A partir da aprovação do projeto, empresas interessadas em comprar uma concorrente têm que informar essa intenção ao governo, antes de efetivar o negócio.
Análises mais rápidas de fusão e aquisição de empresas e um combate mais agressivo à prática de combinação de preços, o cartel. Estas são as principais mudanças que o governo propõe no projeto de lei que reformula o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. O texto, assinado ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi enviado ao Congresso Nacional.
A partir da aprovação do projeto, empresas interessadas em comprar uma concorrente têm que informar essa intenção ao governo, antes de efetivar o negócio. Hoje, uma empresa pode adquirir outra e só consultar o governo depois. "Isso tem conseqüências práticas. Primeiro, se o governo decidir que ela não estaria autorizada, pois isso prejudicaria o consumidor final, como faz? Manda desinvestir, manda voltar atrás? É difícil desenhar a solução depois que a empresa já comprou o concorrente. E o custo de voltar atrás é muito mais alto do que se tivesse a decisão antecipadamente", observou o secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldberg.
Mudará, também, o encaminhamento dos processos. Hoje, as empresas recorrem a três instâncias quando querem comprar outra empresa: a Secretaria de Direito Econômico, que analisa o aspecto jurídico; a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, que estuda o aspecto econômico; e o Cade (Conselho Administrativo do Direito Econômico), também ligado à Fazenda, e que funciona como um tribunal para julgar a operação de compra.
De acordo com o projeto, a SDE será extinta e sua função, exercida por um departamento dentro do Cade, que continuará como julgador final. Caberá a esse departamento fazer a instrução dos processos, papel hoje desempenhado pela SDE. E o tribunal de julgamento do Cade poderá avocar para si o processo, se houver ameaça à concorrência. Além disso, haverá um filtro mais seletivo para que o Cade não fique sobrecarregado com processos que não afetam diretamente a vida do consumidor. O Cade também terá mais recursos materiais e humanos para combater a prática do cartel.
Cálculos do Cade apontam que das 600 operações analisadas anualmente pelos conselheiros, cerca de 90% são inócuas do ponto de vista da economia. Com a nova proposta, estima-se que cerca de 40% das operações deixem de ser submetidas ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, criado por lei de 1994. "Isso é importante porque libera recursos humanos e materiais para fazer outras coisas, como combater cartéis e olhar fusões que realmente causam impacto na economia", disse Goldberg.
Em outros países, com marcos legais de defesa da concorrência instituídos, o normal é que só 5% das operações de fusão ou aquisição cheguem aos tribunais por ameaça à concorrência. "Com o projeto, a vida vai ficar mais fácil para as empresas, que terão suas operações analisadas mais rapidamente, e para o consumidor também, porque terá a garantia de preços mais baixos, produtos de melhor qualidade. Afinal, a concorrência estimula, entre outras coisas, a busca por inovação tecnológica", afirmou Hélcio Tokeshi, secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.
Para a presidente do Cade, Elizabeth Farina, o Sistema de Defesa da Concorrência ajudará a reduzir o custo Brasil, já que a análise demorada é mais cara. Hoje, um processo de análise de operação de aquisição ou fusão menos complexa pode durar até um ano e a mais complexa, dois anos. O objetivo é que todo o processo não dure mais que seis meses. "A preservação da rivalidade no mercado é uma maneira muito barata e saudável de obter um número grande de opções para o consumidor e também para aqueles que usam insumos, os que precisam produzir a partir da compra de outros produtos, a preços que refletem a busca de vantagens competitivas", observou.
O projeto de lei do governo muda também a regra que determina quais empresas devem submeter aquisições e fusões ao Cade. Hoje, toda empresa que fature anualmente R$ 400 milhões, no mundo, tem que pedir autorização ao governo se estiver interessada em comprar uma concorrente. Com o projeto, o faturamento da empresa compradora baixa para R$ 150 milhões, registrado no Brasil. E a empresa visada na compra precisa ter faturamento de, pelo menos, R$ 30 milhões. "Criou-se também um mecanismo pelo qual esse valor poderá ser revisado por ato normativo", explicou Goldberg.