O uso periódico de maconha pode reduzir significativamente os níveis de ansiedade e de estresse no curto prazo, mas contribuir para piorar sensações associadas à depressão ao longo do tempo. Essa foi a conclusão de estudo realizado pela Washington State University (EUA). Autores pontuam que o estudo é um dos poucos feitos com usuários que utilizam a maconha em casa.
A possibilidade desse desenho de estudo se deve à adoção de leis menos proibicionistas nos Estados Unidos em relação à maconha medicinal — antes, a maioria dos efeitos da erva no humor eram medidos em ambiente controlado com comprimidos de THC (tetrahidrocanabinol), uma das principais substâncias presentes na erva.
Atualmente, 32 estados nos Estados Unidos possuem algum tipo de lei que regulamenta o uso da maconha para fins medicinais.
“O que é único sobre o nosso estudo é que analisamos a cannabis inalada por pacientes de maconha medicinal que usam a erva no conforto de suas próprias casas”, diz Carrie Cuttler, professora-assistente de psicologia na Washington State University e principal autora do estudo, em nota.
A pesquisa também foi publicada no “Journal of Affective Disorders” na quinta-feira (19), um dia antes do dia 20 de abril, data comumente associada ao consumo da erva (ver quadro abaixo).
O desenho do estudo também permitiu que fossem analisados diferentes tipos de maconha. Isso porque os efeitos da erva podem variar a depender das concentrações de cada substância presente em sua composição.
A diferença mais conhecida entre os componentes da droga se dá entre dois compostos: o CBD (canabidiol) e o THC (tetrahidrocanabinol). Estudos realizados na USP de Ribeirão Preto, por exemplo, mostraram que os compostos interagem entre si (o CBD acaba modulando os efeitos do THC, composto tido como o mais responsável pelos efeitos psicoativos da planta).
Levando essa diferença em consideração, os cientistas chegaram às seguintes conclusões:
- Cannabis rica em CBD e baixa em THC pode reduzir sintomas da depressão no curto prazo;
- Duas baforadas de qualquer tipo de cannabis reduzem os sintomas de ansiedade;
- Dez ou mais baforadas de cannabis com altas concentrações de CBD e THC produziram as maiores reduções no estresse;
- O uso de cannabis para o tratamento da depressão pode piorar os sintomas ao longo do tempo.
“Muitos consumidores acreditam que mais THC é sempre melhor”, disse Cuttler. “Nosso estudo mostra que o CBD também é um ingrediente muito importante na cannabis e pode aumentar alguns dos efeitos positivos do THC”, diz.
No Brasil, um dos compostos da maconha, o canabidiol (CBD) é permitido para uso em algumas condições; a importação deve ser feita na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) com laudo médico (Foto: Márcio Meireles/EPTV)
Pesquisadores também descobriram que, enquanto ambos os sexos relataram reduções do estresse e ansiedade, mulheres relataram uma redução significativamente maior na ansiedade após o uso de cannabis.
Os dados do estudo foram retirados do aplicativo Strainprint. No app, usuários de cannabis medicinal dão uma nota aos diferentes tipos da planta. Usuários também avaliam os seus sintomas (1-10) antes e depois de consumirem a droga. Para o estudo, pesquisadores analisaram 12.000 entradas de usuários no aplicativo.
Na análise, pesquisadores observaram uma redução de 58% no estresse e na ansiedade logo após o uso. Imediatamente após o consumo, também foi registrada uma redução de 50% na depressão. Ao longo do tempo, no entanto, os sintomas da depressão pioraram, enquanto os efeitos positivos sobre o estresse e a ansiedade permaneceram.
O estudo apontou dados da literatura em que 72% dos usuários de cannabis usam a erva para relaxar e aliviar a tensão. Um outro dado recente mostrou que em torno de metade dos usuários usam a droga para manejar sintomas da depressão.
Autores também apontam que os dados sobre o uso de cannabis têm divergido ao longo do tempo. Uma pesquisa de 2008 com pacientes com fibromialgia mostrou que o uso de um tipo de canabinoide sintético não teve efeito sobre a depressão. Muitos dos resultados divergentes, apontam os autores, se deve às diferentes concentrações de CBD e THC presentes nas ervas.