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Os acidentes de moto e a responsabilidade do empregador

Quem nunca ficou aborrecido quando um motoboy, aproveitando um semáforo no vermelho, fez aquela irritante ultrapassagem no corredor entre os automóveis parados, quebrando um retrovisor de um carro?

Quem nunca ficou aborrecido quando um motoboy, aproveitando um semáforo no vermelho, fez aquela irritante ultrapassagem no corredor entre os automóveis parados, quebrando um retrovisor de um carro? Esta cena urbana é bastante conhecida, mas esconde dados alarmantes, que vão muito além de pequenos prejuízos.

Sabe-se que o número de automóveis nas capitais brasileiras corresponde a mais do dobro do número de motocicletas em circulação.

Em Maceió, segundo dados do Detran-AL, no período de janeiro a outubro de 2006, foram registrados 1.564 acidentes envolvendo carros e 1.325 ocorrências com motos, sendo que no caso de acidentes com motos 8% resultam em morte do condutor, segundo dados do Hospital de Pronto Socorro – HPS, tabulados pelo Detran.

Em 2005, ainda segundo dados do Detran, quase três quartos dos acidentes envolvendo motocicletas, ou seja, em 73% (setenta e três por cento) das ocorrências, houve vítima, das quais 10% (dez por cento) vieram a falecer em decorrência da gravidade dos ferimentos.

Em 2006, com dados ainda por fechar, a autarquia de trânsito de Alagoas registra um aumento para 77% (setenta e sete por cento) de acidentes com motos, mantida a média de 10% de vítimas fatais.

Em São Paulo existem 150 mil motoboys, percorrendo em média 100 km em 10 horas de trabalho por dia, segundo artigo de Gilberto Dimenstein, publicado na Folha de São Paulo de 13.11.2006, com o chocante título “Como matar um jovem”. O jornalista afirma que diariamente 1 motoboy morre e 25 ficam gravemente feridos e incapacitados para o trabalho.

A tragédia desses números é estarrecedora quando se constata a idade das vítimas, quase todos jovens com menos de 25 anos. Ora, se for feito um simples cruzamento com os índices de desemprego divulgados pelo DIEESE, quase 50% (cinqüenta por cento) dos jovens entre 16 e 24 anos estão desempregados, o que torna um ambiente fértil ao surgimento de empresas que lucram com o subemprego e a precarização das relações de trabalho, sem qualquer compromisso social.

É certo que a Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo acabou de criar um selo de qualidade para as empresas de motofrete, exigindo o compromisso de empregadores e motociclistas quanto à boa conservação da frota, fornecimento de equipamentos de segurança e respeito às leis do trânsito, mas essa iniciativa apenas não basta, pois a cada dia aumentam as exigências de rapidez na entrega de encomendas, que vão desde pizzas, remédios, documentos, correspondências, flores e até complemento de fiscalização eletrônica de empresas de segurança, impondo a esses trabalhadores velocidade de internet, em tempo real quase.

A Constituição Federal do Brasil determina que o empregador é responsável pelo meio ambiente de trabalho, devendo oferecer condições seguras e equilibradas, assegurando a garantia da incolumidade do trabalhador, preservando sua integridade física também. Quando faz essas exigências de rapidez de maior número de entregas em menor espaço de tempo, está criando um risco que, a rigor não existe, mas passa a existir, que é a chamada Teoria do Risco criado. Assim, o evento danoso decorre desse risco imposto a esses profissionais, o que leva à responsabilidade civil objetiva do novo Código Civil, que independe da culpa, pouco importando se concorreu diretamente ou indiretamente para o acidente que vitimou o motoboy.

Enquanto não são tomadas medidas preventivas mais eficazes, como faixas exclusivas para as motocicletas nas vias, tornando o trânsito mais seguro, resta às famílias enlutadas pedir à Justiça indenizações, responsabilizando civilmente as empresas que se valem desses serviços, inegavelmente perigosos, causadores de dados tão sinistros.

*É professor da Ufal e juiz do Trabalho

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