O riacho do Navio corre para o Pajeú, que despeja no São Francisco, que vai bater no meio do mar – a cadeia segue a ordem natural, mas o rio já não vai tão longe. A vazão atual do Rio São Francisco, medida no seu ponto máximo, atinge 2,8 milhões de metros cúbicos por segundo.
O riacho do Navio corre para o Pajeú, que despeja no São Francisco, que vai bater no meio do mar – a cadeia segue a ordem natural, mas o rio já não vai tão longe. A vazão atual do Rio São Francisco, medida no seu ponto máximo, atinge 2,8 milhões de metros cúbicos por segundo; isto representa menos de 30% da vazão registrada em 1954, antes da Hidrelétrica de Paulo Afonso entrar em operação – de lá para cá, a queda foi brusca.
No início da década de 1950 o São Francisco chegou a registrar uma vazão de 10 milhões de metros cúbicos por segundo, em pleno pico do inverno. Dos 2,8 milhões de m3/segundo atuais a Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) fica com 2,1 milhões de m3/segundo para produção de energia elétrica e o restante vai para o abastecimento das adutoras, irrigação e, finalmente, para o mar.
As barragens comprometeram o São Francisco, mas a degradação do rio vem de muito antes; o volume de água acumulada na Barragem de Sobradinho, na Bahia, por exemplo, é igual a vinte e quatro vezes toda a Baía da Guanabara. Para se ter uma idéia da extensão de Sobradinho, a barragem inundou cinco cidades: Remanso, Casa Nova, Sento Sé, Pilão Arcado e Sobradinho – a distância média entre cada uma delas é de 10 quilômetros.
Estudos divulgados pela NASA ( National Aeronautic and Space Administration) advertem de que, se não forem adotadas medidas urgentes para conter a depredação e recuperar o que foi depredado, o São Francisco em 2060 será um riacho. Cópia desses estudos da NASA foi entregue ao senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado; o documento embasou Renan no posicionamento contrário à transposição das águas do rio.
As agressões contra o São Francisco datam de 1543, quando a corte portuguesa autorizou a fundação dos currais de gado nas margens do rio – e, com isso, veio o desmatamento das matas ciliares. Com a navegação a vapor o desmatamento avançou; para fazer a viagem entre Pirapora-MG e Juazeiro-BA (1,3 mil quilômetros de distância) o navio gaiola consumia 400 metros cúbicos de lenha por viagem.
Com a mineração a situação se agravou, porque, para se produzir o ferro gusa é necessário misturá-lo ao “coque” – substância que se obtém com o carvão de lenha. Os levantamentos feitos pelas entidades ambientais que defendem o São Francisco mostram que, para se produzir 2,5 mil toneladas de ferro gusa, são necessários 10 milhões de metros cúbicos de lenha. “São 35 mil hectares desmatados por ano”, denunciam as entidades.
O Rio São Francisco nasce na Serra da Canastra, no município de São Roque de Minas, no noroeste de Minas Gerais, possui 168 afluentes, sendo 90 na margem esquerda e 78 na margem direita, e tem 2,8 mil quilômetros de extensão. Embora banhe cinco estados – Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe – a sua bacia ocupa 7,5% do território nacional, com uma área de 6,4 mil quilômetros quadrados, atingindo parte de Goiás, Espírito Santo e Distrito Federal.
A Bacia do São Francisco abrange uma área seis vezes maior que Portugal, quinze vezes a Dinamarca, dezenove vezes a Holanda e vinte vezes a Bélgica. Os gentios o chamavam de “Opara” ( Grande rio) e os brancos decidiram batizá-lo como o nome do santo do dia (4 de outubro de 1501) em que foi “descoberto” pelos exploradores Américo Vespúcio e André Gonçalves.
Apesar de a idéia parecer atual, a transposição é uma proposta antiga; data do Império, mais precisamente em 1888, quando o engenheiro Trist Franklin Alencar de Lima propôs levar água do São Francisco para abastecer a região do sertão do Ceará assolada pela seca. A idéia não vingou devido às dificuldades em se vencer os recalques, mas ela sobreviveu e está sendo retomada agora com a garantia da moderna tecnologia hidráulica e de engenharia, que permite vencer os obstáculos geográficos.
Do mesmo modo, as recomendações para que o rio seja recuperado, principalmente nas margens, datam igualmente da época do Império; em 1851, o Imperador Pedro II contratou o engenheiro Guilherme Halfed para realizar estudos visando estabelecer a navegação no rio – o engenheiro denunciou o assoreamento e recomendou a dragagem na parte baixa, ou seja, entre Alagoas e Sergipe; a providência só foi adotada cem anos depois, em 1955, mesmo assim, limitando-se a Porto Real do Colégio-AL e Propriá-SE.
A grave situação em que o Rio São Francisco se encontra hoje, devido ao desmatamento para fundação de fazendas de gado e a produção de carvão de lenha, passa também pela “morte” de muitos de seus afluentes. O quadro ameaçador, para o futuro da região, levou frade Luiz Flávio Cappio, pároco de Barra-BA, a lançar a “Carta Pública” denunciando a degradação do rio e pedindo urgentemente ações governamentais visando-se a sua recuperação, desde a nascente, em Minas Gerais, até a foz, entre Alagoas e Sergipe.