Ainda sem entender a tragédia que se abateu sobre sua família, Tamires Tanzi, mãe da adolescente de 13 anos morta a facadas pelo pai, pede justiça e espera que o ex-companheiro seja encontrado e preso. “Ele não pode ficar impune de novo, não. Matar a própria filha? Isso não se faz”, desabafa.
Letícia Tanzi Lucas foi morta na madrugada de quarta-feira (3), em São Roque (SP). O pai, Horácio Nazareno Lucas, de 28 anos, está desaparecido desde o crime. Ele haiva deixado a prisão horas antes. O homem foi preso em junho deste ano por um mandado expedido pela Justiça devido à condenação de oito anos por estupro contra a cunhada dele em 2010, que tem transtorno mental.
Enquanto esteve na cadeia, de junho até terça-feira (2), a família descobriu que ele também tinha abusado da filha em 2017.
Tamires contou à TV TEM que, quando o marido chegou à casa da família durante a madrugada, após deixar a penitenciária, arrombou uma porta e conseguiu entrar no imóvel, no entanto, não parecia representar uma ameaça naquele momento.
“Ele estava calmo, conversando. Até pediu desculpa para a filha dele. Eles se abraçaram e até choraram juntos”, disse.
O ataque
Segundo a mãe, o homem chegou à residência com o objetivo de convencer a filha a retirar a denúncia de estupro.
Tamires diz que ele estava calmo, mas a situação mudou quando ele começou a pedir para a menina voltar atrás e ela se negou. “Ele queria que ela mentisse, que ela falasse que ele não tinha feito nada com ela. Nisso ele foi ficando nervoso.”
A primeira a ser agredida foi a mãe. Ela contou que escondeu o celular, mas o homem encontrou. “Ele estava atrás de mim, com medo que eu ligasse para a polícia. Ele ficou nervoso porque eu tinha escondido o celular e, quando encontrou, ficou mais nervoso ainda. Ele me grudou pela garganta e depois me deu um murro no nariz”, relembra.
Depois da agressão, a mãe conseguiu fugir de Horácio e correu para uma casa vizinha, onde pegou um telefone emprestado e chamou a polícia. Mas, nesse momento em que ela se ausentou, deixando a filha de 13 anos e o filho de 6 anos, o agressor partiu contra a menina e a esfaqueou. Antes disso, ele trancou o filho em um quarto.
Segundo a mãe, a criança ouviu a agressão contra a irmã. O menino conseguiu fugir por outra porta que tinha no quarto e que dava para a área externa da casa.
“Ele saiu e se deparou com a irmã em cima da cama. Ele saiu para a rua e encontrou a polícia, que já vinha subindo a rua. Foi ele que contou que a irmã estava ensanguentada em cima da cama que tem na sala. Eu cheguei depois e não me deixaram entrar.”
Tamires diz que, até então, não sabia o que havia acontecido. “Nem vi a minha filha ferida. Agora meu sentimento é de culpa porque se eu não tivesse saído correndo de lá…não sei. Na hora do nervosismo a reação da gente não se explica. A minha reação foi sair correndo para pedir ajuda”, conta.
Jurada de morte
A menina confidenciou à tia semanas antes do crime que tinha sido ameaçada de morte caso denunciasse o estupro sofrido por ela.
Em entrevista ao G1 horas após o crime que chocou moradores no bairro Mailasqui, a tia de Letícia contou que tinha um relacionamento próximo da sobrinha e que em uma das conversas a jovem teria contado sobre as ameaças do pai.
“Ela disse que foi jurada de morte pelo próprio pai se contasse para alguém sobre os abusos sexuais que ele praticava”, diz.
Denúncias de estupros
A primeira denúncia registrada de violência sexual praticada por Horácio é datada de 21 de junho de 2010. Segundo o boletim de ocorrência, ele violentou a cunhada na frente de Letícia, que estava com 5 anos na época.
Tamires conta que viveu com Horácio durante 15 anos. Mesmo depois da denúncia e condenação dele pelo estupro da irmã dela, ela o perdoou. A prisão só ocorreu mais de sete anos depois da denúncia.
“Quando a polícia o prendeu fiquei até mal porque tinha passado tanto tempo já essa história. Mas, depois de um mês mais ou menos, eu descobri que ele estava abusando da minha filha, que era filha dele também”, destaca a mãe.
O abuso contra Letícia foi descoberto depois de denúncia anônima durante o período de prisão do suspeito.
Segundo a mãe, o caso foi levado diretamente ao Conselho Tutelar e a família passou a ser atendida.
“O Conselho Tutelar foi até a escola e lá ela contou tudo direitinho o que ele fazia. Ela tinha medo dele. Tinha medo de contar e ele fazer alguma coisa. Depois que fui chamada, fizemos a denúncia contra ele. Pensei que ele ia ficar um bom tempo lá. Continuei morando no mesmo lugar. Ele foi condenado, mas ficou quatro meses.”
Acompanhada pelo Conselho Tutelar
A família passou a ser acompanhada pelo Conselho Tutelar da cidade. Segundo um dos conselheiros que prestava atendimento à menina, ela sentiu-se à vontade para falar sobre as agressões sexuais que sofreu assim que o pai foi preso.
As agressões, segundo os relatos da vítima ao órgão, ocorreram mais de uma vez. Na época, a adolescente continuou morando com a mãe.
Velório
O corpo da adolescente foi encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) de Sorocaba e, na sequência, liberado para a família.
O velório começou por volta das 16h de quarta-feira e, além da família, muitos adolescentes foram ao local para se despedir de Letícia.
O velório é realizado na Rua Sotero de Souza, 263, e o enterro está previsto para as 9h desta quinta-feira (4), no Cemitério Cambará, em São Roque.