio José da Silva, 16, e do jovem Maurício da Silva, 19 anos.
As vítimas foram assassinadas com vários tiros, na madrugada do dia 5 de setembro de 2002, na ponte sobre o rio Canabrava, no bairro Alto do Cruzeiro, em União dos Palmares. O crime ocorreu enquanto o grupo retornava de uma discoteca, por volta das 4h.
Embora os motivos dos assassinatos nunca tenham sido efetivamente esclarecidos, a autoria dos crimes foi atribuída pelo Ministério Público a quatro policiais militares, que estavam de plantão, naquela noite, no Distrito Policial do município. A denúncia transformada no processo 14355, em junho de 2003, totalizava, até o final do ano passado, um calhamaço de mais de 540 páginas.
As razões para as mortes dos quatro garotos nunca foram devidamente esclarecidas. As vítimas, sem antecedentes criminais, possuíam laços de amizade superficiais e, aparentemente, encontravam-se juntas na noite do crime sem nenhuma razão específica. Além dos PMs indiciados, outros policiais militares foram apontados em uma carta anônima endereçada ao MP, como os prováveis autores da chacina e outros crimes de extermínio praticados na região.
O caso, inicialmente presidido pela juíza Ana Raquel da Silva Gama, permanece tramitando na Justiça, sob a competência de outro magistrado.
Relatos de impunidade ocultos pelo esquecimento popular revelam dramas ainda mais antigos. Casos emblemáticos como o do garoto Luciano Silva, assassinado em 9 de setembro de 1995, é um destes exemplos. Seqüestrado por agentes policiais perto de casa, no bairro de Bebedouro, teve o corpo encontrado carbonizado entre dois pneus, num canavial próximo à Usina Utinga, em Satuba.
Segundo o advogado do caso, o presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB- AL, Mirabel Alves, no processo crime 284-96 figuram como réus os policiais Alcides Simplício de Oliveira Neto, Lupércio Oliveira e Silva e Genivaldo Texeira da Silva, apontados por testemunhas como autores do seqüestro.
Quase dez anos após o assassinato cometido com requintes de crueldade, o caso permanece impune e os acusados livres. “Esse lapso de tempo é a confirmação de que a impunidade estimula a criminalidade, que os instrumentos punitivos não funcionam como deveriam e que a Justiça, por sua morosidade, não distribui a prestação jurisdicional a qual o cidadão tem direito”, observa o advogado.
“Luciano da Silva Santos é mais um brasileiro que, por ter nascido pobre, foi excluído da escola, do acesso à saúde, ao lazer e à boa alimentação, enfim, lhe foi negado o direito à proteção integral que todas as crianças e adolescentes de nosso país têm direito, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente”, conclui.