O presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar neste neste domingo (21) a divulgação de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) sobre desmatamento no Brasil. Para Bolsonaro, divulgar dados alarmantes “prejudica” o país.
Bolsonaro conversou com a imprensa na chegada a um restaurante, em Brasília, após participar de culto religioso em igreja da cidade, acompanhado da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Na última sexta-feira (19), durante entrevista à imprensa estrangeira, Bolsonaro questionou dados divulgados pelo Inpe sobre o aumento do desmatamento na Amazônia e disse suspeitar que o diretor do órgão está “a serviço de alguma ONG”.
Neste domingo, o presidente disse que o desmatamento tem que ser combatido e não “fazer campanha contra o Brasil”.
“A questão ambiental aí fora é na verdade psicose ambiental. Você tem que combater se tiver desmatamento, não é justo aqui dentro fazer campanha contra o Brasil. No mínimo, se o dado for alarmante, ele [Ricardo Magnus Osório Galvão, diretor do Inpe] deveria, em tom de responsabilidade, respeito e patriotismo procurar o chefe imediato, no caso o ministro e dizer: olha ministro, temos uns dados aqui, vamos divulgar, devemos divulgar, o senhor se prepare. Assim que deve ser feito e não de forma rasa como ele faz, que coloca o Brasil em situação complicada. […] Um dado desse aí, da maneira de divulgar, prejudica a gente”, declarou Bolsonaro.
De acordo com números divulgados pelo Inpe no início deste mês, o desmatamento na Amazônia Legal brasileira atingiu 920,4 km² em junho, um aumento de 88% em comparação com o mesmo mês no ano passado.
O presidente minimizou as críticas feitas ao diretor do órgão. Justificou que os números divulgados lhe pareceram os mesmo do ano passado e que ele ficou achando que “poderiam não estar condizentes com a verdade”.
“Ele tem mandato, eu não vou falar com ele. Quem vai falar com ele é o Marcos Pontes e, talvez, o Ricardo Salles. O que nós não queremos é uma propaganda negativa para o Brasil. Não queremos fugir da verdade. Aqueles dados pareceram muito com os do ano passado e deram um salto. Então, eu fiquei preocupado com aqueles números, obviamente, mas também fiquei achando que eles poderiam não estar condizentes com a verdade, então, ele vai conversar com esses dois ministros e toca o barco”, declarou Bolsonaro.
Na tarde deste domingo, depois do almoço no restaurante, Bolsonaro recebeu o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) no Palácio da Alvorada. Salles deixou o local sem falar com a imprensa.
Reação
O diretor do Inpe, Ricardo Magnus Osório Galvão, reagiu neste sábado (20) às críticas feitas pelo presidente e disse que não deixará o cargo.
“Fazer uma acusação em público esperando que a pessoa se demita. Eu não vou me demitir”, afirmou Galvão em entrevista TV Vanguarda.
Ricardo Magnus Osório Galvão defendeu os dados do Inpe: “Esses dados sobre desmatamento da Amazônia, feitos pelo Inpe, começaram já em meados da década de 70 e a partir de 1988 nós temos a maior série histórica de dados de desmatamento de florestas tropicais respeitada mundialmente.”
Trabalho do Inpe
O Inpe disse, por meio de nota, que sua política de transparência permite o acesso completo aos dados e acrescentou que a metodologia do instituto é reconhecida internacionalmente.
“O Inpe teve um papel fundamental na utilização de satélites para imagem de sensoriamento remoto. O Brasil foi o terceiro país no mundo a usar imagens do satélite landsat, método desenvolvido pelo Inpe. Todos os nossos métodos são desenvolvidos pelo Inpe”, afirma o órgão.
Na entrevista deste sábado (20), o diretor do Inpe também defendeu seu histórico como cientista e as escolhas feitas pelo Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações para cargos de pesquisa, como o que ocupa na diretoria do Inpe.
“O presidente Bolsonaro tem que entender que eu sou um senhor de 71 anos, professor titular da Universidade de São Paulo, membro da Academia Brasileira de Ciências, fui presidente da Sociedade Brasileira de Física durante três anos, membro do Conselho Científico da Sociedade Europeia de Física durante três anos”, afirmou.
“Todos os diretores dessas unidades de pesquisa não são escolhidos por indicação política ou porque o pai deles quis dar um filé mignon pra eles. Eles são escolhidos por um comitê de busca nomeado pelo governo, por cinco especialistas de renome nacional, tanto na área científica quanto na área tecnológica”, reiterou.
Galvão também disse que é preciso defender quem “trabalha bem para o governo”, e citou o ministro de Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes. “Ele sempre manifestou que as questões do desmatamento e das mudanças climáticas são questões científicas e não políticas. E têm que ser tratadas cientificamente, e ele sempre mostrou grande respeito pelo Inpe”, afirmou.
“No entanto, o ministro Ricardo Salles vem atacando, desde o começo do ano, os dados do Inpe. Realmente não sei com que intenções. Algumas pessoas dizem que ele tem intenção de transferir esse trabalho feito pelo Inpe para empresas privadas. Não sei se é verdade, porque ele aparentemente desmentiu.”
O diretor do Inpe afirmou que, antes da polêmica com o presidente, havia enviado um ofício ao ministro Marcos Pontes, propondo que fossem abertos canais de comunicação para esclarecer sobre esses dados e criar ferramentas para que o governo pudesse usar essas informações de forma mais clara e transparente.
O presidente Jair Bolsonaro afirmou neste domingo (21) que o governo “pode pensar”, no futuro, em reduzir a multa de 40% do saldo do FGTS paga a trabalhadores sem justa causa.
Manifesto da SBPC em apoio ao Inpe
O Conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) divulgou neste domingo (21) um manifesto em apoio ao Inpe. O documento diz que as críticas do presidente são “ofensivas, inaceitáveis e lesivas ao conhecimento científico.”
“Em ciência, os dados podem ser questionados, porém sempre com argumentos científicos sólidos, e não por motivações de caráter ideológico, político ou de qualquer outra natureza”, diz o texto do manifesto. “Críticas sem fundamento a uma instituição científica, que atua há cerca de 60 anos e com amplo reconhecimento no País e no exterior, são ofensivas, inaceitáveis e lesivas ao conhecimento científico”, afirma o documento.
FGTS
No mesmo evento deste domingo, Bolsonaro disse neste domingo (21) que o governo “pode pensar”, no futuro, em reduzir a multa de 40% do saldo do FGTS paga a trabalhadores sem justa causa.
Polêmica com o Nordeste
O presidente também voltou a comentar neste domingo (21) uma declaração que fez na última sexta (19) sobre governadores do Nordeste. Em frente ao Palácio do Alvorada, Bolsonaro questionou se, entre as pessoas que estavam prestando apoio a ele no local, havia algum nordestino ofendido com ele.
A pergunta ocorre após Bolsonaro dizer durante uma conversa informal com o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) que daqueles “governadores de ‘paraíba’, o pior é o do Maranhão; tem que ter nada com esse cara”.