O Papa Francisco descartou, nesta quarta-feira (12), a possibilidade de ordenação de homens casados como padres na região amazônica. Ele também rejeitou a ordenação feminina. Ambas as medidas haviam sido propostas no sínodo da Amazônia, no ano passado, que ocorreu no Vaticano.
A possibilidade de ordenar homens casados havia sido aprovada, por 128 votos a 41, durante o encontro, mas não agradou a alguns membros da Igreja, que temiam que isso pudesse levar a uma mudança no compromisso secular de celibato entre os padres, diz a Reuters.
Mas a proposta não é nem mencionada no texto, de 32 páginas, que foi publicado nesta quarta sobre o encontro, sob o nome de “Exortação Apostólica Pós-Sinodal Querida Amazônia”. Uma exortação apostólica serve para instruir e encorajar os fiéis católicos, mas não define a doutrina da Igreja.
No texto, em vez de falar da possibilidade de ordenação para homens casados, o pontífice diz que novas maneiras devem ser encontradas para incentivar mais padres a trabalharem na região remota e permitir papéis maiores para leigos e diáconos permanentes, assim como para mulheres.
Homens casados podem se tornar diáconos, que, como padres, são ministros ordenados. Eles podem pregar, ensinar, batizar e administrar paróquias, mas não rezar a missa. Por causa disso, em ao menos 85% das aldeias amazônicas as pessoas não podem participar da liturgia todas as semanas — e algumas não o fazem há anos, segundo a Reuters.
“Essa necessidade urgente me leva a exortar todos os bispos, especialmente os da América Latina (…), a serem mais generosos em incentivar aqueles que demonstram uma vocação missionária a optar pela região amazônica”, escreveu Francisco.
O pontífice destacou a “força e dádiva” das mulheres, mas descartou a ordenação feminina. Uma comissão de estudo da Igreja, criada em 2016, havia debatido a possibilidade do diaconato feminino, mas a questão não foi decidida. O sínodo da Amazônia propôs a ordenação de mulheres como diáconas.
“Por séculos, mulheres mantiveram a Igreja nesses lugares [na região da Amazônia] por meio de sua devoção notável e fé profunda. Isso nos convoca a ampliar nossa visão, para não restringirmos nosso entendimento da Igreja a suas estruturas funcionais. Tal reducionismo nos levaria a acreditar que as mulheres receberiam maior status e participação na Igreja somente se fossem admitidas nas Ordens Sagradas”, disse Francisco.
“Isso nos levaria a clericalizar as mulheres, diminuir o grande valor do que elas já realizaram e, sutilmente, tornar sua contribuição indispensável menos eficaz. As mulheres contribuem para a Igreja de uma maneira que é adequadamente sua, ao tornar presente a tenra força de Maria, a Mãe”, acrescentou o pontífice.
Possibilidade de ordenação pode ser discutida, diz cardeal
O cardeal canadense Michael Czerny, que ajudou a redigir o texto da exortação, declarou ao site oficial da Santa Sé, o “Vatican News”, que, apesar de não ter sido mencionada no documento, “a possibilidade de ordenação de homens casados pode ser discutida pela Igreja”.
“Já existe, por exemplo, nas Igrejas Orientais. Essa discussão está em andamento há muitos séculos, e o sínodo o abordou livremente, não isoladamente, mas em todo o contexto da vida eucarística e ministerial da Igreja. O Papa declara na exortação que não é uma questão de números, e que uma maior presença de padres não é o único requisito”, afirmou Czerny.
Ao abordar a questão das mulheres, o cardeal afirmou que “a relação entre ministério [clerical] e poder é o que deixa as mulheres sem voz, sem direitos e muitas vezes sem a possibilidade de decidir. Não se trata de lhes dar acesso a um ministério ordenado para que eles obtenham voz e voto, mas separar o poder do ministério”, disse.
Conservadores temiam que, se Francisco aceitasse a proposta, outros lugares com escassez de padres seguiriam o mesmo caminho — até mesmo países desenvolvidos, como a Alemanha, onde a questão está sendo discutida.
Mesmo antes de alguns encontros que ocorreram no país em dezembro, o Vaticano enviou duas cartas aos alemães para deixar claro que eles não determinavam como esses temas deveriam ser abordados — mas as reuniões, chamadas de “caminho sinodal”, começaram apesar dos alertas.
Em janeiro, um livro publicado pelo cardeal guineense Robert Sarah sobre o celibato clerical trouxe o assunto mais uma vez à tona, dessa vez envolvendo o Papa Emérito Bento XVI. Na obra, em que o pontífice emérito aparece como coautor, Sarah defende a manutenção do celibato pelo clero. Mas Bento XVI afirmou que não era coautor do livro e pediu que seu nome fosse retirado dele.