O cardeal Bernard Francis Law morreu aos 86 anos. O anúncio chega quando ainda é noite no Vaticano, mas somente na madrugada de hoje em Boston, a cidade na qual a Igreja mundial viveu o primeiro e mais flagrante escândalo contemporâneo ligado à pedofilia.
Law foi o arcebispo daquela diocese nos anos incriminados, que vão de 1984 a 2002: sobre ele pesa a acusação de ter acobertado constante e sistematicamente os abusos cometidos pelos padres.
O prelado é personagem do célebre filme O caso Spotlight, que venceu o Oscar ao documentar no cinema a histórica investigação do Boston Globe, onde um grupo de jornalistas fez a investigação – que lhe valeram o prêmio Pulitzer – que reconstruiu as proporções do fenômeno dos abusos e a rede de cobertura construída pela cúria.
Law, particularmente, de maneira habitual transferia os padres acusados de pedofilia de uma paróquia para outra, sem tomar medidas mais decididas e sem avisar a polícia.
Tratava-se de um mecanismo que permitiu a repetição dos abusos por anos. No dia 13 de dezembro de 2002, submerso pelo escândalo, o arcebispo se demitiu do cargo. No seu lugar chegou Sean Patrick O’Malley, que se tornou o protagonista de um trabalho de reconstituição até se tornar uma das máximas referências eclesiásticas da luta contra a pedofilia.
Law, no entanto, foi transferido por João Paulo II a Roma, onde foi nomeado arcipreste da basílica de Santa Maria Maior, um cargo insignificante do ponto de visto operativo mas ainda relevante pelo prestígio honorífico. Isso lhe permitiu que estivesse, um ano depois, na primeira fila na cerimônia solene das exéquias do papa polaco.
E como cardeal eleitor, Law participou também do conclave que escolheu Bento XVI.
Em 2011, ao completar oitenta anos, ele ficou sendo o arcipreste emérito da basílica, sem nenhum poder ou influência.
A sua vida se encerrou no silêncio mas voltou à ribalta depois da eleição do papa Francisco, porque a primeira visita do pontífice recém-eleito foi a Santa Maria Maior.
Padre Federico Lombardi, na época diretor da Sala de Imprensa do Vaticano, foi obrigado a desmentir que Bergoglio tivesse afastado o purpurado de um passado complicado. E Lombardi explicou à imprensa mundial: “O cardeal Law estava presente de modo discreto na capela juntamente com outros membros do capítulo e dos confessores, já que foi até recentemente arcipreste de Santa Maria Maior. Depois ele voltou para a sua casa. Nada mais há para ser acrescentado”.
A sua casa era no Palazzo della Cancelleria, edifício do Vaticano, atrás do Campo de’ Fiori. Ali permaneceu também nos dias em que o filme de Tom McCarthyconquistou a estatueta de Hollywood.
Nos últimos dias da sua vida, no entanto, Law viveu num hospital devido ao agravamento das suas condições de saúde.