O ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) disse, em depoimento prestado à Justiça nesta terça-feira (7), que tem um aneurisma cerebral parecido com o que teve a ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva. Dona Marisa morreu na sexta-feira (3). O deputado cassado negou participação em esquema de propinas e citou que o presidente Michel Temer teve influência em nomeações para cargos para a Petrobras.
Cunha foi ouvido pelo juiz federal Sérgio Moro, em Curitiba, dentro de uma ação penal oriunda da Operação Lava Jato, em que o deputado cassado é réu.
“Eu gostaria de dizer que eu também sofro do mesmo mal que acometeu a ex-primeira dama Marisa Letícia, o aneurisma cerebral. Aproveito até para prestar à minha solidariedade a família pelo passamento”, disse o ex-presidente da Câmara.
Por conta da afirmação, Cunha teve exames marcados para a quarta-feira (8) para verificar seu quadro clínico, segundo o diretor do Departamento Penitenciário (Depen) do Paraná, Luiz Alberto Cartaxo.
Temer
Cunha afirmou a Moro, citando parte da denúncia, que o presidente Michel Temer participou de uma reunião com a bancada do PMDB para discutir a nomeação de diretores da Petrobras.
“Essa reunião [tratando de uma nomeação para Petrobras] ocorreu. Eu fui comunicado dessa reunião, tanto eu quanto Fernando Diniz, na época, pelo próprio Michel Temer e pelo Henrique Alves”.
O deputado cassado disse que a reunião foi em resposta a nomeações feitas pelo PT.
“Era um desconforto que existia com as nomeações do PT, de Graça Foster, para a Diretoria de Gás, e Zé Eduardo Dutra [José Eduardo Dutra, ex-presidente do PT], para a presidência da BR Distribuidora, teriam sido feitas sem as nomeações do PMDB terem sido feitas”.
Na saída da audiência, o advogado de Cunha, Marlus Arns, falou sobre a citação a Temer e ressaltou que seu cliente negou a cobrança de propina. “Em nenhum momento ele admitiu essa questão da propina e negou categoricamente que existia essa questão da propina”, afirmou o defensor.
Procurada pelo G1, a assessoria de imprensa do Palácio do Palácio disse que “o presidente Michel Temer reafirma que não participou de reunião no Palácio do Planalto sobre indicação do PMDB para cargo na Petrobras.”
Primeiro interrogatório
Esta foi a primeira vez que deputado cassado foi interrogado pela primeira vez por Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato na primeira instância. Foram três horas de audiência, que começou às 15h e terminou por volta das 18h.
Preso em 19 de outubro, em Brasília, o ex-presidente da Câmara é acusado de receber propina de contrato da Petrobras para exploração de petróleo no Benin, na África, e usar contas na Suíça para lavar o dinheiro. Eduardo Cunha está detido no Complexo Médico-Penal em Pinhais, na Região Metropolitana da capital paranaense.
Pedido de revogação da prisão
Cunha disse, em seu depoimento, que o juiz devia atender o pedido da defesa de revogar sua prisão, porque, na opinião dele, dupla cidadania e risco de fuga não configuram prisão preventiva. Ele disse ainda que não possui recurso no exterior.
“Que Vossa Excelência possa aproveitar este momento e me permitir, como qualquer cidadão, já que o Supremo decidiu que o cumprimento da sentença tem que ser a partir da condenação em segundo grau, que me permita seguir o Supremo, se por ventura, eu tiver uma condenação confirmada e não tenha uma antecipação de cumprimento de pena, e numa condição degradante como a transferência para um presídio onde lá eu to colocado em uma situação absurda”.
O deputado cassado disse que está detido com presos violentos. Ele mencionou que o local já teve tentativa de fuga e que, segundo ele, ouviu a explosão que resultou na fuga de 28 presos na Penitenciária Estadual de Piraquara I (PEP I), que também fica na Região Metropolitana de Curitiba, em janeiro.
A defesa de Eduardo Cunha esclareceu que o pedido de liberdade foi em função do fim da instrução do processo e não tem nenhuma relação com aneurisma cerebral mencionado pelo cliente durante a audiência.
Trusts
Durante o interrogatório, Sérgio Moro pediu que o ex-deputado falasse sobre os trusts – empresas utilizadas para fazer a custódia e a administração dos bens, interesses e dinheiro – que detinha no exterior.
O ex-presidente da Câmara disse que as empresas Triumph, Orion e Netherton foram criadas para administrar valores e tomar as decisões sobre os investimentos. De acordo com Cunha, em apenas um momento ele teve uma procuração para fazer algumas transações limitadas da Orion.
Eduardo Cunha também afirmou que a transferência dos valores da Triumph e da Orion, para a Netherton, foi feita em abril de 2014, no início da Operação Lava Jato – que teve a primeira fase deflagrada em 17 de março de 2014 –, mas que a decisão de transferir o dinheiro foi tomada em janeiro, por orientação do próprio banco.
O juiz federal perguntou se, durante depoimento espontâneo na Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI) da Petrobras, quando Eduardo Cunha declarou que não tinha contas no exterior, o ex-deputado não entendeu que era relevante prestar as informações sobre os trusts.
Eduardo Cunha disse que falou a verdade conforme a pergunta que lhe foi feita. “Se tivessem me feito a pergunta completa, eu teria respondido a verdade completa”, pontuou.
Sérgio Moro perguntou, então, se o ex-deputado não considerava que tinha obrigação de revelar essa informação. Eduardo Cunha disse então que acha que falou a verdade, de acordo com a pergunta feita a ele.
“Eu não tinha razão nenhuma para mentir, até porque eu não minto. Consequentemente, eu fui lá e falei a verdade”, declarou.
Na continuação do interrogatório, o deputado cassado disse que estaria mentindo se dissesse que tinha contas, porque a conta pertence ao trust, segundo ele.
“No mundo da política, a gente não fala aquilo que não é perguntado”, argumentou.
Nomeação de Zelada
Eduardo Cunha afirmou, ainda, que não teve nenhuma participação na nomeação de Jorge Zelada para diretoria da Petrobras, cujo processo, diz ele, foi conduzido por Fernando Diniz.
O deputado cassado diz ter ido à estatal em apenas duas ocasiões, sem tratar de negociação de cargos com ninguém.
“As duas únicas vezes em que estive na Petrobras, durante meu mandato de deputado federal, foram numa audiência, acompanhando a ex-governadora Rosinha quando o presidente [da Petrobras] era o [Sérgio] Gabrielli, e em uma audiência com a então presidente Graça Foster, levando um prefeito de uma cidade na qual eu era votado”, relatou.