Em entrevista ao Alagoas24horas, o consultor do Unicef para assuntos da Infância e Juventude na América Latina, Edson Seda, discute avanços e perspectivas nacionais desde a implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), legislação que completa 15 anos.
O consultor do Unicef para assuntos da Infância e Juventude na América Latina, Edson Seda, participa nesta quarta-feira, em Maceió, do Seminário 15 anos do ECA – Avanços e Perspectivas. Além de refletir sobre a data comemorativa do aniversário da legislação considerada a mais avançada do mundo na proteção de crianças e adolescentes, o especialista avalia o cumprimento da Lei no país e as projeções para o futuro.
O Brasil, para começar, partiu antes que TODOS os países do mundo. Pusemos em nossa Constituição de 1988 os PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS que, a partir de 1989, passaram a fazer parte das cláusulas QUE TODOS OS PAÍSES passaram adotaram (menos os Estados Unidos, até hoje) para GARANTIR os direitos já contidos na Declaração dos Direitos da Criança de 1959. Desde 1988, portanto há dezessete anos, reduzimos de 30% das crianças fora da escola em 1988 para 3% em 2005. Esse é um esforço GIGANTESCO de APLICAR RECURSOS do povo (impostos) na INCLUSÃO de crianças no sistema de ensino e nas famílias. Os demais países da América Latina passaram, a partir de 1991 a se inspirar nesse esforço brasileiro para trilhar o mesmo caminho. Não porque somos melhores. Mas porque partimos primeiro.
O Estatuto da Criança e do Adolescente é um conjunto de regras DE CIDADADIA, de DIREITOS HUMANOS, um conjunto de princípios DE BOM TRATO entre as pessoas. Ele é irmão gêmeo do Código dos Direitos do Consumidor, das leis de proteção ao meio ambiente,LEIS DE CIDADANIA. Quando TODAS as leis de cidadania serão COMPLETAMENTE cumpridas nesse mundo de idosos, adultos, adolescentes e crianças? Acho que será como no cumprimento dos mandamentos da lei de Deus. Quem nos diz quando é Santo Agostinho, filósofo, doutor da Igreja e santo: Devemos procurar como se fôssemos encontrar, mas não encontraremos NUNCA, senão indo procurar SEMPRE.
O Estatuto é apenas um dos INSTRUMENTOS que usamos para garantir direitos de TODOS (idosos, adultos, adolescentes e crianças) com PRIORIDADE para crianças e adolescentes. Quando firmamos com TODOS OS PAÍSES (menos os Estados Unidos, que não se submetem a tratados internacionais) os compromissos de EFETIVIDADE, de garantir, de fazer cumprir o que fora declarado em 1959 através da Convenção dos Direitos da Criança de 1989, os deveres que nos impusemos foram os de adotar boas providências de QUATRO TIPOS: educativas; sociais; administrativas e legislativas. O Estatuto é APENAS uma quarta parte das providências para mudar a realidade.
Nesse livro eu explico como, através dos princípios da Constituição de 1988 e das regras do Estatuto de 1990, o FIEL da balança da Justiça NÃO COMEÇA com a ação do Poder Judiciário. Nós não vivemos no mundo angelical dos querubins, dos serafins ou dos arcanjos. Não. Nós vivemos no mundo dos choques, das contradições, dos conflitos de seres humanos que PENSAM de um jeito, QUEREM de outro e AGEM de forma mais variada ainda. NÃO HÁ dois seres iguais, que PENSEM, que QUEIRAM e que AJAM concordando em tudo.
A primeira balança, portanto, deve ser armada ao nível INFORMAL das relações humanas para resolver esses conflitos de todo dia, toda hora, todo instante. Num dos pratos está o bom trato, a virtude, o bem comum, a justiça, a cidadania e no outro prato se situa SEMPRE o mau trato, o vício, o mal estar social, a injustiça, a anti-cidadania.
A segunda balança deve ser armada, em NÍVEL ADMINISTRATIVO, quando falha a primeira. é a ação do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, em nível de direitos DIFUSOS e a ação do Conselho Tutelar, ao nível dos direitos individuais. Tudo isso, para irmos ao Poder Judiciário, somente quando precisarmos do remédio mais forte, mais rigoroso e potente, para RESOLVER CONFLITOS HUMANOS.
A terceira balança é pois, armada ao nível JUDICIAL em que entra em ação um dos Poderes da República, o Judiciário, sendo o juiz ou o Tribunal o seu fiel. Aqui, os meios para a solução não são INFORMAIS como na primeira balança, nem apenas FORMAIS como na segunda. São RITUAIS, dada a gravidade dos recursos utilizados. Os Conflitos são os mesmos: num dos pratos está o bom trato, a virtude, o bem comum, a justiça, a cidadania e no outro prato se situa SEMPRE o mau trato, o vício, o mal estar social, a injustiça, a anti-cidadania. O julgador (juiz singular ou tribunal colegiado) é SEU FIEL.
Adotando as providências educativas, sociais e administrativas com as quais nos comprometemos ao construirmos os PRINCIPIOS GERAIS de cidadania postos por nós em nossa Constituição Republicana de 1988 e ao firmarmos a Convenção Internacional de 1989. Se assim fizermos, conseguiremos CONTROLAR a burocracia não permitindo que, por exemplo, burocratas ROUBEM recursos da merenda escolar, desviem verbas para fins inconfessáveis e deixem de criar os programas de ORIENTAÇÃO E APOIO sócio-familiar, por nós previstos no artigo 90 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Antes, a burocracia impunha suas conveniências (as conveniências da burocracia) às conveniências da cidadania. Hoje, com os princípios constitucionais e as regras legais, podemos efetivamente fazer com que as conveniências DA CIDADANIA prevaleçam sempre sobre as conveniências burocráticas. Passamos do AVESSO ao DIREITO.