Ex-arcebispo, que atuou na Arquidiocese de Olinda e Recife de 1964 a 1985, também foi lembrado para o Nobel da Paz por sua defesa dos direitos humanos. Religioso foi ameaçado durante a ditadura
A Cúria Romana enviou carta à Arquidiocese de Olinda e Recife na qual afirma ter recebido pedido de abertura do processo de beatificação do ex-arcebispo Helder Câmara (1909-1999). Dom Helder esteve à frente da Arquidiocese até 10 de abril de 1985, quando atingiu a idade limite (75 anos). Havia chegado em Pernambuco em 12 de abril de 1964, poucos dias depois do golpe. E sua atuação ficou marcada pela defesa dos direitos humanos, a ponto de ser lembrado, em 1970, para o Prêmio Nobel da Paz.
De acordo com a Arquidiocese, a correspondência vinda da Congregação para as Causas dos Santos informa que se aguarda o posicionamento de diferentes dicastérios (departamentos do governo da Igreja Católica que formam a Cúria) para emitir um parecer. Se o Vaticano confirmar o nihil obstat (“nada consta”), o processo poderá ser aberto.
“Ser beato, ou bem-aventurado, significa representar um modelo de vida para a comunidade e, além disso, que essa pessoa tem a capacidade de agir como intermediário entre os cristãos e Deus”, diz a Arquidiocese. “Depois disso, ainda, é preciso passar por mais uma fase: a canonização. Para ser proclamado santo é imprescindível a comprovação de um milagre, que deve ocorrer após sua nomeação como beato.”
Cearense de Fortaleza, dom Helder tornou-se padre aos 22 anos. Inicialmente, ele militou em setores conservadores, como a Ação Integralista Brasileira, nos anos 1930 – depois atribuiria essa fase a sua ingenuidade no período da juventude. Em 1936, chegou ao Rio de Janeiro com a missão de organizar o Secretariado Nacional da Ação Católica Brasileira, “sendo a precursora da CNBB”, como diz informe da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. “As histórias de dom Helder Câmara e da Conferência confundem-se”, afirma a organização.
Em dezembro de 1950, Helder Câmara apresenta o projeto da CNBB a monsenhor Giovanni Battista Montini, que fazia parte da secretaria de estado do Vaticano. Em 1963, ele se tornaria o papa Paulo VI.
Já nomeado arcebispo, dom Helder, juntamente com outros 17 bispos do Nordeste, lançaram manifesta em defesa da liberdade das pessoas e da Igreja. Em 1969, depois do AI-5, criticou a miséria dos trabalhadores rurais da região, e foi apontado como comunista. A CNBB lembra de frase célebre do religioso: “Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto porque eles são pobres, chamam-se de comunista”. Foi sistematicamente perseguido, vigiado e ameaçado, com direito a prontuário no Dops.
Nesse período, chegou a ter a casa pichada e metralhada. Um de seus auxiliares, padre Antônio Henrique, foi assassinado em maio de 1969.
Pelo seu trabalho, dom Helder recebeu vários prêmios internacionais, como o Martin Luther King, nos Estados Unidos, em 1970. Nesse mesmo ano, foi lembrado para o Nobel da Paz, mas teve sua campanha sabotada pelo próprio governo brasileiro. Ele morreu em sua casa, em Recife, em 27 de agosto de 1999, por insuficiência respiratórios. Os restos mortais estão na Igreja Catedral São Salvador do Mundo, em Olinda.